Um dos momentos mais significativos do Ministério terreno de Jesus é quando Ele
resolve chamar para junto dele um seleto grupo de discípulos, que ficaram
conhecidos como Apóstolos, e que a partir daquele momento o acompanharam mais
de perto e foram ouvintes de Seus ensinos e participantes de seus milagres.
Lendo os registros evangélicos deste momento não encontramos nenhuma razão
pessoal nos que foram selecionados, que pudessem distingui-los de tantos outros
que naquele momento também seguiam a Jesus. Ao contrário, de alguns deles,
encontraremos ao longo das narrativas e de Pedro mais acentuada no final,
relatos pouco apreciáveis sobre a conduta e/ou deles e para piorar no momento
derradeiro, quando Jesus está sendo pregado, junto ao Calvário vamos encontrar
apenas o jovem João e algumas das mulheres que acompanharam Jesus durante Seu
Ministério. Tudo isso poderia contribuir para desqualificar estes selecionados,
mas quando Jesus chamou cada um deles, sabia quem eram, sabia o que fariam, mas
assim mesmo os chamou, pois Jesus queria estes homens e não outros.
Nenhum deles decepcionou Jesus,
nem mesmo Judas Iscariotes, pois Jesus sendo Deus conhecia a cada um e suas múltiplas
limitações, ao contrário, amou cada um deles e os amou até o fim, amou cada um
apesar de suas limitações e debilidades; se Jesus fosse chamar pessoas
perfeitas, teria que chamar apenas os anjos, pois nesta terra apenas um Homem
não falhou – Jesus!
O chamado deste grupo peculiar
de discípulos, antes de nos desanimar, deveria nos animar, pois eles formam um
representativo de todos aqueles que continuaram sendo chamados por Jesus,
através do Espírito Santo, para aprender com Ele e serem como aqueles, enviados
a proclamarem Sua mensagem ao mundo.
Jesus continua a chamar
homens e mulheres, apesar do que somos, porque simplesmente nos ama e quer por
nosso intermédio comunicar este amor salvador a outras pessoas, que como nós
também são pecadoras que erraram e continuam a errar; o Evangelho é a mensagem
apropriada para pessoas que sozinhas não conseguem servir a Deus, pois suas
naturezas pecaminosas deturpam suas melhores boas intenções.
Enquanto vamos lendo as
narrativas evangélicas e tomando contato com este grupo selecionado por Jesus,
conhecendo cada um deles, nos sentimos mais normais, pois percebemos que eles
são tão humanos e tão gente, como cada um de nós. Anima o nosso coração o fato
de que Jesus não chama pessoas perfeitas, pois certamente estaríamos fora, mas
chamou e continua a chamar gente como a gente, e que Ele mesmo vai
pacientemente preparando para servi-Lo e realizar a Sua vontade e o Seu
propósito eterno.
Na medida em que formos
conhecendo um pouco sobre cada um deste seleto grupo dos Doze, teremos a
oportunidade de vê-los como espelhos que refletem cada um de nós, crentes sim,
desejos de fazer a vontade de Jesus sim, mas que como pessoas tropeçaram na
pedra da contradição humana que Paulo tantas vezes também tropeçou, de maneira
que as coisas boas e certas que sabemos devem ser feitas, não fazemos, mas as
coisas ruins e erradas que sabemos não devemos fazer, fazemos. Quando estamos
conscientes da nossa indignidade para merecer a misericórdia e o amor de Deus,
estamos em melhor posição para experimentar o que ele pode fazer por nós.
Vamos examinar,
como introdução, apenas algumas observações sobre os textos evangélicos onde o
momento da escolha deste grupo acontece. Nos próximos artigos iremos destacar
um a um deles, para que venhamos a aprender e apreender com eles.
Os
Doze Apóstolos
Para qualquer leitor do Primeiro Testamento fica fácil identificar a relação
direta que Jesus pretende fazer entre Seu Ministério e a História de Israel.
Deus forma a nação israelita a partir dos doze filhos de Jacó (Israel) e agora
Ele vai inicia a formação do Novo Israel a partir deste grupo de Doze
Apóstolos. Assim como Israel deveria ser uma bênção a todas as famílias da
terra (Gn 22.17-18 e 26.4), a partir deste novo Israel (Igreja) a
mensagem salvadora deve ser proclamada a todas as nações e até os confins da
terra.
Comparando
as Três Listas
Lucas destaca que Jesus utiliza um termo técnico diferente para este grupo – “apóstolos”
em lugar de “discípulos”. O objetivo está na nova função que eles iram
desempenhar e não necessariamente em uma promoção; “discípulo” é alguém que
aprende fazendo, o nosso “aprendiz”, enquanto que “apóstolo” é alguém comissionado
a realizar uma tarefa oficial, o que eles farão em breve. Primeiro vem o
Discipulado e somente então o Apostolado "Jesus nomeou os Doze
para estarem com ele e, em seguida, mandou-os com sua autoridade para anunciar
a Boa Nova. Muitas pessoas querem a autoridade de um Pedro ou João sem primeiro
passar pela escola de discipulado. Aqueles doze receberam necessária instrução,
treinamento, prática e acima de tudo, o tempo para amadurecer. Devemos estar
dispostos a gastar tempo aprendendo com o Mestre, antes de ir para frente a
fazer o seu trabalho público" (Barton, p. 81).
Conforme indicado acima, três dos quatro evangelistas fornecem uma lista com os
nomes dos doze selecionados. Marcos os dispõe de dois em dois, uma vez que posteriormente
Jesus haverá de envia-los de dois em dois (Mc 6.7) e provavelmente fosse está a
formação das duplas.
De alguns deles nada ficamos sabendo como Bartolomeu, Tiago, filho de Alfeu,
Tadeu, Simão, o Zelote, e dos demais temos parcas informações nas narrativas
evangélicas, de maneira que muitas informações sobre eles somente será
encontrada fora das narrativas bíblicas, como verificaremos. O que não é de
surpreender, pois os evangelistas querem falar sobre Jesus Cristo e não sobre seus
discípulos, mesmo deste grupo seleto apostólico. Esta é a diferença entre o
Evangelho bíblico e o Evangelho atual: no primeiro é Jesus o centro da
narrativa e das atenções; no Evangelho atual são os pregadores o centro das
atenções.
Destacam-se algumas observações e mudanças feitas aos nomes de alguns deles:
Simão é alterado para Pedro (a rocha) e Levi altera-se para Mateus (o presente
de Deus). Tiago, um dos mais velhos e João, o mais jovem do grupo, recebem a
alcunha de “Boanerges” (filhos do trovão), por causa de suas atitudes
impulsivas (Mc 9.38-41; 10.35-39; Lc 9.54-55). As mudanças de nomes são comuns
nas narrativas bíblicas e implica sempre em mudança de caráter (de vida) e no
caso dos “Boanerges” posteriormente um deles, João, será identificado como o
Apóstolo amoroso, que transformação e o Pedro amedrontado, à beira da fogueira,
será transformado em Pedro o destemido, diante do Sinédrio. O Evangelho
de Jesus transforma vidas!
Encontramos também algumas combinações estranhas nesta seleção de Jesus. Um
exemplo é Simão, o Zelote, e Mateus, o cobrador de impostos compartilhando
refeições juntos e convivendo pacificamente no mesmo grupo. Afinal de contas, os
zelotes acreditavam que eles eram chamados por Deus para se envolverem em uma
guerra santa contra "os poderes das trevas" e/ou “os inimigos de
Israel” e na visão deles todos os cobradores de impostos, como Mateus, eram
traidores da pátria e da própria religião judaica e deveriam ser mortos. Mas
tal é o poder transformador de Cristo, que Ele poderia até mesmo incluir uma
tão improvável combinação em seu pequeno grupo de apóstolos. E não poderíamos
deixar de destacar Judas Iscariotes “que O traiu" (Mc 3.19) também deve
lembrar-nos que a Igreja de Jesus nunca foi perfeita. Ele sempre teve seus
Judas, mesmo em ministério. Mas Deus não o abandona e nem despreza, ao
contrário, Jesus o ama e utiliza ele, apesar do que ele era.
Outra característica do trio evangélico é que os quatro primeiros a serem
chamados por Jesus são mencionados primeiramente, ainda que em sequência
diferente: Mateus e Lucas os mencionam em pares de irmãos; Marcos (como Atos)
coloca André por último (Pedro, Tiago, João), seguindo o critério de intimidade
no grupo apostólico e Mateus é nome aramaico; Tadeu aparece em alguns
manuscritos como Lebeu (não nos dois mais antigos) e Lucas o chama de “Judas,
filho [ou irmão] de Tiago” (Lc 6.16; At 1.13).[1]
Por último quero ressaltar o fato de que as três listas iniciam sempre com
Pedro e conclui sempre com o nome de Judas Iscariotes. O adjetivo Zelote pode
se referir a uma pessoa que era zeloso da Lei (como Saulo) ou alguém que foi
membro do grupo revolucionário da época; Iscariotes se refere a uma pessoa
que tinha origem do vilarejo Queriote nas regiões da Galileia.
Utilização livre desde que citando a
fonte
Guedes, Ivan Pereira
Mestre em Ciências da Religião.
Universidade Presbiteriana Mackenzie
me.ivanguedes@gmail.com
Outro Blog
Historiologia Protestante
http://historiologiaprotestante.blogspot.com.br/
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Referências Bibliográficas
BARTON, Bruce. Mark - Life Application Commentary, Wheaton, 2000.
TASKER, R. V. G. The gospel according to St. Matthew.
Tyndale New Testament Commentaries. Grand Rapids: Wm. B. Eerdmans Publishing
Co., 1961.
[1] “Pode
ser que Judas fosse o seu nome verdadeiro; porém, mais tarde, devido ao estigma
ligado ao nome Judas Iscariotes, Tadeu (que talvez signifique “de coração
bondoso”) tenha sido um nome que substituiu o nome Judas”. (TASKER, 1961, p.
107).
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