Em
relação a uma posição mais tradicional há pelo menos duas vertentes no que
concerne à data do livro de Atos:
Com
base em Irineu,[1]
que data Mc e Lc pouco depois do martírio de Pedro e Paulo em Roma, bem como o
prólogo antimarcionita e o Cânon de Muratori, a
data de composição de Atos deve ser colocada entre os anos 70 e 80.
Outra
tradição cristã antiga, fundamentada principalmente em Eusébio de Cesárea,[2]
que afirma haver Lucas escrito este seu segundo volume de Atos um pouco antes
de Paulo ser absolvido de seu primeiro encarceramento. Deste modo, Atos deve
ter sido escrito no final de 62 e princípio de 63.
A crítica
moderna, com base nas análises literárias do texto, também se divide em duas correntes:
Uma,
em que se alinham vários estudiosos entre os quais Harnack,[3]
propõe a datação em torno de 63, baseada principalmente no término abrupto do
livro, sem qualquer referência a libertação de Paulo, nem a outros fatos
importantes como a destruição de Jerusalém no ano 70, bem como às primeiras
perseguições mais violentas aos cristãos por parte do Império Romano, a partir
do ano 64.
A
outra posição insiste em colocar a data para depois da morte de Paulo (66 ou
67), porém não estão de acordo se foi antes ou depois de 70.
Ainda
se defendeu em tempos anteriores datas bem posteriores (115 a 130 d.C.). A
chamada Escola de Tubingen,[4]
cujo expoente maior foi F. C. Baur[5]
propunha esta data avançada, pois entendiam que o objetivo do escritor era
apaziguar os conflitos entre os cristãos judeus, cuja liderança advinha de
Pedro e os cristãos gentios cujo baluarte era Paulo. Entretanto, a
fundamentação histórica desta tese demonstrou-se frágil e hoje praticamente
abandonada. Outros advogados de data tão avançada tentaram associar o escritor
de Atos com os escritos históricos de Josefo
(Antiguidades, 94 d.C.), mas uma vez mais falta consistência histórica para tal
exercício acadêmico.
Muitos
estudiosos entendem que Atos não poderia ter sido escrito muito tempo depois de
90, pois traz em suas páginas uma visão bem positiva e até otimista do Império
Romano, em relação ao cristianismo, o que mudou radicalmente após Domiciano e
também o escritor não faz a mínima referência às correspondências de Paulo, que
já estavam reunidas e circulavam juntas no final do século I.
O Império e o Cristianismo
O
Império Romano estava em seu apogeu. Augusto havia estabelecido um firme
fundamento administrativo sobre o qual seus maiores sucessores puderam
construir e os piores não puderam demolir.
A
continuação da civilização romana trouxe benefícios para os habitantes do Império,
mesmo se os governantes foram fracos ou tirânicos ou ambos. Os Imperadores
durante o período coberto pelo livro de Atos, c. 31-63 d. C., foram: Tibério (14-37), Calígula (37-41), Claudio
(41-54), Nero (54-68).
Tiberius
Claudius atentou para o bem dos seus vastos territórios, enquanto Calígula e
Nero, o pouco que fizeram foi ruim. Mas, apesar dessas variações no governo do
Estado manteve-se as condições para a propagação do Evangelho.
Os
fatores que ajudaram na tarefa dos apóstolos foram:
§ um governo relativamente estável,
§ um sistema administrativo comum,
§ a justiça concedia a cidadania romana cada vez com mais
facilidade,
§ paz preservada pelas bem disciplinadas legiões,
§ estradas chegando a todos os cantos do mundo então conhecido
§ e a utilização da língua grega – falada por todo o império.
A princípio
o cristianismo usufruiu do vínculo com o judaísmo. Os judeus haviam sido
dispersos pelos mais variados lugares do império, incluindo a capital, e suas
crenças básicas foram amplamente toleradas pelos romanos. Assim, o cristianismo,
como um apêndice da fé mais antiga,
compartilhou a tolerância, mas depois descolou-se do judaísmo. Os judeus foram
expulsos de Roma durante o reinado de Claudio (Atos 18: 2), e as fortes
aspirações nacionais dos judeus causou a rebelião na Palestina e a desastrosa
guerra dos anos 66-70 d. C., que culminou com a destruição de Jerusalém em 70
d. C.
Na
medida em que a relação dos judeus com o império se deteriora, a situação dos
cristãos torna-se preocupante. Não eram uma religião legalmente reconhecida e
seus membros não eram protegidos pela lei. Quando surgiram as dificuldades,
como quando do terrível incêndio de Roma
no ano 64 d. C., foi fácil culpar a comunidade cristã, e as perseguições subsequentes
produziram um terrível precedente que foi seguida fielmente nos anos seguintes.
Esta
situação serviu como um pano de fundo para Lucas preparar sua história da
igreja primitiva e de escrever o seu segundo volume - Atos.
Utilização livre desde que citando a fonte
Guedes, Ivan Pereira
Mestre em Ciências da Religião.
Universidade Presbiteriana Mackenzie
me.ivanguedes@gmail.com
Outro Blog
Historiologia Protestante
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[1] Ele foi um dos discípulos pessoais de
Policarpo, que por sua vez era discípulo do Apostolo João. Irineu serve como
elo importante com a época dos Apóstolos, sendo martirizado cerca do ano 200.
Em seus escritos encontra-se muitas referências da literatura neotestamentária
(120-205 d.C.).
[2] Bispo da igreja de Cesárea quando
Constantino ascendeu ao trono. Escreveu uma história da igreja, detalhando ao
cristianismo desde os dias de Jesus até o tempo de Constantino (270-340 d.C.).
[3] Professor de história das religiões no Colégio de França em 1909, ele
escreveu grande número de obras sobre as origens do cristianismo e a história
comparada das religiões, tornando-se cada vez mais crítico em relação aos
próprios fundamentos da fé.
[4] Na cidade de Tübingen (port. Tubinga),
no estado alemão do Baden-Wüttenberg, foi fundada em 1477 uma instituição que
nos séculos seguintes se tornaria uma das mais prestigiosas, particularmente no
que concerne aos estudos teológicos. Tornou-se o principal centro acadêmico
liberal no que concerne os estudos bíblicos.
[5] Em 1826 chegou em Tübingen o exegeta
Ferdinand Cristian Baur que até sua morte em 1860 exerceria influência
dominante na pesquisa exegética do Novo Testamento e deixando um vasto legado
que perdura até hoje, firmando definitivamente o nome daquela universidade no
campo da pesquisa neotestamentária. Atualmente grande parte de suas críticas
sobre os livros bíblicos tornaram-se fragilizadas.
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