Já
era noite, pois os últimos raios de claridade haviam desaparecido. Desde alguns
dias vinha lutando internamente com a possibilidade de procura-lo, mas sabia
que as implicações disto seriam grandes. Quando a notícia se espalhasse teria
que dar muitas explicações
Pensara
em conversar com a esposa ou com algum de seus amigos mais chegados, para saber
a opinião deles e assim tomar uma decisão mais abalizada, todavia sabia que a
resistência seria muito grande e por fim resolvera que a decisão seria apenas
sua.
Ficou
sabendo que Ele havia subido e que passaria a Páscoa com os seus amigos em
Jerusalém. Certamente esta seria a melhor oportunidade para encontra-lo. Mas
como no ano anterior, os dias se passaram tão rapidamente e agora sabe que logo
pela manhã Ele partiria novamente, pois seu ministério era itinerante,
portanto, chegara a hora de tomar uma decisão: iria ou ficaria – então se
levantou e foi.
O
caminho de sua casa até onde Ele estava hospedado não era longo, apenas algumas
ruas, mas naquele momento cada passo seu parecia demorar um quilometro. Sua
mente estava agitada como nunca antes. Havia tantas questões a serem debatidas,
mas seleciona-las e organiza-las por ordem de importância tinha lhe tomado
muito tempo nestes últimos dias, e cada vez que repensava a ordem das questões
se alteravam. Por fim resolvera que o primeiro assunto que abordaria seria a
respeito do Reino de Deus.
Desde
sua infância ele havia recebido toda a orientação possível sobre a religião
judaica. Aprendera, como todos os meninos, a ler e escrever tendo como livro
texto a Torá. Havia memorizado os textos principais e todas as orações diárias
o qual recitava ao menos três vezes ao dia como havia sido orientado a fazer, o
que fazia não apenas como obrigação religiosa, mas com satisfação da alma.
Enquanto
caminhava lembrou-se com alegria de seu “Bar-Mitzvá”[1] que marcava sua
transição para a vida adulta. Os anos se passaram rapidamente e agora já na
casa dos cinquenta anos, enquanto caminha pela noite, seu coração dispara
novamente, como naquele dia da sua primeira leitura da Torá na Sinagoga.
Finalmente
chegara à porta da casa onde o Ele estava. Em fração de segundos repensa a
razão que o levava a procura-lo. Por todos anos de sua vida sempre procurou ser
uma pessoa melhor. Sempre levara a sério as prescrições da religião de seus
pais e que também havia tomado para si. Observava com zelo ardoroso o
calendário religioso e nunca, até mesmo nos momentos mais difíceis, como aquele
em que debilitado por uma enfermidade, deixou de oferecer seus sacrifícios
conforme a Lei de Moisés ordenava.
Por
causa de seu zelo e conhecimento adquirido da Torá foi convidado, ainda muito
jovem, a fazer parte da direção da Sinagoga. Com o passar dos anos,
naturalmente, tornou-se um de seus principais chefes. Em muitas ocasiões leu e
expôs as Escrituras de tal maneira que seus ouvintes ficavam absorvendo atentos
em completo silêncio. Por causa disso muitos convites eram feitos para que
visitasse outras Sinagogas de Jerusalém e arredores.
Sempre
procurou ser um bom marido, assim também um bom pai. Sabia que os olhares de
seus vizinhos, amigos e de todos os que faziam negócios com ele estavam sempre
atentos, por isso sempre honrou sua palavra e era conhecido pela sua
honestidade nos negócios.
Mas
apesar de tudo isso, de toda sua dedicação religiosa e de uma vida honrada, em
muitas ocasiões seu coração se perturbava e sua alma se inquietava, pois não
podia ter a plena certeza, a total garantia de que entraria no Reino de Deus. E
esta era a razão que o levara a sair à noite e se dirigir até aquela casa onde
Jesus estava.
Bateu
na porta e rapidamente alguém abriu e o mandou entrar. Seus olhos logo
localizaram Jesus, que calmamente falava com as pessoas ali presentes. Sua voz
era suave, porém, transmitiam uma autoridade tão grande que impactava a todos
os que o ouviam. Encerrando sua argumentação levantou os olhos e convidou
Nicodemos a se aproximar. As pessoas abriram espaço para que ele pudesse ficar
mais próximo do Mestre. Assentou-se e fez a melhor saudação possível a uma
pessoa: “Rabi, sabemos que és Mestre
vindo da parte de Deus; porque ninguém pode fazer estes sinais que tu fazes, se
Deus não estiver com ele”.
Nicodemos
havia se preparado para muitas coisas, mas não para as palavras de Jesus. Em
vez de retribuir a gentileza de suas palavras, Jesus lança lhe uma afirmação
categórica: “Em verdade em verdade te
digo, se alguém não nascer de novo, não pode ver o Reino de Deus”.
Por
alguns segundos ele fica ali, pensando nas palavras de Jesus, o qual não fazia
sentido algum. Então formula seu questionamento: “Como pode alguém nascer novamente, sendo já velho, pode por ventura
entrar novamente no ventre de sua mãe e nascer novamente..”
Diante
de seu questionamento, Jesus responde: “Se
você não nascer da água e do Espírito, não poderá entrar no Reino de Deus”.
Nicodemos ficou ali, pensando, mas não conseguia compreender o que Jesus estava
dizendo. Então Jesus, como que percebendo a angustia de seu coração continua a
falar; fala do amor imensurável de Deus que enviou Seu unigênito Filho para que
morresse em lugar dos pecadores; fala da necessidade de se crer no Filho, que
veio não para condenar, mas para salvar os que estavam perdidos. Jesus concluiu
suas palavras afirmando que os que praticam a verdade não precisam temer a luz,
pois suas obras são feitas em Deus.
Nicodemos
ouviu tudo com uma atenção infantil, não querendo perder uma única palavra de
Jesus. Agradeceu a atenção do Mestre, levantou-se e saiu.
Enquanto
retornava para sua casa, ele percebeu que aquelas palavras de Jesus começavam a
fazer sentindo e na mesma medida o seu coração começava a ser tomado por uma
alegria incontida. Uma paz começou a invadir sua alma, de maneira que toda
ansiedade, toda a angustia, todas as apreensões, foram apaziguadas – algo completamente novo estava acontecendo
– seria isto que Jesus chamou de Novo Nascimento.
Quando
Nicodemos entrou em sua casa, ele tinha plena certeza, não era mais o mesmo
Nicodemos que havia saído para encontrar-se com Jesus. Ele agora era uma nova pessoa.
O Espírito Santo produziu em seu interior um renascimento!!
Então
Nicodemos abraçou sua esposa, mandou chamar seus filhos e todos que faziam
parte de sua casa...e começou a contar-lhes tudo quanto havia acontecido com
ele....
Utilização livre desde que citando a fonte
Guedes, Ivan Pereira
Mestre em Ciências da Religião.
Universidade Presbiteriana Mackenzie
me.ivanguedes@gmail.com
Outro Blog
Historiologia Protestante
http://historiologiaprotestante.blogspot.com.br/
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[1] Ao completar 13 anos,
o jovem atinge a maioridade religiosa judaica. Para marcar esta passagem, é
celebrado o Bar-Mitzvá, uma cerimônia que ressalta a importância de cada um dos
judeus na corrente ancestral do judaísmo. É nessa data que o jovem, pela
primeira vez, coloca os Tefilin e é chamado para ler na Torá.
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