sábado, 23 de novembro de 2019

A Dinastia Omridas



            Os livros de Reis inseridos no cânon do Primeiro Testamento e/ou Antigo Testamento não tem a pretensão de oferecer uma ampla visão de cada reinado, mas é uma seleção daqueles acontecimentos que se relacionam diretamente com a linhagem messiânica. Essa é a razão pela qual alguns reinados são minimizados e outros maximizados.
Após a morte do rei Salomão, a Monarquia Unida se dissolveu e se dividiu nos Reinos Divididos de Israel no norte e Judá no sul. Como a linhagem davídica se manteve no reino do Sul, as sucessões foram menos traumáticas e com períodos mais longos. O contrário ocorre no reino do Norte, pois a ausência de uma linhagem real definida oferecia ocasiões para várias revoltas e reviravoltas de maneira que as sucessões são mais intensas e violentas.
Uma das dinastias que surgiram e desapareceram na história de Israel foi a omrida. Todavia, quando lemos os relatos bíblicos temos a impressão de que o reinado de Omri[1] foi irrelevante para a nação israelita (Reino do Norte). Mas, quando vamos pesquisar a história geral[2] descobrimos que a dinastia omrida (Omri, Acab, Acazias, Jorão e Atalia) foi uma das mais importantes da nação israelita (Norte). É possível percebermos a relevância dessa dinastia, pois muito tempo depois de terem saído de cena, Israel ainda era referido pelos monarcas assírios como a Terra de Omri.
            Nada consta sobre os ancestrais de Omri, nem mesmo o nome de seu pai ou de sua tribo. Omri fundou a 3ª dinastia de Israel (precedida pelas de Jeroboão e de Baasa). Os textos bíblicos que contém os relatos da dinastia omrida estão no final do primeiro livro de Reis e o inicio do segundo livro: Omri (1Rs 16.15 — 28), Acab (1Rs 16.29 - 22.40), Acazias (1Rs 22.52 - 2Rs 1.18), Jorão (2Rs 3.1 - 9.29) e Atalia (2Rs 11.1 - 25). Esta dinastia reinou entre os anos de 884- 836 AEC, sobre Israel Norte e em Judá.
            Omri antes de ser coroado rei do Norte tinha sido um general do rei Elá (1Rs 16.15-28), filho e sucessor do rei Baasa (1Rs 16.8-14). Como Elá reinou por um período pequeno de dois anos (1Rs 14.8) é provável que Omri já ocupasse o posto de general do exercito desde os dias do pai dele. A narrativa coloca Omri liderando o exército nas fronteiras de Gibeton, uma das cidades filisteias, enquanto orei Elá permaneceu em Tirza, uma das capitais do Reino do Norte (Israel)[3].
            Todavia, outro comandante responsável pela metade dos carros, chamado Zimri,[4] não estava no cerco da cidade filisteia, mas havia permanecido na capital (16.9). Aproveitando a ocasião Zimri mata o rei (1Rs 16.9) e assume o trono. Mas a leitura indica que esse ato foi feito à revelia do apoio das forças políticas vigentes, pois quando a notícia chega ao acampamento militar imediatamente Omri e aclamado rei por “todo o povo”, leia-se o exército. Retornam rapidamente para Tirza e ali fazem um cerco à capital.
            Acuado Zimri se refugia no palácio real, mas o local foi incendiado e Zimri morreu carbonizado. Quando tudo parece caminhar para a ascensão de Omri surge um novo postulante ao trono, provavelmente outro comandante, chamado Tibne, filho de Ginate, que possui forte apoio de outras alas do exercito. Por um período de aproximadamente quatro anos houve intensa disputa entre os dois postulantes ao trono, até que as forças lideradas por Omri venceram a disputa e impôs a derrota à Tibni (1Rs 16.22), dando inicio assim uma dinastia que permanecerá reinando no Norte por um período relevante de quase cinquenta anos (884-836 AC).
            Em seus primeiros seis anos Omri reinou a partir de Tirza, mas entendia que estrategicamente não era a melhor localização e de difícil defesa contra os inimigos. Então o rei compra uma colina ao oeste de Tirza, cujo dono era Semer e constrói nela a nova capital do reino de Israel (Norte) e lhe dá o nome de Samaria[5] (1Rs 16.24), provavelmente em homenagem ao antigo dono, que deveria ser uma pessoa de grandes posses e influência política naquela época.
A nova capital foi fortificada de forma a poder suportar longos sítios (1Rs 16.23, 24). Inscrições em cuneiforme também o chamam de fundador dela, e foi também o local de seu sepultamento. (1Rs 16.28). Era localizada perto de Dor e Siquém, uma rota comercial importante entre Leste-Oeste, interligada pela Estrada do Rei, no extremo leste, e a Via Maris que perpassava o litoral. Por aqui passavam o transporte dos produtos (bens de luxo como peles de animais, marfim e incenso) para o porto de Dor e o forte comercio com a Fenícia, incluindo ouro, prata e estanho trocado entre o sul da Arábia e a Mesopotâmia. A localização era estratégica também pelo fato de que a partir de Samaria Omri podia vigiar os movimentos do reino de Judá (Sul).  Aqui temos os três passos que consolidaram a dinastia onrida: ascensão de Onri ao trono de Israel (Norte); a construção de Samaria como a nova capital dos israelitas; o inicio da dinastia dos onridas que perdurara por pelo menos quarenta e cinco anos.
            Omri foi o primeiro rei de Israel (Norte) que teve o nome referendado em documentos extras bíblicos. Em seu período relativamente curto de doze anos e posteriormente com seu filho Acab, a nação do Norte experimenta um período de grandes construções públicas e ampliação de seu território. Consolida sua aliança com Fenícia através do casamento entre seu filho Acab e a princesa fenícia Jezabel e investe na intensificação do comércio tanto marítimas como nas rotas comerciais em Gilead. Desta forma Israel aparece pela primeira vez no cenário internacional. Essas referências a Omri em fontes extra-bíblica parecem indicar que o reino do norte de Israel emergiu como uma grande potência regional na Síria-Palestina sob Omri, perpetuando seu nome na Assíria, e eventualmente a casa de Omri tornou-se sinônimo do reino do norte de Israel na Assíria, mesmo quando os reis de Israel não mais vieram de sua linhagem. Referir-se a uma dinastia por seu fundador é habitual nas inscrições reais assírias. No entanto, as inscrições reais assírias continuaram a designar o reino do norte de Israel como “bīt Humri”, "casa de Omri", até o século VIII AC, muito depois da aniquilação da dinastia de Omri em 841 AC.
            A dinastia onridas manteve uma politica de aliança com o reino de Judá (Sul). Omri iniciou essa aproximação com o rei Asa de Judá (Sul).   A consolidação desta aliança vem através do casamento da filha de Omri – Atalia - com Josafa, filho do rei do sul.
Uma das realizações políticas mais importantes de Omri foi o restabelecimento de boas relações com Zidon, a terra dos fenícios, cuja amizade ajudou a aumentar a riqueza e o poder do rei Davi e do rei Salomão durante seus reinos. Aqui também, Omri afirmou a aliança política por casamento. Seu filho Acabe casou-se com Jezabel, filha do rei de Sidom. No entanto, a estreita associação entre os dois países exerceu uma influência muito ruim sobre a vida religiosa e cultural de Israel. Essa dupla proporcionou um dos mais nefastos períodos do reino de Israel-Judá. Introduziram o culto a Baal, não apenas trazendo os profetas baalitas, mas construindo um templo para o deus cananeu-fenício; assassinaram os sacerdotes que se opunham a seus cultos idolatras; confiscaram propriedades de seus súditos e perseguiram violentamente os profetas Elias e Eliseu, que foram sempre uma espinha de peixe em suas gargantas. A situação declinou rapidamente após a morte de Acabe e Josafá e essa triste dinastia chega a um fim abrupto por volta de 843 AC com a morte de Jezabel e seus descendentes.

Utilização livre desde que citando a fonte
Guedes, Ivan Pereira
Mestre em Ciências da Religião.
me.ivanguedes@gmail.com
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[1] Em hebraico ( עָמְרִי), uma forma reduzida do hebraico עָמְרִיָּה, Omriyya, "YHVH é minha vida"); nome aparece grafado na Septuaginta (LXX) como Ambri e a Vulgata optou por Amri.
[2] Evidências extrabíblicas do rei Messa de Moabe, rei Shalmaneser III da Assíria e outras. A inscrição de Mesha é particularmente interessante – ela foi encomendada pelo rei de Messa de Moabe, aparentemente no final de seu reinado. O texto relata as principais realizações do reinado de Mesha. Em particular, menciona Omri, rei de Israel, porque Mesha acabou com o domínio israelita sobre Moabe e recuperou todo o território moabita ao norte da antiga cidade de Madiba. Existem outras inscrições, como a chamada inscrição monolítica de Shalmaneser III, que data do século IX aC. Chamado Obelisco Negro, onde são inscritos os nomes dos reis de Israel e Judá: Omri, Acabe, Jeú, a Casa de Davi.
[3] A relevância de Tirza, como capital do reino do Norte Israel, abrange um período que vai desde cerca de 931-842 AC, até ser substituída pela nova capital, Samaria.
[4] Na LXX o nome transliterado é Zambri e a Vulgata optou por Zamri, mas a melhor grafia seguindo as regras gramaticais hebraicas é mesmo Omri.
[5] A cidade permaneceu por cerca de cento e cinquenta anos, até 720 AC.

Um comentário:

  1. Gostei muito do texto de fácil compreensão, obrigado por seus esforços em apresentar tão importante conhecimento aos estudantes da Bíblia.

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