Os
livros de Reis inseridos no cânon do Primeiro Testamento e/ou Antigo Testamento
não tem a pretensão de oferecer uma ampla visão de cada reinado, mas é uma
seleção daqueles acontecimentos que se relacionam diretamente com a linhagem
messiânica. Essa é a razão pela qual alguns reinados são minimizados e outros
maximizados.
Após a morte do rei Salomão,
a Monarquia Unida se dissolveu e se dividiu nos Reinos Divididos de Israel no
norte e Judá no sul. Como a linhagem davídica se manteve no reino do Sul, as
sucessões foram menos traumáticas e com períodos mais longos. O contrário
ocorre no reino do Norte, pois a ausência de uma linhagem real definida
oferecia ocasiões para várias revoltas e reviravoltas de maneira que as sucessões
são mais intensas e violentas.
Uma das dinastias que
surgiram e desapareceram na história de Israel foi a omrida. Todavia, quando
lemos os relatos bíblicos temos a impressão de que o reinado de Omri[1] foi irrelevante para a
nação israelita (Reino do Norte). Mas, quando vamos pesquisar a história geral[2] descobrimos que a dinastia
omrida (Omri, Acab, Acazias, Jorão e Atalia) foi uma das mais importantes da
nação israelita (Norte). É possível percebermos a relevância dessa dinastia,
pois muito tempo depois de terem saído de cena, Israel ainda era referido pelos
monarcas assírios como a Terra de Omri.
Nada
consta sobre os ancestrais de Omri, nem mesmo o nome de seu pai ou de sua
tribo. Omri fundou a 3ª dinastia de Israel (precedida pelas de Jeroboão e de Baasa).
Os textos bíblicos que contém os relatos da dinastia omrida estão no final do
primeiro livro de Reis e o inicio do segundo livro: Omri (1Rs 16.15 — 28), Acab (1Rs 16.29 - 22.40), Acazias (1Rs 22.52 -
2Rs 1.18), Jorão (2Rs 3.1 - 9.29) e Atalia (2Rs 11.1 - 25). Esta dinastia
reinou entre os anos de 884- 836 AEC, sobre Israel Norte e em Judá.
Omri
antes de ser coroado rei do Norte tinha sido um general do rei Elá (1Rs
16.15-28), filho e sucessor do rei Baasa (1Rs 16.8-14). Como Elá reinou por um
período pequeno de dois anos (1Rs 14.8) é provável que Omri já ocupasse o posto
de general do exercito desde os dias do pai dele. A narrativa coloca Omri
liderando o exército nas fronteiras de Gibeton, uma das cidades filisteias,
enquanto orei Elá permaneceu em Tirza, uma das capitais do Reino do Norte
(Israel)[3].
Todavia,
outro comandante responsável pela metade dos carros, chamado Zimri,[4] não estava no cerco da
cidade filisteia, mas havia permanecido na capital (16.9). Aproveitando a
ocasião Zimri mata o rei (1Rs 16.9) e assume o trono. Mas a leitura indica que
esse ato foi feito à revelia do apoio das forças políticas vigentes, pois
quando a notícia chega ao acampamento militar imediatamente Omri e aclamado rei
por “todo o povo”, leia-se o exército. Retornam rapidamente para Tirza e ali
fazem um cerco à capital.
Acuado
Zimri se refugia no palácio real, mas o local foi incendiado e Zimri morreu
carbonizado. Quando tudo parece caminhar para a ascensão de Omri surge um novo
postulante ao trono, provavelmente outro comandante, chamado Tibne, filho de
Ginate, que possui forte apoio de outras alas do exercito. Por um período de
aproximadamente quatro anos houve intensa disputa entre os dois postulantes ao
trono, até que as forças lideradas por Omri venceram a disputa e impôs a
derrota à Tibni (1Rs 16.22), dando inicio assim uma dinastia que permanecerá
reinando no Norte por um período relevante de quase cinquenta anos (884-836
AC).
Em seus
primeiros seis anos Omri reinou a partir de Tirza, mas entendia que
estrategicamente não era a melhor localização e de difícil defesa contra os
inimigos. Então o rei compra uma colina ao oeste de Tirza, cujo dono era Semer
e constrói nela a nova capital do reino de Israel (Norte) e lhe dá o nome de
Samaria[5] (1Rs 16.24), provavelmente
em homenagem ao antigo dono, que deveria ser uma pessoa de grandes posses e
influência política naquela época.
A nova capital foi
fortificada de forma a poder suportar longos sítios (1Rs 16.23, 24). Inscrições
em cuneiforme também o chamam de fundador dela, e foi também o local de seu
sepultamento. (1Rs 16.28). Era localizada perto de Dor e Siquém, uma rota
comercial importante entre Leste-Oeste, interligada pela Estrada do Rei, no
extremo leste, e a Via Maris que perpassava o litoral. Por aqui passavam o
transporte dos produtos (bens de luxo como peles de animais, marfim e incenso)
para o porto de Dor e o forte comercio com a Fenícia, incluindo ouro, prata e
estanho trocado entre o sul da Arábia e a Mesopotâmia. A localização era
estratégica também pelo fato de que a partir de Samaria Omri podia vigiar os
movimentos do reino de Judá (Sul). Aqui
temos os três passos que consolidaram a dinastia onrida: ascensão de Onri ao
trono de Israel (Norte); a construção de Samaria como a nova capital dos
israelitas; o inicio da dinastia dos onridas que perdurara por pelo menos
quarenta e cinco anos.
Omri foi
o primeiro rei de Israel (Norte) que teve o nome referendado em documentos
extras bíblicos. Em seu período relativamente curto de doze anos e
posteriormente com seu filho Acab, a nação do Norte experimenta um período de
grandes construções públicas e ampliação de seu território. Consolida sua
aliança com Fenícia através do casamento entre seu filho Acab e a princesa
fenícia Jezabel e investe na intensificação do comércio tanto marítimas como
nas rotas comerciais em Gilead. Desta forma Israel aparece pela primeira vez no
cenário internacional. Essas referências a Omri em fontes extra-bíblica parecem
indicar que o reino do norte de Israel emergiu como uma grande potência
regional na Síria-Palestina sob Omri, perpetuando seu nome na Assíria, e
eventualmente a casa de Omri tornou-se sinônimo do reino do norte de Israel na
Assíria, mesmo quando os reis de Israel não mais vieram de sua linhagem. Referir-se
a uma dinastia por seu fundador é habitual nas inscrições reais assírias. No
entanto, as inscrições reais assírias continuaram a designar o reino do norte
de Israel como “bīt Humri”, "casa
de Omri", até o século VIII AC, muito depois da aniquilação da
dinastia de Omri em 841 AC.
A
dinastia onridas manteve uma politica de aliança com o reino de Judá (Sul).
Omri iniciou essa aproximação com o rei Asa de Judá (Sul). A consolidação desta aliança vem através do
casamento da filha de Omri – Atalia - com Josafa, filho do rei do sul.
Uma das realizações
políticas mais importantes de Omri foi o restabelecimento de boas relações com
Zidon, a terra dos fenícios, cuja amizade ajudou a aumentar a riqueza e o poder
do rei Davi e do rei Salomão durante seus reinos. Aqui também, Omri afirmou a
aliança política por casamento. Seu filho Acabe casou-se com Jezabel, filha do
rei de Sidom. No entanto, a estreita associação entre os dois países exerceu
uma influência muito ruim sobre a vida religiosa e cultural de Israel. Essa
dupla proporcionou um dos mais nefastos períodos do reino de Israel-Judá.
Introduziram o culto a Baal, não apenas trazendo os profetas baalitas, mas
construindo um templo para o deus cananeu-fenício; assassinaram os sacerdotes
que se opunham a seus cultos idolatras; confiscaram propriedades de seus
súditos e perseguiram violentamente os profetas Elias e Eliseu, que foram
sempre uma espinha de peixe em suas gargantas. A situação declinou rapidamente
após a morte de Acabe e Josafá e essa triste dinastia chega a um fim abrupto
por volta de 843 AC com a morte de Jezabel e seus descendentes.
Utilização livre desde que citando a fonte
Guedes, Ivan Pereira
Mestre em Ciências da Religião.
me.ivanguedes@gmail.com
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[1] Em hebraico ( עָמְרִי),
uma forma reduzida do hebraico עָמְרִיָּה, Omriyya,
"YHVH é minha vida"); nome aparece grafado na Septuaginta (LXX) como
Ambri e a Vulgata optou por Amri.
[2] Evidências extrabíblicas do rei Messa
de Moabe, rei Shalmaneser III da Assíria e outras. A inscrição de Mesha é
particularmente interessante – ela foi encomendada pelo rei de Messa de Moabe,
aparentemente no final de seu reinado. O texto relata as principais realizações
do reinado de Mesha. Em particular, menciona Omri, rei de Israel, porque Mesha
acabou com o domínio israelita sobre Moabe e recuperou todo o território
moabita ao norte da antiga cidade de Madiba. Existem outras inscrições, como a
chamada inscrição monolítica de Shalmaneser III, que data do século IX aC.
Chamado Obelisco Negro, onde são inscritos os nomes dos reis de Israel e Judá:
Omri, Acabe, Jeú, a Casa de Davi.
[3] A relevância de Tirza, como capital
do reino do Norte Israel, abrange um período que vai desde cerca de 931-842 AC,
até ser substituída pela nova capital, Samaria.
[4] Na LXX o nome transliterado é Zambri
e a Vulgata optou por Zamri, mas a melhor grafia seguindo as regras gramaticais
hebraicas é mesmo Omri.
[5] A cidade permaneceu por cerca de
cento e cinquenta anos, até 720 AC.
Gostei muito do texto de fácil compreensão, obrigado por seus esforços em apresentar tão importante conhecimento aos estudantes da Bíblia.
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