segunda-feira, 21 de outubro de 2019

Viajando no livro de Atos: O Cenáculo e a Primeira Igreja Cristã (1.12-26)



            Enquanto aguardamos o inicio de nossa viagem seguindo o roteiro proposto por Lucas, fizemos uma caminhada pela cidade de Jerusalém e conhecemos um pouco de sua extraordinária história.
            Enquanto continuamos na cidade estamos participando das reuniões dos discípulos em um amplo salão que ficava no andar superior de uma casa, essas salas eram muitas vezes usadas como salões para reuniões familiares, provavelmente era da mãe de João Marcos, e o numero de participantes era crescente. Esse local das reuniões chamado de Cenáculo também foi o local em que Jesus havia passado sua última refeição pascal com seus discípulos e a ocasião em que Ele instituiu a Ceia cristã. Assim, a cada reunião se pode sentir uma carga emocional muito forte, pois eram inevitáveis as lembranças daqueles últimos momentos com o Mestre.
            Mormente os apóstolos,[1] com exceção de Judas Iscariotes, estavam presentes nas reuniões, juntamente com diversas mulheres (Lc 8.2s; 23.49,55; 24.10) e Maria a mãe de Jesus e alguns de seus outros filhos, meio irmãos de Jesus, e não havia qualquer distinção especial nem a ela e nem aos irmãos[2].
Nas reuniões havia muitas orações e oportunidades para compartilharem alguns dos momentos deles com Jesus, bem como relembrar suas palavras e ensinos. O espírito de comunhão e alegria era maior do que as preocupações que ainda pairavam no ar por parte principalmente das autoridades religiosas judaicas e também pelas autoridades civis romanas que temiam algum tipo de rebelião, de maneira que durante as reuniões mantinham-se as janelas e portas fechadas.
            Foi durante uma das reuniões, mais ou menos vinte dias após a ascensão de Jesus, onde havia um numero expressivo de presença, cerca de cento e vinte pessoas[3], e por esta razão talvez feita no pátio interior da residência, que Pedro, restaurado em sua condição de líder pelo próprio Jesus (apascenta minhas ovelhas)[4] propôs que era momento oportuno de escolher alguém para ocupar o lugar do Iscariotes, que após trair Jesus havia tirado a própria vida. A dor está no fato de que Iscariotes era “contado entre nós!”. Mas ainda que o ato maligno de Iscariotes surpreendesse a todos (menos Jesus), suas ações foram cumprimentos de profecias registradas no Primeiro Testamento (Salmos 69.25 e 109.8). Esses e outros salmos são denominados de messiânicos, pois o teor de sua mensagem refere-se ao Messias e que se cumprem na pessoa de Jesus Cristo. Agora chegara a hora de outro tomar o seu lugar no grupo apostólico.
O critério básico é que o candidato tivesse feito parte do grupo maior de discípulos (provavelmente os setenta que foram enviados dois-a-dois) que conheceram Jesus pessoalmente e principalmente que testemunhou sua ressurreição - o evento decisivo que realmente faz do Cristianismo o Cristianismo! Pouco significado teria para eles, para nós e para o mundo todo o fato de que o ser humano Jesus de Nazaré tivesse vivido, ensinado, curado, amado e sofrido a mais cruel das mortes, se esse Jesus não tivesse ressuscitado dentre os mortos ao terceiro dia e assumido sua posição de “Senhor e Cristo” (cf. Atos 2.32-36; 3.13-15; 4.10-12; 13.38s; 17.30s). Como escreveria posteriormente Paulo – se Cristo não ressuscitou o Evangelho é uma completa fraude e nós somos os mais infelizes sobre a terra.
            Diante dos critérios dois nomes foram indicados pelos irmãos: José, chamado Barsabás, com o cognome Justo, e Matias [diminutivo de Matatias]. Pedro solicita um tempo de oração e após o nome de Matias é confirmado[5] para ocupar um lugar no corpo apostólico dos Doze[6] e a alegria e gratidão a Deus toma conta da reunião.
            Mas um acontecimento maior e mais extraordinário está para acontecer em alguns dias. Esse acontecimento demarcara o principio da expansão do Evangelho e da Igreja de Cristo por todo o mundo.


Utilização livre desde que citando a fonte
Guedes, Ivan Pereira
Mestre em Ciências da Religião.
Universidade Presbiteriana Mackenzie
me.ivanguedes@gmail.com
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Referências Bibliográficas
BAXTER, J. Sidlow. Examinai as Escrituras, v. 6. São Paulo: Vida Nova, 1989.
CHAMPLIN, R. N. Enciclopédia de Bíblia, Teologia e Filosofia. São Paulo: Hagnos, 8ª ed., 2006.
ELWELL, Walter A. e YARBROUGH, Robert W. Descobrindo o Novo Testamento – uma perspectiva histórica e teológica. Tradução Lúcia Kerr Jóia. São Paulo, Cultura Cristã, 2002.
ERDMAN, Charles R. Hechos de Los Apóstoles. Ed. TELL, 1974.
JEREMIAS, Joachim. Jerusalém no tempo de Jesus – pesquisa de história econômico-social no period neotestamentário. Tradução M. Cecília de M. Duprat. Santo André (SP), Academia Cristã; São Paulo, Paulus, 2010.
RYRIE, Charles C. Bíblia de estúdio Ryrie. Chicago (Illinois): Moody Press, 1991.
SMITH, T. C. Comentário Bíblico Broadman, v.10. Rio de Janeiro: JUERP, 1984.
WALKER, Peter. Pelos caminhos de Jesus – guia ecumênico de jornada à Terra Santa. Tradução Andréa Mariz. São Paulo, Edições Rosari, 2007. 
WILLIAMS, David J. Novo Comentário Bíblico Contemporâneo – Atos. São Paulo: Vida, 1996.
UNGER, Merrill Frederick. Manual bíblico Unger. Tradução Eduardo Pereira e Ferreira, Lucy Yamakami. São Paulo, Vida Nova, 2006.



[1] No transcorrer das narrativas lucana somente Pedro (54 vezes), João (07 vezes) e Tiago (02 vezes) serão novamente nominados, enquanto André e os demais apóstolos, incluindo o recém-inserido Matias, desapareceram dos capítulos posteriores.
[2] É a última referência bíblica a Maria mãe de Jesus e ela é colocada em pé de igualdade com as demais mulheres presentes na reunião, assim como os irmãos - todos ligados pela conjunção “e” “... com as mulheres, e Maria, mãe de Jesus, e com os irmãos dele” (1.14).
[3] Esse é significativo na tradição judaica: 120 pessoas era o numero mínimo exigido para se formar uma nova comunidade. O número 120 é o múltiplo de 12, desta forma esse grupo representa o novo povo de Deus onde há a inclusão de Israel e gentios.
[4] As narrativas bíblicas nunca dissimulam ou omitem as falhas de seus personagens, mesmo aqueles que serão protagonistas dos eventos a serem desenvolvidos.
[5] Utiliza-se aqui o lançar sorte, para saber qual dos dois, mas é preciso lembrar que o Pentecostes, ou seja, a descida do Espírito Santo ainda não havia ocorrido.
[6] Muitos anos depois Paulo seria chamado pelo próprio Jesus Cristo para ser apóstolo, não para os judeus (Doze), mas para os “gentios ou nações”. Paulo defende sempre seu apostolado nesses termos (1Co 15.5-10) e nunca exigiu ou disputou um “lugar” entre os “Doze”, mas a equivalência de seus apostolados.

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