quinta-feira, 8 de agosto de 2019

Profeta Elias: Aspectos Pessoais



Então Elias, profeta da cidade de Tesbi, em Gileade” (1 Rs 17.1)
 Tu dás aos teus anjos a rapidez dos ventos e o terrível poder do fogo. (Sl 104.4)
            Em um determinado momento de seu ministério terreno Jesus, acompanhado de três dos seus discípulos, subiu a um monte para orar. Enquanto orava duas figuras do Primeiro Testamento apareceram: Moises e Elias - o primeiro representando a Lei e o segundo representando os Profetas.
            A figura de Elias é um memorial extraordinário do oficio profético exercido ao longo de vários séculos, a partir do momento em que os israelitas adentraram à terra de Canaã. Levantados por Deus eram vozes inconfundíveis cujo único objetivo era trazer o povo e suas lideranças civil e religiosa de volta aos princípios da Torá (Lei e/ou Instruções) que havia sido estabelecida por meio de Moisés e que continham os termos da Aliança que Deus mesmo firmara com seu Povo.
            Certamente que houve muitos profetas antes de Elias, mas pouco ou quase nenhuma informação sobre eles e seus respectivos ministérios foram registrados. Sabemos por exemplo do profeta Natã que exerceu seu papel profético nos dias do rei Davi e que inclusive teve autoridade para confrontar o rei com seu pecado (adultério com Batseba ou Bate-Saba).
            Mas será a partir do ministério de Elias que teremos um modelo estabelecido. Portanto, quando começamos a estudar a vida e ministério de Elias haveremos de adquirir uma visão mais ampla do papel que os profetas desempenhavam na Sociedade israelita/judaica.
Um aspecto interessante da mensagem dos profetas bíblicos é que setenta a oitenta por cento de suas mensagem tem como objetivo trazer à memoria de seus ouvintes os termos da Aliança e exortá-los a se arrependerem e retornarem à comunhão com Deus; apenas vinte ou um pouco mais da mensagem proclamadas por eles se relacionam a eventos futuros.
Elias vai se constituir no parâmetro do oficio profético, não em decorrência de suas revelações futurísticas, Isaías, Daniel e outros profetas posteriores anunciam muito mais; ou mesmo de suas ações sobrenaturais, seu sucessor imediato Eliseu faz tanto ou mais milagres. Elias se constitui um modelo de profeta por sua mensagem contundente de arrependimento e conversão aos termos da Aliança, dirigida tanto aos líderes civis e religiosos, quanto ao povo de forma geral, pois todos e cada um são responsáveis diante de Deus no cumprimento dos princípios estabelecidos na Aliança.
Após os profetas Malaquias, Ageu e Zacarias, todos pós Cativeiro Babilônico, houve o que é denominado 400 anos de silêncio, onde Deus não levanta uma única voz profética na nação judaica. Então, quando lemos a narrativa evangélica produzida por Marcos, provavelmente a primeira a circular entre as comunidades cristãs, nas suas primeiras linhas, o silêncio é quabrado, pela voz profética contundente de João Batista. Muitos inclusive confundiam João Batista com o próprio profeta Elias, pois igualmente João Batista prega o arrependimento e conversão à Aliança (Reino de Deus) e confronta as autoridades constituídas e o povo com a mesma ênfase.
Informações Pessoais
            Seu nome em hebraico significa “Javé é meu Deus”. Apesar de toda sua “fama” não encontramos muitas informações pessoais dele. Nenhuma referência à ancestralidade, lar, educação, pai, mãe, companheiro ou amigo; e isso, também, durante todo o resto de sua carreira, até quase a sua morte.
            Ele surge nas narrativas do primeiro livro de Reis como um Melquisedeque de seus dias. Até onde podemos inferir era um peregrino sem moradia fixa e cuja roupa e alimentação eram as mais rusticas e simples da vida diária. Desta forma antecede o ministério do próprio Jesus que em suas próprias palavras declara: “não ter onde reclinar a cabeça”.
            Igualmente não encontramos qualquer referência de onde poderia ter sido adequadamente preparado para o exercício de seu ministério profético, nem mesmo a cena em que outros profetas são chamados e vocacionados pelo próprio Deus. Rapidamente é informado que ele vem da cidade de Tesbi localizada na parte remota da região de Gileade, a leste do rio Jordão. Mas não é possível afirmar categoricamente que ele nasceu e viveu ali até iniciar o seu ministério profético ou se ele simples estava vindo daquele local para anunciar sua mensagem às demais localidades de Israel. Normalmente ele vem do deserto e surgem abruptamente em locais mais povoados para pronunciar suas pregações – por isso era conhecido como a “voz que clama no deserto ou talvez fosse melhor – a voz que clama a partir do deserto” – sem alforje ou bolsa.
            Um excelente professor, para modelar e preparar vocações, é o lugar onde se nasce e cresce. Partindo da informação de que Elias vem da cidade eou vila de Tisbe, na região de Gileade podemos inferir como foi sua preparação pré-profética. Gileade era uma região dominada pelas características do deserto e semiárido; situada a lesto do rio Jordão, mas como o próprio nome indica “rochosa”, com suas ravinas e cursos de água, seus currais e rebanhos de gado selvagem.[1] Por causa de suas características geográficas montanhosas é chamada de "o monte de Gileade" (Gn 31.25); ou ainda "a terra de Gileade" (Nm 32.1) e às vezes simplesmente "Gileade" (Sl 60.7; 37.25). Ela compreendia as posses das tribos de Gade e Rubem e a parte sul de Manassés (Dt 3.13; Nm 32.40). Foi delimitada ao norte por Basã, e ao sul por Moabe e Amon (Gn 31.21; Dt 3.12-17), regiões fronteiriças e, portanto, sempre sujeita a invasões e batalhas.
            Apesar da sua rudeza a região de Gileade tem relevância na história bíblica: os juízes Jair e Jefté; o rei Jeú de Israel; e o profeta Elias eram todos desta região. Muitos eventos bem conhecidos da Bíblia ocorreram nas terras de Gileade (Gn 31.20-23; Dt 3.13-16; 34.1-4; Jz 20.1; 2Sm 17.24-26). Gileade era conhecida por produção e exportação de bálsamo desde os primeiros tempos. O patriarca israelita José foi vendido por seus irmãos a uma caravana de comerciantes ismaelitas que transportavam uma carga que incluía bálsamo e iriam comercializa-lo no Egito (Gn 37.23-28). Às margens do rio Jaboque Jacó vai lutar com o anjo enquanto aguarda apreensivo o reencontro com seu irmão (Gn 32.30).
Com exceção de algumas fortalezas nas montanhas, os habitantes da região por seu estilo de vida nômade estavam satisfeitos em morar nas tendas de pano ou pelos de cabra. É nesta terra árida que Elias vai ser moldado para a árdua tarefa de pronunciar sua mensagem de arrependimento e juízo contra um governante fraco, um sacerdócio dominado e um povo morno.
Uma vez mais podemos perceber a soberania graciosa de Deus em e através da vida de Elias; ele é o portador do bálsamo de Gileade para curar as feridas de seu povo. Deus não escolheu um sacerdote (Ezequiel) ou mesmo alguém ilustrado da corte (Isaías), não teve nem mesmo uma consagração pública (nada sabemos de seu chamado e comissionamento); é um pregador itinerante das terras altas da Palestina, formado na Escola da Natureza.
A voz trovejante de Elias ressoa implacavelmente nos ouvidos do seu público, como o fogo cuja luz resplandece em um dos momentos mais escuros da história israelita.
            Temos algumas descrições físicas de Elias que nos permite esboçar um desenho falado dele: os mensageiros de Acazias (2Rs 1.8) o descreve como “um homem peludo”; sobre seus ombros havia uma capa solta, feito de pele de ovelha ou mais provavelmente de camelo (mais resistente), presa ao peito com uma cinta de couro. Seus cabelos longos nos leva a pensar, como no caso de Sansão, um significado de consagração ou um distintivo de seu ofício profético. Era um homem de força física acostumado às labutas das montanhas e do deserto, para enfrentar tanto o calor escaldante quanto o frio extremo. Mesmo após um dia de luta, enfrenta uma caminhada de dezesseis milhas, ultrapassando o grupo de mercenários do rei Acabe e se posicionando na frente do portão de Jezreel por onde o rei haveria de passar. Estava preparado para passar por privações e o longo jejum de quarenta dias no monte Horebe. Portanto, não apenas sua mensagem, mas igualmente sua presença física impunha respeito e atenção por parte de seus ouvintes (assim como João Batista atraia atenção de pessoas de todos os lugares da Palestina judaica).
            Revestido pela autoridade Divina Elias encerrar as comportas dos céus e as chuvas deixam de descer sobre a terra; com uma oração simples faz descer fogo do céu que consome um holocausto regado a muita água; suas aparições e desaparecimentos repentinos é uma marca distintiva deste profeta sem endereço permanente.
            Seu compromisso com a mensagem que transmitia lhe revestia de uma autoridade inquestionável, fosse diante de reis, sacerdotes ou do povo. Mas ao mesmo tempo, Elias era uma pessoa semelhante a nós (Tg 5.17), gente como a gente, sujeito a todas as pressões da vida. E essa fragilidade humana é plenamente revelada quando o narrador descreve sua ida para o deserto e o seu desejo de encerrar a carreira profética e morrer. Mas como sempre acontece, inclusive conosco, quem da a última palavra é Deus e não o profeta. Isso nos anima e sustenta, pois mesmo quando fraquejamos o nosso Deus sempre há de nos sustentar e o nosso ministério termina apenas e tão somente quando Deus entender que já cumprimos todo o propósito para o qual nos designou. Jamais nos esqueçamos de que foi ante de qualquer outra cousa ou mesmo apesar de qualquer outra cousa, que foi o treinamento e a graça de DEUS, o poder do Seu Espírito operando dentro dele, que fez de Elias o homem que ele foi. A mensagem e os sinais poderosos que Elias realizou foram decorrentes do poder de Deus manifesta na e através de sua vida.
Elias era uma pessoa semelhante a nós!
            Da mesma forma como Deus o capacitou e usou para realização de Sua vontade e propósito, Deus também haverá de usar nossas vidas com todas as nossas virtudes e fragilidades.

Utilização livre desde que citando a fonte
Guedes, Ivan Pereira
Mestre em Ciências da Religião.
me.ivanguedes@gmail.com
Outro Blog
Historiologia Protestante

Artigos Relacionados
Juízo Sobre Uma Sociedade Sem Justiça (Onde Está a Voz Profética?)
Profetas: Amós e a Justiça (Onde está a Voz Profética?)
Amós: Uma Voz Profética Contra a Opressão e Escravagismo (1ª Parte)
O Período Clássico do Profetismo no Primeiro Testamento - Século VIII
O Desenvolvimento do Profetismo em Israel/Judá
Profetas: As Diversidades Contextuais
Os Profetas e as Questões Sociais
Profeta Oséias: Contexto Histórico
Referências Bibliográficas.
ARCHER, Gleason L. Merece Confiança o Antigo Testamento? Ed. Vida Nova, São Paulo, 1979.
BACKER, Walter L. Obadiah in WALYOORD, John F. e ZUCK, Roy B., 1983.
Biblia Hebraica Stuttgartensia, eds. A. Alt, O. Eißfelt, P. Kahle, and R. Kittle (Stuttgart: DeutscheBibelstiftung, c1967-77).
 Biblia Sacra Juxta Vulgatam Clementinam, ed. electronica (Bellingham, WA: Logos Research Systems, Inc.,2005), Logos.
COPELAND, Mark A. Studies in the Minor Prophets. ExecutableOutlines.com
CRABTREE, A. R. Profetas Menoresv.1, Casa Publicadora Batista, Rio de Janeiro, 1971.
DAVIDSON, F. O Novo Comentário da Bíblia, v.2. São Paulo: Edições Vida Nova, 1963.
ELLISEN, Stanley A. Conheça Melhor o Antigo Testamento, ed. Vida, Florida, 1991.
FALCÃO, Silas Alvez. Panorama do Velho Testamentov. 2, Casa Publicadora Batista, Rio de Janeiro, 1965.
FRANCISCO, Clyde T. Introdução ao Velho Testamento. Tradução Antônio Neves de Mesquita. Rio de Janeiro: Junta de Educação Religiosa e Publicações, 1969, [1ª ed].
MACDUFF, J. R. Elijah, the prophet off ire. Michigan: Baker Book House, 1864


[1] Gileade era densamente arborizada e esta era uma área ideal para animais de pasto, as cabras desta região eram famosas (Cantares 6.5).


Nenhum comentário:

Postar um comentário