Mateus
27.33 - Chegaram a um lugar chamado Gólgota, que quer dizer lugar da Caveira,
Marcos 15.22 - E levaram-no ao lugar do Gólgota, que se traduz por
lugar da Caveira.
Lucas
23.33 - E, quando chegaram ao lugar chamado a Caveira, ali o crucificaram, e
aos malfeitores, um à direita e outro à esquerda.
João 19.17 - "E,
levando ele às costas a sua cruz, saiu para o lugar chamado Caveira, que em
hebraico se chama Gólgota."
Análise
e Comentário dos Textos
Mateus
- Podemos
incluir esse verso 33 em uma pequena perícope (32-34) onde Mateus
acompanha Jesus no chamado caminho do Gólgota (em latim, Calvário).
Após ser traído por Iscariotes, Jesus é conduzido à casa de Anás, sogro de
Caifás, e depois a Caifás, o sumo sacerdote, onde é interrogado e enfrenta
falsas acusações. É aqui também que Pedro o negará por três vezes sucessivas.
A
noite vai passando e Jesus é levado de um para outro lugar: Conselho do
Sinédrio, Pilatos, Herodes Antipas, que o devolve a Pilatos. É aqui, já pela
manhã que a sentença é proferida: conforme a prática romana da época, Ele foi
açoitado em 39 vezes. Depois dos açoites implacáveis, os soldados romanos
passaram a zombar dele e confeccionando uma coroa de espinhos, e gravando na
cabeça dEle, se curvavam e o chamavam zombeteiramente de o “rei dos judeus”.
Então lhe
entregam a trava horizontal da cruz, chamada patibulum, pois a parte
vertical já estava no local da sentença. Essa trava pesava aproximadamente 30 a
50 quilos, e a pessoa deveria levá-la em todo o trajeto, que ficou conhecido
como Via Dolorosa ou Via Crucis, que significa "Caminho
da Dor" ou "Caminho da Cruz", em uma extensão de
aproximadamente 600 metros. A
noite não dormida, os flagelos físicos sofridos, debitaram fisicamente Jesus e
no meio do caminho o soldado ordena que um expectador, Simão de Cirene, para
ajudá-Lo até chegar ao Gólgota.
Depois
de mais de uma hora “Eles chegam ao lugar chamado Gólgota, que
recebia a alcunha de “Lugar da Caveira”, pois a
rocha que compunha o local tinha um formato semelhante. Era o lugar
estabelecido para a crucificação dos criminosos mais perigosos, após a sentença
definitiva.
O
local é fora dos muros da cidade, mas todo o trajeto era percorrido por pessoas
que entrava e saiam pelos portões da cidade, de modo que a crucificação se
tornava um “espetáculo público”. Gólgota é o nome
aramaico do local, mas no grego é κρανίον (kranion) quer foi traduzido para
o latim como “calvaria”, de onde vem a transliteração para “calvário”.
Marcos
-
Calvário é uma palavra latina e Gólgota sua versão hebraica. Esse pequeno verso
é a dobradiça das eras; tudo que foi escrito no Primeiro Testamento e/ou Antigo
Testamento e tudo que será escrito no Segundo Testamento e/ou Novo Testamento,
tem sua apoteótica no Calvário. Como escreve de forma contundente Erich Sauer: “...é
o ponto de virada; de todo amor é o ponto mais alto, e de toda salvação é o
ponto de partida, de todo culto é o ponto central". Um detalhe sublime
é que as palavras "Calvário" e "eternidade"
são encontradas apenas uma vez, mas elas fazem toda diferença na nossa história,
pois no Calvário toda a nossa eternidade foi transformada. Estávamos destinados
a uma eternidade sem Deus, mas por causa do Calvário (Cristo) estaremos eternamente
com Ele. As versões que trocam o uso de Calvário, por “a Caveira”, lamentavelmente
empobrece a mensagem teológica do texto.
O
Calvário é o centro da História da Humanidade. O nascimento e a crucificação de
Cristo são o epicentro em torno do qual giram todos os acontecimentos
históricos dos séculos. O Calvário mostra até onde os homens irão em seu estado
de pecado e miséria, mas também revela até onde Deus irá pela salvação do ser
humano pecador.
Mas
uma das coisas mais extraordinárias que acontece no Calvário é que não havia
apenas três cruzes ali, mas sim milhares/milhões de cruzes ali representadas. O
apostolo Paulo entendeu isso como poucos, como ele expõe em suas epistolas: “Ora,
se morremos com Cristo, cremos que também com ele viveremos,” (Rm 6.8); “Fui
crucificado com Cristo; e já não sou eu que vivo, mas Cristo vive em mim;”
(Gl 2.20).
Quando
você perguntar quem O crucificou, olhe para sua mão, e verá o martelo.
Uma
peculiaridade da narrativa de Marcos é que menciona o tempo em que Jesus Cristo
fica crucificado. Quem pode penetrar esses profundos mistérios ou profundezas
dos sofrimentos do Cordeiro de Deus, quando Ele foi obediente até a morte, a
morte da Cruz! Longas e intermináveis seis horas, equivalentes a 360 minutos...e
durante todo esse tempo Ele poderia ter descido da Cruz... mas não o fez... ficou
pendurado lá, bebendo gota a gota o cálice da morte... horas e minutos
carregados de dor e sofrimento... mas Ele permaneceu ali... pregado...
unicamente por amor de mim e de você!
O
desfio que Jesus lançou para aqueles que queriam segui-Lo foi: “... tome a
cruz... e siga-Me”. O caminho percorrido por Cristo é uma ilustração real
daqueles que se dispõem a crer Nele como único e suficiente Salvador e Senhor.
Milhares de cristãos “caminharam” para a morte (muitas vezes em desfiles
abertos) para satisfazer a crueldade das multidões que os escarneciam e
amaldiçoavam, até chegarem aos Coliseus Romanos espalhados pelo Império.
Com
sua ressurreição Jesus transformou a cruz de símbolo de morte, para símbolo de esperança
e salvação para cada que Nele crê. Muitas vezes temos que enfrentarmos nossos
próprios "Gólgotas", e devemos sempre nos lembrarmos que nossas lutas
e dores (traições, abandono) podem nos levar a um profundo crescimento e
transformação pessoal. Da mesma forma que o sacrifício de Jesus trouxe a
salvação, nosso sofrimento pode ser a ponte para aprofundar nossa comunhão com
Deus e fortalecer no esperança Nele.
Lucas -
Deveríamos ler os relatos da crucificação com temor e tremor. Quem está sendo
crucificado ali é o Filho Amado de Deus! A indiferença e frieza com que os
cristãos evangélicos tratam essas narrativas é assustadoramente preocupante,
pois revela muito da falta de essência em suas profissões de fé. Vivemos dias
em que para alguns os cultos são cátedras para expor seus pontos teológicos e
para outros shows para satisfazerem suas necessidades de exposição e notoriedade.
É preciso urgentemente lermos esses textos com alma e coração, e nos jogarmos
aos pés da cruz e clamarmos por perdão e graça!
“E eles
o crucificaram” – ainda que pensássemos uma eternidade nesta
frase não alcançaríamos a profundidade e a altura do significado dela para
pessoas pecadoras como nós. Essas 3
palavras são encontradas em todos os quatro relatos evangélicos. Mas a
peculiaridade é que pouco se fala do tamanho da cruz, dos pregos, do esforço para
empurrar Suas pernas, das feridas em Suas costas esfregando contra a madeira
áspera da Cruz; da Sua dificuldade em respirar...sucintamente... “E eles o
crucificaram”.
O
escritor romano Cícero descreveu a crucificação como "a punição mais
cruel e hedionda possível". Esse tipo de morte tem sua origem aparentemente
na Pérsia, sendo adotada posteriormente pelos cartagineses e gregos, finalmente
pelos romanos. O dissuadir rebeliões e aumento dos crimes. Se as autoridades
judaicas odiavam e condenavam Jesus por causa de Seus ensinos, os romanos que
não tinham qualquer interesse religioso, estava condenando-O como agitador político
e possível fomentador de rebeliões.
Ao recusar
a bebida oferecida pelos executores romanos (vinho misturado com mirra), Jesus
estava apenas refirmando o que havia dito a Pedro: "O cálice
que o Pai me deu, não o beberei?" (Jo 18.11, cf. Mt 26.39). Esse
cálice cheio ilustrava a ira total de Deus que seria derramado totalmente sobre
Ele - "aquele que não conheceu pecado foi feito pecado por nós, para
que nele nos tornemos justiça de Deus" (2Co. 5.21). Amor Imensurável!
Os
dois personagens que ladeiam Jesus na cruz são representativos de toda a
humanidade. O deboche e a ironia de um são semelhantes às reações daqueles que
viram o julgamento e estão assistindo à crucificação d'Ele com o mesmo espírito
de desprezo. O outro, que inicialmente expressa a mesma atitude, diante da
postura de Jesus, repensa e, ao fazer uma autoanálise, expressa sua conclusão
ao outro: “Eu e você merecemos estar aqui, pois temos consciência das ações
erradas que temos feito; mas Este nada fez para merecer uma morte tão cruel”.
Infelizmente, muitos chegam a este ponto e param. Mas aquele homem, depois de
olhar para si e perceber seu estado miserável de pecado, olha para Jesus, e
isso faz toda a diferença em sua vida – e conclui com uma das orações mais
curtas da Bíblia: “Lembra-Te de mim quando entrares em Teu reino”. Ó glória!
Quem dera todos os pecadores no mundo inteiro pudessem olhar para Jesus e fazer
a mesma oração!
A
resposta de Jesus foi imediata, e, como a oração, a resposta é curta e direta: “Hoje
mesmo estarás comigo no paraíso” (vv. 39-43). Este verso não é apenas sobre
a crucificação, mas é Deus escancarando o coração. Seu amor gracioso e
imensurável pelo ser humano feito à Sua imagem e semelhança resplandece em todo
o seu esplendor e poder. Hoje e não talvez, ou quem sabe, ou mais tarde...Hoje
estará Comigo...para sempre!
João - João não
registrou muitos detalhes encontrados nas anteriores redações de seus colegas.
Este versículo é tudo o que João relatou da Via Dolorosa. Uma das razoes é que
ele, por escrever em tempo bastante posterior, tinha conhecimentos do material produzido
pelos evangelistas que o antecederam. O Espírito Santo não é repetitivo ou
enfadonho e ao inspirar os escritores o faz com sabedoria e discernimento,
registrando os detalhes que realmente fossem relevantes e edificantes para
todos os leitores futuros, pois nem um dos evangelistas, incluído João, poderia
imaginar que no século 21 estaríamos lendo suas narrativas.
“Então
Ele saiu para um lugar...” – uma frase tão simples reveste-se de um
valor extraordinário. Tudo o que aconteceu com Jesus até este ponto ocorreu
dentro dos muros da cidade de Jerusalém e, portanto, nas proximidades do
templo. A nossa “justiça e/ou justificação” precisa ser buscada em
Cristo e em Seu sacrifício. E, para tirar qualquer dúvida de que Ele é, de
fato, o sacrifício em nosso favor, para remissão de nossos pecados, Jesus
precisa ser levado para fora da cidade e ser levantado no madeiro, como
prescrito em Levítico (6.30).
Segundo
a prescrição da Lei, o sacrifício cujo sangue fosse derramado pelo pecado
deveria ser levado para fora do acampamento, e a mesma Lei declara que aquele
que está pendurado no madeiro é amaldiçoado. Ambas as prescrições foram
literalmente cumpridas em Jesus Cristo, que se submeteu à maldição para nos
redimir da maldição da Lei que nos condenava.
O
escritor de Hebreus (12.12) entendeu perfeitamente esta cena: “Que Ele foi
levado para fora da cidade a fim de levar consigo e tirar as nossas
contaminações que foram colocadas sobre Ele”. A perfeita harmonia de todas
as partes das Escrituras é maravilhosa.
Ao
sair carregando a cruz, Jesus sabia que Seu destino era o Gólgota. Lembrando-se
de Sua oração no horto do Getsêmani, cuja agonia verteu-se em gotas de sangue,
Jesus mantém-se firme e resoluto em cumprir plenamente a vontade do Pai, e não
a Sua. Diferentemente de Isaque, que não sabia, Jesus sabe que Ele próprio é o
Cordeiro e que não aparecerá outro cordeiro para substituí-Lo – “Cumpra-se
em mim a Tua vontade, ó Pai” (Mt 26.39; Lc 22.42). Temos fé suficiente para
fazer essa declaração em todos os momentos da nossa vida?
A
caminhada de Jesus é também a nossa. Haveremos de enfrentar as mais difíceis e
dolorosas circunstâncias. Seremos incompreendidos muitas vezes, perseguidos e
até mortos. Mas, assim como Jesus, devemos nos manter firmes e resolutos em
fazer toda a vontade de Deus, sorvendo até a última gota do cálice das
aflições. Ele não é apenas o nosso modelo, mas também a nossa força na
tribulação, o nosso abrigo no temporal e a nossa esperança eterna. Bendito seja
o nosso Deus, que nunca nos desampara. Amém!
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Bibliográficas
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Palestina nos tempos de Jesus. 7ª ed. São Paulo:
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Kurt. Os Partidos Religiosos Hebraicos da época Neotestamentária. 2
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