sábado, 10 de março de 2018

Salmo 119 - Introdução Geral


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            O conjunto de cento e cinquenta salmos é chamado de Saltério e se constituem no maior livro de toda a Bíblia. Portanto, se cremos que a revelação (bíblica) de Deus é progressiva, temos aqui a maior porção individual de toda a orientação divina para as nossas vidas.
Muitos gostam de chamar os salmos de "o coração das Escrituras", pois se você abrir a Bíblia exatamente no meio se deparara com os salmos. Mas também porque temos aqui o derramar do coração e da alma dos salmistas tanto na alegria, quanto na triste, tanto nos pastos verdejantes quanto nos vales da sombra da morte.
Além de conter também palavras que foram apropriadas pelo próprio Jesus Cristo (1Pe 1.11) nos momentos derradeiros do calvário, este conjunto de canções-orações expressam as glórias e sofrimentos de Cristo e exalam os sentimentos mais profundos do coração dele.
Evidentemente que dentre os cento e cinquenta salmos há alguns que no transcorrer dos séculos, tanto no judaísmo quanto no cristianismo, acabaram ocupando um lugar especial no coração do crente. Um exemplo é sem dúvida alguma o Salmo 23 conhecido também como o salmo do “Bom Pastor”. Mas haveremos de nos deter nessa série de artigos no Salmo 119,[1] o mais longo de todo o Saltério e o mais longo capítulo de toda a Bíblia.
O grande tema do Salmo 119 é a própria Palavra de Deus, a amada Torá (Lei, Instrução)[2] de Deus para o seu povo em todos os tempos. Todas e cada uma das vinte e duas partes deste extraordinário poema musical expressão de forma única o valor intrínseco e extrínseco das Escrituras Sagradas, quer seja no seu Primeiro quanto em seu Segundo Testamentos. Ele contém 176 versos, ou seja, 22 estrofes com 8 versos cada. Com exceção de três versos (v. 90, 122, 132), que não contém uma referência expressa à Torá, todo o restante do salmo é o esforço do salmista em compartilhar conosco eus próprios sentimentos sobre a incomparável excelência da Palavra de Deus.
A leitura e contemplação desta maravilhosa parte das Escrituras nos paz pensar sobre a nossa postura cristã diante de uma sociedade totalmente alienada de Deus e que se opõe continuamente a tudo que se relaciona com a vontade de Deus. Nos dias do salmista, provavelmente durante ou após o Cativeiro Babilônico, seus contemporâneos apesar de conhecerem a Torá, optaram por não obedece-la e as consequências nefastas desta escolha trouxe sobre todos eles a manifestação do juízo de Deus.
A sociedade brasileira e especificamente os evangélicos também conhecem (ouvem) a Palavra de Deus, mas tem se negado a obedece-la e como aconteceu nos dias do salmista está prestes acontecer também nos dias atuais – a manifestação da ira de Deus sobre toda injustiça e todo o pecado. Deste modo, ao compor esse longo Salmo, o salmista tem como objetivo despertar a mente e o coração de seus contemporâneos para o valor do conhecimento e da obediência à Palavra de Deus, para que não mais precisem receber a disciplina de Deus, mas possam usufruir em abundância de sua graça e bênçãos.
Este longo Salmo tem uma característica peculiar, ele é um dos chamados salmos acrósticos. É uma forma literária na qual as letras iniciais de cada linha, lidas de cima para baixo, formam uma palavra ou frase. Temos um acrostico alfabético quando as linhas começam com as letras do alfabeto (a primeira com a primeira letra, a segunda com a segunda letra e assim por diante). A poesía hebraica não tem ritmo regular nem rima e muitas vezes são extremamente emocionais de maneira que, a estrutura acróstica facilita a memorização[3] e o Sl 119 é o exemplo maior onde cada um dos oito versos inicia-se com uma letra do alfabeto[4] hebraico sempre enaltecendo o valor da Torá. Os acrósticos formam um pequeno hinário dentro do Saltério (9-10, 25, 34, 37, 111, 112, 119, 145).[5] O Salmo 119 é sem dúvida o mais complexo deles, pois cada estrofe tem todos os versículos começando com uma mesma letra do al­fabeto. Assim, as vinte e duas estrofes cantam a plenitude da perfeição da Torá, com todas as suas letras, desde o alef até o tau. Em cada uma das estrofes, os oito versículos mencionam a Lei, desig­nada como Torá ou por meio de um dos seus sinô­nimos. Não há um fio condutor de maneira que cada versícu­lo é uma sentença que se sustenta por si mesma, sempre com um elogio e declaração de amor a Deus que se expressa no anseio do salmista (crente) de viver segundo sua Palavra. Todos os acrosticos na Bíblia são alfabéticos.[6]
As vinte e duas estrofes do Salmo 119 são na verdade vinte e duas orações que são iniciadas pelos primeiros três versículos do Salmo. E na primeira estrofe o salmista une a Palavra de Deus e a oração, atestando que a Palavra e a oração se unem em um único rio e quando somos plantados às suas margens nossas não murcham e produzimos frutos o ano inteiro. Não tem como desenvolver uma vida espiritual saudável e proveitosa, capaz de resistir às tentações sem a Palavra de Deus e a oração, de maneira que o salmista sabia muito bem disso, por esta razão inicia o Salmo com esta junção.
Mas além do tema central que é o valor permanente da Palavra de Deus, o salmista aplica esta Torá às varias instâncias ou particularidades da vida humana: se refere às tentações da mocidade (119:9); trata do apego material exarcebado (119:36-37), do “opróbrio e (...) desprezo" constantes (119:22), da tristeza (119:28) e da difamação (119:69). Além disso, segundo o salmista, ao amarmos e obedecermos a Palavra de Deus não teremos do que nos envergonhar (119:6,22), cultivaremos um coração íntegro (119:7) e uma vida pura (119:9), e não nos desviaremos dos mandamentos de Deus nem pecaremos contra ele (119:10,11,30).[7]
Em cada uma destas situações cotidianas ele se volta para a Palavra de Deus. Assim deveria viver cada cristão diante das situações e circunstâncias semelhantes. A palavra de Deus deve ser sempre a nossa fonte de força, consolo, alegria, esperança e salvação.
Os Sete Sinônimos da Torá no Salmo 119
Ainda dentro desta parte introdutória da exposição do Salmo 119 é preciso ao menos fazer referência aos diversos sinônimos que o salmista utiliza para se referir diretamente à Palavra de Deus (Torá). Ao fazer isso o salmista explora de forma maravilhosa todas as dimensões da Palavra de Deus, que se referem a todas as áreas da nossa vida cristã, a soma da sua palavra é verdade e todas as tuas justas ordenanças são eternas”, diz o verso 160.
A Torá (Instrução, Lei) expressa a revelação dos pensamentos de Deus sobre tudo o que é benéfico e abençoador. Neste salmo a palavra de Deus encontra sua aplicação na lei, nos testemunhos, nos mandamentos, nas ordenanças, nos estatutos, nos direitos e nos julgamentos. 
No contexto cristão o objetivo da Palavra de Deus é trazer o ser humano para a luz de maneira que ele receba a vida por causa da obra de Cristo na Cruz. No Salmo 119 o crente encontra a regra perfeita que se adapta a todas as suas circunstâncias morais e práticas.  A obediência da Palavra, fruto da graça em nossos corações, é uma resposta amorosa ao amor perfeito de nosso Senhor. No desenvolvimento do Salmo os termos abaixo são utilizados como sinônimos da Palavra de Deus:
1 – Dereb = caminho
2 – Eduth = testemunho
3 – Pikkudim = preceitos
4 – Mizvah = mandamentos
5 – Imrah = dito, promessa, palavra
6 – Torah = lei
7 – Mishpat = juízos
8 – Zedeb, Zadib = justiça
9 – Hukab = estatutos
10 – Dabar = palavras.
Agora vejamos o número de vezes que estas palavras ocorrem no Salmo 119, bem como a sua primeira ocorrência bíblica:
Caminho (dereb) de dareb – caminho, estrada, jornada, curso da vida - toda a vida, estilo de vida. Nos versos 3 e 37 encontramos a expressão: דְדְכ – caminhos, sem o acompanhamento de nenhum dos termos mencionados abaixo. Lembra o Salmo primeiro que abre o Saltério apresentado os “dois caminhos” do justo e do ímpio. Trás sempre a ideia de estilo de vida ou modo de viver – obedecendo a Palavra de Deus ou rejeitando-a. A primeira ocorrência se encontra em Gênesis 3.24 – Deus colocou o refulgir de uma espada para guardar o caminho da árvore da vida. Aparece neste salmo 13 vezes (versos 1, 3, 5, 14, 26, 27, 29, 30, 32, 33, 37, 59, 168).
Testemunho (eduth - עֵדוֹת). Derivado de ud = voltar outra vez, passar novamente, renovar. Testificar, testemunho (significa lealdade aos termos da aliança entre o Senhor e Israel), é a expressão dos pensamentos e vontade de Deus, uma prova certa de uma palavra ou ação de Deus em favor de seus servos (povo). Existia uma cópia da lei de Deus colocada dentro do Santo dos Santos no Tabernáculo e do Templo em Jerusalém, para servir de testemunha de acusação contra o povo de Israel diante do único Deus verdadeiramente misericordioso e perdoador (cf. Dt 31.26). Em Gênesis 21.30 temos a primeira passagem bíblica que a emprega. “Respondeu Abraão: Receberás de minhas mãos as sete cordeiras, para que me sirvam de testemunho de que eu cavei este poço”. Foi usada neste salmo 23 vezes (versículos 2, 14, 22, 24, 31, 36, 46, 59, 79, 88, 95, 99, 111, 119, 125, 129, 138, 144, 146, 152, 157, 167, 168).
Preceitos (pikkudim - פִקֻּד). É derivada de pakad: aceitar, mudar. Seu equivalente português pode ser “instruções com detalhes explícitos” e “regra de ação”. A Palavra de Deus supervisiona a conduta do povo de Deus para que não pratiquem o mal. Apenas os salmistas a empregaram, sendo a primeira em Salmos 19:8 – “Os preceitos do Senhor são retos e alegram o coração”. O autor de Salmos 119 a empregou 21 vezes (versos 4, 15, 27, 40, 45, 56, 63, 69, 78, 87, 93, 94, 100, 104, 110, 128, 134, 141, 159, 168, 173).
Mandamento (mizvah),[8] procedente de Zavah – levantar, erguer, constituir. Daí o sentido de mandamentos constitucionais. A ênfase é freqüentemente na autoridade direta do que é dito, de maneira que o termo hebraico trás a ideia de uma obediência absoluta a uma ordenança cuja autoridade máxima é o próprio Deus. Sua primeira referência está em Gênesis 26.5 – “Porque Abraão obedeceu à minha palavra, e guardou os Meus mandamentos”.[9] E aparece 22 vezes neste Salmo (versículos 6, 10, 19, 21, 32, 35, 47, 48, 60, 66, 73, 86, 96, 98, 115, 127, 131, 143, 151, 166, 172, 176).
Promessa [Palavra] (imrah - אִמְרַה) – do verbo amar – trazer à luz, dizer. Ela se refere a tudo o que Deus falou, ordenou, prometeu. Como nem tudo o que Deus fala é promessa no sentido nato da palavra em português os tradutores têm optado por traduzir a mesma por “palavra”. Quem primeiro a empregou foi Moisés, em Gênesis 4.23 – “E disse Lameque…: escutai o que passo a dizer-vos”. Aparece no salmo em estudo 19 vezes (versos 11, 38, 41, 50, 58, 67, 76, 82, 103, 116, 123, 133, 140, 148, 158, 162, 170, 172).
Lei[10] (torah - תּוֹרָה) – palavra derivada de yarah – projetar, planejar, mostrar. Daí instruir, ensinar. A Torá contém as Instruções de Deus para Seu Povo, apontando para eles Sua vontade, revelação, direção é divulgada. Mas como poderia o coração humano corrompido pelo pecado manter essa lei? Deus mesmo ordenou que parte da lei escrita, provavelmente os dez mandamentos, fosse colocada na Arca da Aliança, um tipo da pessoa de Cristo. Somente o coração do Filho (Servo) amado conseguiu guardar (obedecer) toda a Lei: "Sua lei está dentro do meu coração" (Sl 40.9). A primeira vez que esta palavra é usada está em Gênesis 26.5 – “Abraão guardou as Minhas leis”. Nos Salmos 119 aparece 25 vezes, sempre no singular (versos 1, 18, 29, 34, 44, 51, 53, 55, 61, 70, 72, 77, 85, 92, 97, 109, 113, 126, 136, 142, 150, 153, 163 165, 174).
Juízo (mishpat - מִשְׁפְּט), de shaphat – estabelecer direito, instituir. Mishpat significa o que deve ser observado, o que ajuda as pessoas a discernirem o certo e o errado e decidir em conformidade. Refere-se às decisões do Juiz onisciente a respeito de situações humanas comuns, de maneira que as Escrituras se constituem no padrão que deve reger o relacionamento entre as pessoas. É emprega pela primeira vez para descrever o procedimento de Abraão: “Porque Eu o escolhi para que ordene a seus filhos e a sua casa depois dele, a fim de que guardem o caminho do Senhor, e pratiquem a justiça e o juízo” (Gênesis 18.19). Nos Salmos 119 aparece 23 vezes (versículos 7, 13, 20, 30, 39, 43, 52, 62, 75, 84, 91 (ordenanças), 102, 106, 108, 120, 121, 132, 137, 149, 156, 160, 164, 175).
Justiça (zedeb), de zadab – estar reto, direito, justo. Quando comparado a primeira ocorrência em Levítico 19.15, com a segunda, 19.36, podemos deduzir que a palavra tem referência especial ao equilíbrio daquilo que é justo, correto. É do conhecimento de todos que a balança é o símbolo da justiça. O salmista a emprega 14 vezes neste salmo (versículos 7, 40, 62, 75, 106, 121, 123, 137, 138, 142, 144, 160, 164, 172).
Estatuto (hukka - חֻקַּת), de hakab – cortar, gravar, inscrever; portanto, decretar ou ordenar. Contém a idéia da palavra escrita de Deus e a autoridade de Sua palavra escrita. Refere-se da força obrigatória e do valor permanente das Escrituras como Palavra de Deus. Sua primeira ocorrência está em Gênesis 26.5 – “Abraão guardou os Meus estatutos (preceitos)”. Nos Salmos 119 ocorre 22 vezes (versos 5, 8, 12, 16, 23, 26, 33, 48, 54, 64, 68, 71, 80, 83, 112, 117, 118, 124, 135, 145, 155, 17).
Palavra/Palavras (dabar -  דְּבָר – debariym - דְּבָרִים) – arranjar em uma fila, daí relatar no falar. A palavra falada, a palavra revelada de Deus para a humanidade, quer seja falada ou escrita. Este é o termo mais comum e abrange toda a verdade de Deus seja ela declarada, prometida ou ordenada, "procedendo de Sua boca e revelada a nós".. Os “Dez Mandamentos” em tradução literal seria as “Dez Palavras”.  Aparece pela primeira vez em Gênesis 11.1 – “Ora em toda a terra havia uma linguagem e uma só maneira de falar (de usar as palavras)”. Nos Salmos 119 aparece 24 vezes (versículos 9, 16, 17, 25, 28, 42, 43, 49, 57, 65, 74, 81, 89, 101, 105, 107, 114, 130, 139, 147, 160, 161, 169).
Contam que um rabino, bom conhecedor e amante entusiasta da Lei, que a tinha na ponta da língua, de modo que sempre podia encontrar um versículo apro­priado para felicitar algum membro da comunidade por um acontecimento feliz, ou consolá-lo em qualquer adversidade, ou para aconselhá-lo em uma dúvida, dizia sempre: “A Torá serve para tudo. Nào há situa­ção na vida que nào possa ser iluminada por um ver­sículo da Torá". Um dia ele foi preso e levado, como tantos outros judeus, para um campo de concentração nazista. Mas mesmo ali continuava dizendo: “A Torá serve para tudo, até para viver em um campo de con­centração". E confortava seus companheiros com cita­ções da Lei. Finalmente foi levado, com um grande grupo de correligionários, para a câmara de gás. E, quando estavam para entrar, o rabino disse: “A Torá serve para tudo, até para morrer". E também nessa provação extrema encontrou palavras sagradas com as quais deu forças àqueles que iam morrer com ele.
Quem dera os evangélicos de hoje pudessem falar assim da Palavra de Deus!

Utilização livre desde que citando a fonte
Guedes, Ivan Pereira
Mestre em Ciências da Religião.
me.ivanguedes@gmail.com
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Referências Bibliográficas
ARNOLD, Bill T. e BEYER, Bryan E. Descobrindo o Antigo TestamentoSão Paulo: Cultura Cristã, 2001.
BAXTER, J. Sidlow. Examinai as Escrituras, v.3, São Paulo: ed. Vida Nova, 1993.
BULLOCK, C. Hassell.  An Introduction to the Old Testament Poetic BooksChicago. Moody Press, 1988.
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CHOURAQUI, André. A Bíblia – louvores II (Salmos), v. 2. Tradução Paulo Neves. Rio de Janeiro: Imago Ed., 1998. [Coleção Bereshit].
CONSTABLE, Thomas L. Expository Notes on Psalms. Disponível em: http://www.soniclight.com/constablc/notcs.htm. Acesso em: 30/01/2016.   
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KIDNER, Derek. Salmos 73-150 – introdução e comentário, v. 14. São Paulo: Sociedade Vida Nova e Mundo Cristão, 1981. [Série Cultura Cristã].
LASOR, William S., Hubbard David A. e Bush, Frederic W. Introdução ao Antigo Testamento. São Paulo: Vida Nova, 1999.
MONLOUBOU, L. (Org.). Os salmos e os outros escritos. Tradução Benôni Lemos. São Paulo: Paulus, 1996. [Biblioteca de ciências bíblicas]
PURLISER, W. T. O livro de Salmos, v.3 Tradução Valdemar Kroker e Haroldo Janzen. Rio de Janeiro: CPAD, 2005. [Comentário Bíblico Beacon, 2ª ed.].
RAGUER, Hilari. Para compreender os Salmos. São Paulo: Loyola, 1998.
RODRIGUES, José Carlos. Estudo Histórico e Crítico sobre o Velho Testamento, v.1. Rio de Janeiro: 1921.
SCHREINER, Josef. Palavra e mensagem do Antigo Testamento. Tradução Benôni Lemos. 2ª ed. São Paulo: Editora Teológica, 2004.



[1] A autoria do salmo 119 é desconhecida, embora alguns estudiosos a atribuam a Esdras. Aqueles que atribuem a Esdras o Salmo 119 filiam-se à corrente de estudiosos que identifica indícios de sua composição após o exílio babilônico. Os Pais da Igreja inicialmente optaram por Davi, mas os Latinos preferiram deixar sem definição. Ainda outros defendem a autoria por um dos profetas e os mais indicados seriam Jeremias e Daniel.
[2] No transcorrer do tempo, o termo Torá passou a ser usado para se referir principalmente à lei de Moisés, ou seja, aos cinco primeiros livros do AT. Mais acentuadamente durante e depois do Cativeiro (Diáspora) os judeus começaram a considerar a Torá apenas como regras e normas a ser obedecido, e não como um guia para um modo de vida no qual deveríam levar em conta o espírito e o propósito da lei. Inevitavelmente acabaram caindo na armadilha do legalismo. É justamente esse contexto espúrio da interpretação legalista da Torá que Jesus condenou energicamente em sua época (Mt 23.23-24). O Salmo 119 é o contraponto desta nefasta interpretação legalista, pois o que importa para o salmista é expressar seu amor a Deus na observância ou vivendo em harmonia com a vontade de Deus. Não há neste salmo qualquer vestígio do conceito de retribuição, mas tão somente o desejo amoroso de um coração crente por seu Deus e Salvador. Como falta isso no evangelismo atual.
[3] É preciso lembrar sempre que não havia disponibilidade de material didático de maneira que o ensino era feito normalmente de forma oral. Assim, a forma literária acróstica com sua estrutura peculiar e repetitiva era ideal para se poder ensinar a importância da Palavra aos jovens e às crianças, que teriam uma maneira mais fácil de aprender e memorizar o Salmo, pelo menos em partes, já que cada estrofe utiliza pelo menos seis desses sinônimos e contém em si mesma um resumo de tudo o que o salmista quer dizer.
[4]  As letras que compõem o alfabeto hebraico são na ordem: Álef, Bêt, Guimel, Dálet, He, Vav, Zaim, Hêt, Tét, Iode, Caf, Lámed, Mem, Num, Sâmeq, Áim, Pê, Tsade, Cof, Rêsh, Shim/Sim e Tau.
[5] Além destes temos ainda dois outros acrósticos: Provérbios 31:10—31O louvor da mulher virtuosa e Lamentações de Jeremias – Capítulos 1 a 4 dos quais o capítulo 3 é o mais detalhado.
[6] Diferentemente dos acrósticos encontrados na literatura da Mesopotâmia que é representada por versos, as primeiras letras das linhas das quais formam um nome ou frase (uma vez que a letra Akkadiana é silábica, não havia alfabeto nele, e, portanto, também acrosticos alfabéticos) e referem-se principalmente à primeira metade do primeiro milênio aC. e. Os acrósticos egípcios são sequências numéricas ou mensagens complexas que formam linhas horizontais e verticais. Eles são principalmente baseados em trocadilhos que contribuem para a solução desta tarefa estilística.
[7] Cristo mostrou o papel das Escrituras para combater as artimnhas do diabo quando foi tentado (cf. Mt 4:1-11). Por esta razão devemos como o salmista pedir continuamente a Deus que, em sua bondade, nos ensine seus decretos e preceitos (119.12,26-27,29).
[8] Quando um menino judeu vai completar os treze anos,  se torna maior de idade segundo a lei judaica, a sua família celebra isso com bar mitzvah, porque ele se torna então ‘filho do mandamento’, quer dizer, é responsável a partir deste momento em obedecer os mandamentos por si.
[9] É muito interessante a forma com que Paulo orienta o jovem pastor e sucessor dele, Timóteo: “Ordeno-lhe diante de Deus, que dá vida a todos, e diante de Cristo Jesus, que deu um destemido testemunho perante Pôncio Pilatos que você cumpra tudo quanto Ele lhe mandou fazer, a fim de que ninguém ache nenhuma falta em você, desde agora até a volta do nosso Senhor Jesus Cristo” (1Tm 6.13,14).
[10] O termo lei vem do verbo latino ligare, que significa “aquilo que liga”, ou legere, que significa “aquilo que se lê” é o conjunto de normas recolhidas e escritas, baseadas na experiência das relações humanas, que servem para ligar os factos ou os acontecimentos ao direito.

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