A maioria das versões opta pela nomenclatura mais curta de “Primeira Pedro”, outras preferem um título mais longo como “A Primeira Epístola de Pedro” ou “A Primeira Epístola Geral de Pedro” e faz parte do último bloco literário do nosso Novo Testamento, denominado de epistolas gerais na companhia de Hebreus, Tiago, 1 Pedro, 2 Pedro, as três epístolas de João e Judas. Dentre elas nenhuma tem sido mais utilizada no transcorrer da história da igreja do que está atribuída ao apostolo Pedro.
Qual
a Relevância desta Epístola? Há muitas razões para lermos
e estudarmos esta preciosa carta, mas se tivermos que nomear uma em particular
o apostolo se concentra na importância de os cristãos estarem sempre preparados
para enfrentar o sofrimento, principalmente quando é decorrente de sua fé em
Cristo (1 Pedro 2.20).
O
escritor evangélico Charles Swindoll faz uma relação muito interessante entre
esta primeira carta de Pedro é o livro de Jó. Assim como o livro do Primeiro
Testamento foi escrito para nos ensinar a enfrentar as mais intensas
adversidades sem perdemos a nossa perspectiva de Deus, o velho apostolo quer
que seus leitores não desanimem diante das lutas e adversidades que estejam
enfrentando e/ou possam vir a enfrentarem, sem esmorecerem em sua fé, (SWINDOLL,
2004, p. 56).
Autoria
As
evidências internas e externas corroboram uma autoria do apostolo Pedro. Os
críticos de plantão amam discordar disso e vazem malabarismos textuais para
deixar a epistola sem autoria definida. Mas eles fazem isso com todos os livros
bíblicos, já se tornou tradição procurar outros autores e datas para os livros
bíblicos ainda que seja utilizando teorias muitas vezes extremamente limitadas
e improváveis. Então nos contentaremos com autoria e data defendidas por
estudiosos respeitáveis e de fé ilibada, que se mantém, apesar de todas as
duras críticas sofridas principalmente a partir do século XVIII (Guthrie, 1971,
p. 790; Stibbs, 1960, p. 23).
Data
Quando
defendemos a autoria petrina desta epístola a data em que foi escrita deve ser
limitada à data de seu martírio, portanto, uma data de redação anterior a 68,
quando Nero cometeu suicídio, visto que há uma forte tradição de que Pedro foi
morto antes da morte de Nero. Assim como na questão da autoria os argumentos
contrários não chegam perto de serem conclusivos, os que discordam da proposta
conservadora de uma data próximas do ano 64/67 a.C. produzem argumentos
igualmente inconclusivos. Uma verdadeira colcha de retalhos é elaborada para
indicar uma data além dos anos 80, durante as intensas perseguições no reinado
de Domiciano, no começo da década de 90, ou durante o reinado de Trajano, entre
110-111. Os defensores da hipótese do “círculo
petrino”, menos radicais, optam por uma data entre 65/80 d.C.
Destinatários
No
primeiro verso Pedro identifica a quem direciona sua correspondência: “aos
forasteiros da Dispersão, no Ponto, Galácia, Capadócia, Ásia e Bitínia. (províncias
nas partes norte, central e ocidental da Ásia Menor [atual Turquia]). As
literaturas neotestamentárias não contêm nenhum registro da evangelização da
maior parte deste território. As evidências literárias devem ser buscadas
dentro do próprio texto. Lembrando que Pedro se não fundou estas comunidades
era amplamente conhecido delas e uma referência autoritativa apostólica. O nome
de Pedro é um dos mais familiares ao leitor do Novo Testamento, ocorrendo nada
menos que 160 vezes.
Há
uma certa radicalização quanto a estas comunidades serem eminentemente
gentílica ou judaica. Mas a luz da leitura e estudo do livro de Atos não é
absurdo entendermos que se trata de comunidades embridas compostas por maiorias
e minorias gentílicas e judaicas. O termo chave que poderia definir a
composição destas comunidades “diáspora”, todavia foi utilizada tanto
para se referir a judeus que viviam espalhados por grande número de países (até
hoje), após principalmente do cativeiro babilônico, mas que também foi
utilizada por Paulo para se referir às comunidades cristãs gentílicas que foram
separadas (exiladas) do mundo para viverem para Deus. Lembrando de que judeus
do Ponto, Capadócia, Ásia estiveram presentes no Pentecostes (Atos 2.9),
portanto, ouviram o primeiro sermão de Pedro muitos fizeram parte daqueles
quase três mim que se converteram. E retornando aos países em que moravam,
levaram a mensagem do evangelho com eles. Defensores de que sejam comunidades
eminentemente composta por judeus convertidos (Orígenes, Padres Gregos,
Calvino, Bengel, Weiss); fico na companhia de E. G. Selwyn que defende que os
destinatários eram comunidades "mistas" compostas por judeus e
cristãos gentios (SELWYN, 1958, p.44).
Outro
detalhe interessante é de que esta foi a região em que Paulo desejava anunciar
o evangelho, mas o Espírito Santo não o permitiu (Atos 16.6-8). Além destas
citadas por Pedro havia outras comunidades nesta grande região o qual algumas
delas receberam posteriormente cartas endereçadas pelo próprio Senhor Jesus
ressurreto, conforme registradas nominalmente no Apocalipse (2,3). Assim como,
a igreja dos colossenses que não foi mencionada nem por Pedro e nem no
Apocalipse.
É
possível que no transcorrer do tempo os gentios vieram a tornar-se maioria nestas
e demais comunidades cristãs, uma vez mais apelamos ao livro de Atos, que
revela haver desde o início da igreja um número crescente de convertidos
gentios e decrescente, proporcionalmente, de judeus. Lembrando de que nas sinagogas se abrigavam
muitos gentios (prosélitos) e um grande número de mulheres, que fugiam das
religiões pagãs cujos rituais incluíam promiscuidades sexuais.
Não
sem razão Paulo e Barnabé iniciavam suas exposições evangélicas sempre nas sinagogas
por onde passavam e uma vez expulsos muitos judeus e gentios (prosélitos
e mulheres) saiam dando origem às primeiras comunidades cristãs. Pedro era
contemporâneo dos missionários referidos ainda que seu campo de atuação, pelo
menos no contexto de Atos seja a Palestina e adjacências.
Portador
da Carta
O
sistema de correspondência era extremamente precário, portanto, se valia de um
portador pessoal. No caso dessa epistola de Pedro, que abrangeria diversas
localidades e receptores, foi delegado a Silvano, que é inclusive citado
nominalmente na carta (cf. 5.12). Este
é, com alto grau de certeza, o Silas ou Silvano que foi um dos companheiros de
Paulo em sua segunda viagem missionária. Enviar a carta por meio dele,
conhecido e estimado entre essas igrejas referidas, por causa de suas relações
com Paulo, aumentaria ainda mais a aceitação e interesse dos receptores.
Tudo
indica também que este Silvano (Silas) serviu de amanuense desta carta que
apresenta um grego limpo e de alta qualidade, o que seria difícil pensando em
Pedro, que mesmo que tivesse habilidade para ler e escrever em grego,
certamente não teria a mesma sofisticação literária. Até mesmo o apóstolo Paulo
fez uso dos serviços escriturários de amanuenses.
Temática
Os
leitores primários a quem a correspondência se refere estavam sendo perseguidos,
inicialmente e de forma mais contundente pelos judaizantes, pois viam no
cristianismo uma distorção do judaísmo, amplamente ilustrada no livro de Atos;
mas gradativamente começa a incomodar o Império Romano que se apercebe do
crescimento volumoso do cristianismo e cujas duas propostas centrais – o
Senhorio de Cristo e o amor ao próximo – começa a ser vista como ruptura da
estrutura de Estado.
Portanto,
o escritor se concentra no tema da conduta cristã apropriada em face de
hostilidades anticristãs, independentes de suas origens, bem como no tema da
promessa de salvação, que alcançara o seu ápice na glorificação futura de todo
o crente em Jesus Cristo. Este último aspecto sustentará os cristãos no momento
do martírio.
A
mensagem de Pedro é de que todo cristão deve viver em permanente comunhão com
Cristo. O fato de que ele próprio caminhou lado a lado com Jesus por quase três
anos o capacita a exorta seus irmãos na fé a aprenderem a viver sob pressão em
meio às hostilidades contextuais. Ninguém viveu mais sob pressão hostil do que Jesus
(desde sua gestação até a cruz), de maneira que Ele é o modelo a ser seguido. O apóstolo conclama os cristãos a "santificar
Cristo como Senhor" em seus corações, para que eles pudessem viver e
agir como Jesus deseja durante seu breve tempo aqui na Terra (1 Pedro 3.14-18).
Assim como Cristo não afrontou as autoridades constituídas de seus dias, ainda
que agissem totalmente à margem da própria lei por eles estabelecida, os
cristãos devem aprenderem a viver debaixo das autoridades, ainda que injustas. Portanto,
a tese da carta é de que fundamentados em uma fé perseverante na pessoa e obra
de Cristo, o cristão pode viver em esperança mesmo em meio ao sofrimento. A
palavra esperança é uma palavra-chave que aparece cinco vezes nesta epistola
(1.3,13,21; 3.5,15). Desta forma é correto afirmar que Pedro está escrevendo uma
carta de esperança para aqueles cristãos e os em toda época, que estão passando
por intenso e frequente sofrimento.
Silvano,
o amanuense/escriba/secretário
Para
um expressivo número de comentaristas bíblicos Silvano é a forma latina de “Silas”,
que foi portador das resoluções do Concílio em Jerusalém para as igrejas
gentias, incluindo Antioquia e posteriormente fez parte da segunda equipe
missionária de Paulo (cf. 1Ts 1.1; 2Ts 1.1 e 2Co 1.19). Na narrativa lucana
sobre a segunda viagem missionária, o nome que ali figura é "Silas"
(por nove vezes
entre
Atos 15.40 e 18.5). Em algum momento
tornou-se um amanuense/escriba de Pedro auxiliando na escrita deste primeiro
documento do apostolo - (Por meio de Silvano... vos escrevo..., 5.12), o
que explicaria o estilo literário grego da epístola. É preciso muita imaginação
para concluir que Pedro, pescador galileu, produziu um vocabulário grego tão refinado
quanto apresentado nesta correspondência circular. O que não implica de forma
alguma que Pedro não seja o responsável direto do conteúdo conceitual da
epístola.
A
similaridade entre as exortações éticas de Pedro e as que são encontradas nas
epistolas paulinas pode significar que ele foi de certa forma influenciado
pelos ensinos paulino ou que as recebeu por intermédio de Silvano/Silas; ou ambos
tiveram acesso a algumas fontes comuns - orais ou escritas.
Razões
Para Estudar 1 Pedro
Entre
muitas razões para nos dedicarmos tempo ao estudo deste livro do Novo
Testamento, podemos nomear alguns:
•
Aprendermos a enfrentar o sofrimento sob a mesma perspectiva do Servo Sofredor
supremo, o Senhor Jesus Cristo, o Grande Pastor das Ovelhas
•
Vivenciar o evangelho entre os não crentes em todos os contextos sociais
•
Manter a esperança focada na exaltação de nosso Senhor em Seu retorno glorioso
•
Viver o presente na perspectiva da eternidade – entendendo que somos peregrinos
nesta terra
•
Manter a nossa comunhão com os irmãos fortalecendo uns aos outros nas
adversidades e perseguições que haverão de vir
Esboço
Suscinto
Introdução
(1.1-2)
A esperança cristã
exposta (1.3-12)
Esperança
fundamentada no sacrifício de Cristo e em Sua atual posição de glória e poder (1.13-21)
Responsabilidade de mudar
e amadurecer na conduta cristã (1.22–2.3)
Cristo,
o Cabeça espiritual da Igreja (2.4-8, 21-25)
Instruções específicas
para o crescimento espiritual cristão (2.9-20)
Deveres
dos maridos e das mulheres (3.1-7)
Instruções sobre como
viver em retidão apesar dos sofrimentos (3.8–4.19)
Conselhos
aos anciãos, incluindo resistir ao adversário - "o leão rugindo" (5.1-9)
Considerações finais
(5.10-14)
Utilização livre desde
que citando a fonteGuedes, Ivan PereiraMestre em Ciências da
Religião.me.ivanguedes@gmail.comOutro BlogHistoriologia Protestantehttp://historiologiaprotestante.blogspot.com.br/
Referências Bibliográficas
EVERETT
F. HARRISON, Everett F. Introducción
al Nuevo Testamento. Traducido por Norberto Wolf. Subcomisión Literatura
Cristiana dela Iglesia Cristiana Reformada. Michigan: TELL, 1980/1987.
GUTHRIE,
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MUELLER,
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SELWYN,
Edward Gordon. The First Epistle of St. Peter. London: Macmillan &
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SWINDOLL,
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São Paulo: Mundo Cristão, 2004. [Coleção heróis da fé].
STIBBS,
Alan M. The First Epistle General of Peter: An Introduction and Commentary.
Wm. B. Eerdmans Publishing Co., 1988.
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