Lamentavelmente 80% dos evangélicos desistiram de ler e estudar a primeira parte da Bíblia. O título dado a esta primeira parte das Escrituras Cristã – Antigo Testamento – não ajuda, pois o termo “antigo” trás em si a ideia de algo velho e, portanto, irrelevante para os dias atuais. Eu particularmente prefiro o termo acadêmico – Primeiro Testamento – para nomear esta maior parte da Bíblia.
Os dois livros dos Reis estão
inseridos no arcabouço maior da literatura histórica, o que também não atrai
muito a atenção dos leitores bíblicos atuais, pois História é uma palavra
assustadora para grande parte das pessoas, porquanto tem cheiro de naftalina. O
que pode ter de atual e útil uma série de informações sobre reis que viveram a
quase três mil anos atrás? O que tem haver com a minha vida as narrativas de
batalhas há muito esquecidas?
Mesmo para aqueles que leem estes
registros dos Reis pela ótica do historiador com o intuito de compreender
melhor o contexto das nações de Israel e Judá, ainda falta aquele link com a
realidade evangélica do século XXI.
No auge da chamada Escola da
“História da Salvação”, como um ramo dos estudos da Teologia do Antigo
Testamento, havia um consenso de que nestas literaturas históricas havia um
testemunho contundente do poder e da soberania de Deus na História humana, como
preparação para o advento da inserção de Jesus Cristo na nossa humanidade. Mas
um forte e corrosivo aumento do ceticismo histórico, dissecando cada ponto e
vírgula destas literaturas históricas bíblicas, as transformaram em literaturas
teológicas e sua característica eminentemente histórica foram minimizadas a
quase zero, de maneira que os fatos históricos registras em Reis não exerce
mais impacto direto em nós.
Um outro fator agravante é que as literaturas
de Reis não se enquadram dentro da moldura moderna do que é considerado
História. Os “especialistas” não consideram os seus registros como “história
real”, pois amalgamado com os fatos históricos “genuínos” há lendas, histórias
de milagres (que horror), contos populares e construções literárias fictícias.
Se não bastasse, os historiadores de Reis ousam tirar lições morais a partir
dos eventos históricos, algo inconcebível para a historiografia atual.
Mas o mais agravante, para o
historiador pós moderno, é que toda a historiografia de Reis tem um único
agente causador – Deus. A partir do chamado movimento Renascentistas iniciou-se
o processo paulatino e continuo de banir Deus da História humana (esse
movimento pode ser visto diariamente nesses primeiros anos do século XXI). Não
é possível, segundo essas pessoas, se escrever uma história séria a partir da
concepção de um Deus que intervém na História humana. Como ler então os livros
dos Reis? Deve-se ler como uma narrativa teológica que por acaso foi escrita na
forma de história. Mas para grande decepção destes céticos historiográficos as
literaturas de Reis têm se mantido dentro dos padrões básicos e elementares de
quaisquer outras literaturas históricas de ontem e de hoje. Os fatos
registrados foram e continuam sendo comprovados pelos estudos arqueológicos e
pelas mais diversas ciências que fornecem subsídios para uma História honesta e
saudável.
Mas é evidente e inegável que para
nós que temos a Bíblia como sendo de fato a Palavra de Deus, os livros de Reis
não contêm apenas e tão somente registros de fatos históricos (ainda que
honestamente o sejam), mas contém e são instruções para a nossa vida e
fundamento para a nossa fé, pois as narrativas contêm uma clara intenção
querigmática. Como tão bem sintetizou o apóstolo Paulo, no primeiro século da
era cristã, de que esses livros são úteis para o nosso ensino e correção afim
de que possamos conhecer e vivenciarmos a vontade de Deus para as nossas vidas.
E a forma com que o livro dos Reis
foi composto é maravilhosamente apropriado para cumprir essa função. Os eventos
do passado são mesclados com os fatos históricos em todas as épocas e lugares.
A forma pessoal com que Deus trata as nações de Israel e Judá refletem a forma
com que Ele tem tratado todas as Nações a partir da manifestação de Cristo e da
forma final com que há de tratar todas as Nações na conclusão definitiva da
História humana.
Na medida em que folheamos cada
página deste livro dos Reis tomamos conhecimento das ações de Deus e das consequências
disso na vida das pessoas. Somos tocados pela arte com que estas histórias são
compartilhadas e somos envolvidos em seu turbilhão de emoções de alegria e
tristeza, fé e incredulidade, busca e abandono, vida e morte.
A perda por abandonarmos essas
literaturas dos Reis é incalculável. Precisamos urgentemente as lermos com a
mente e o coração, ir a elas como fontes de águas frescas, para sermos
vivificados, assim como uma terra ressecada carece das águas para tornar a
gerar vida. Voltemos às velhas páginas da História bíblica e contemplemos uma
vez mais a forma maravilhosa com que Deus se relacionou com seu povo, pois Ele
ainda continua se relacionando com seu povo através da Igreja. O amor e a
misericórdia de Deus ainda se fazem presentes no cotidiano dos cristãos em toda
a terra, assim como também a sua ira e juízo sobre todos aqueles que permanecem
em confronto direto com sua vontade e soberania. A História dos dias dos Reis
continua sendo a História dos dias atuais – pois Deus permanece o mesmo.
Mas um alerta se faz necessário.
Essa literatura histórica, assim como todas as literaturas bíblicas não devem
serem lidas como que para encontrar respostas prontas a toda problemática da
nossa vida ou da sociedade em que estamos inseridos. Mas que na medida em que
dela nos aproximamos e sorvemos seu conteúdo somos conduzidos a um crescente
entendimento da nossa própria realidade, à luz dos acontecimentos passados.
Elas são como mapas que nos indicam os caminhos por onde devemos andar, para
não nos perdermos em meio a este Mundo tenebroso. A leitura e estudo destes
livros inicia um processo de assimilação e discernimento e todo aquele que
perseverar haverá de experimentar uma vivificação espiritual sem medida.
Literatura Histórica do Antigo Testamento: Introdução
http://reflexaoipg.blogspot.com.br/2016/08/literatura-historica-do-antigo.html
Os Livros de Reis: Introdução Geral
https://reflexaoipg.blogspot.com/2019/04/primeiro-livro-de-reis-morte-de-davi.html?spref=tw
Uma Revisão desde a Divisão do Reino – Judá
http.//reflexaoipg.blogspot.com.br/2016/12/historia-do-antigo-israel-uma-revisao.html
Uma Revisão desde a Divisão do Reino – Israel
http.//reflexaoipg.blogspot.com.br/2016/09/historia-do-antigo-israel-uma-revisao_30.html
Quadro Cronológico dos Reis e Profetas do Primeiro Testamento
https.//reflexaoipg.blogspot.com/2016/08/o-periodo-classico-do-profetismo-no-at.html
ARCHER, Gleason L. Merece Confiança o Antigo Testamento? Ed. Vida Nova, São Paulo, 1979.
ARNOLD, Bill. T. e BEYER, Bryan E. Descobrindo o Antigo Testamento – uma perspectiva cristã. Tradução Suzana Klassen. São Paulo. Cultura Cristã, 2001.
BRIGTH, Jonh. História de Israel. 7ª. ed. São Paulo. Paulus, 2003.
ELLISEN, Stanley A. Conheça Melhor o Antigo Testamento, ed. Vida, Florida, 1991.
GARDNER, Paul (Editor). Quem é quem na bíblia sagrada – a história de todos os personagens da bíblia. Tradução de Josué Ribeiro. São Paulo. Vida, 1999.
HOFF, Paul. Os livros históricos. São Paulo. Vida, 1996.
LASOR, William S., HUBBARD, David A. e BUSH, Frederic W. Introdução ao Antigo Testamento. Tradução Lucy Yamakamí. São Paulo. Vida Nova, 1999.
HILL, Andrew E. e WALTON. J. N. Panorama do Antigo Testamento. Tradução Lailah de Noronha. São Paulo. Editora Vida, 2006.
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