Quando examinamos as quatro
narrativas evangélicas em conjunto um tema torna-se recorrente: o embate da
mensagem evangélica de Jesus e a religiosidade judaizante.
Todo o ministério terreno de Jesus
acontece no território da Palestina judaica. Seus ouvintes primários são os
judeus que nasceram e cresceram aprendendo a forma religiosa judaica. Os
maiores opositores de Jesus e sua mensagem são as lideranças judaicas representadas
em todas as suas fragmentações. E isso fica evidente quando no final esses
segmentos religiosos, antagônicos entre si, se unem pela primeira e única vez,
tendo um propósito especifico - elaborar e executar um plano que pudesse eliminar
Jesus.
Por que tanto ódio a Jesus? A
resposta é simples. A mensagem evangélica de Jesus se contrapunha em grau, gênero
e número a todas as formas de expressões religiosas do judaísmo. E isso não é
inédito na história israelita/judeu, pois existe uma longa linhagem de Profetas
que se levantaram e confrontaram o sistema religioso estabelecido em suas
épocas. Jesus apenas vem concluir o trabalho iniciado pelos profetas que o
antecederam. O escritor de Hebreus faz um longo testemunho (capto 11) de que ao
longo da história de Israel/Judá inúmeros homens e mulheres foram mortos
simplesmente porque contestaram o status quo dos religiosos de seus dias. Já no
final de seu ministério Jesus conta a parábola do dono de uma vinha que cansado
de enviar mensageiros, que eram espancados e mortos, por fim enviou seu próprio
filho, na esperança de que as pessoas pudessem ouvi-lo, mas a reação daquelas
pessoas foi ainda mais violenta contra o filho do que contra os mensageiros.
O
Evangelho de Jesus foi e continua sendo rejeitado simplesmente porque as
pessoas não querem mudanças em suas vidas. Estão felizes com sua religiosidade
vazia e fútil, mas que lhes proporciona uma falsa sensação de paz e esperança.
Mas o Evangelho não é apenas rejeitado, mas muitas vezes produz reações
violentas por parte de seus ouvintes, pois quando entendida a mensagem
evangélica lhes tira todos os suportes de vida e eles são obrigados a
respirarem sem aparelho e verem a miserável e terrível situação em que
realmente estão vivendo. No filme Matrix um personagem trai o grupo simplesmente
porque ele prefere ou escolhe viver a ilusão a dura realidade e a cena é
justamente ele saboreando um suculento bife que sabe não ser real. É a mesma
escolha que as pessoas fizeram diante Pôncio Pilatos: Solte Barrabás e mate
Jesus. Quando uma pessoa experimenta do Evangelho, nenhuma religiosidade o
satisfaz mais. As glórias deste mundo tenebroso não são mais irresistíveis,
pois sabem que tudo são apenas ilusões temporárias e seus olhos agora
contemplam as glórias celestiais que são eternas. Estão dispostas a abrirem mão
de tudo, pois descobriram um grande tesouro, vão adquirir uma perora de grande
valor.
O Evangelho não é uma nova religião.
O Evangelho é libertação: "conhecereis
a verdade, e a verdade vos libertará" (João 8.32), pois "se o Filho vos libertar, verdadeiramente
sereis livres" (João 8.36). E o apóstolo Paulo compreendeu
corretamente e o declara em suas epístolas como um brando de vitória: "foi para liberdade que Cristo nos libertou"
(Gálatas 5.1), pois "onde o Espírito
do Senhor está há liberdade" (II Cor. 3.17). O Evangelho não é
religião, mas Vida em abundância (João 10.10). O Evangelho genuíno é a presença
e dinâmica da vida do Jesus ressurreto sendo manifestada na vida de cada
convertido.
Todavia, essa liberdade de vida e
adoração era completamente estranha para aqueles que viviam aprisionados nas
estruturas do judaísmo e a dúvida da mulher samaritana expressa o sentimento
das pessoas de forma geral: onde devemos adorar? Qual é o monte que devemos
subir para adorar? E a resposta de Jesus é libertadora: não importa onde, mas
como se deve adorar – em espírito e em verdade! Aquela mulher sente-se pela
primeira vez na vida completamente livre para adorar a Deus e imediatamente vai
anunciar aos demais moradores de sua vila – fui liberta! Agora posso adorar a
Deus livremente!
O judaísmo dos dias de Jesus é
apenas um representativo da perversão religiosa – uma amalgama de legalismo,
exclusivismo, moralismo, racismo, nacionalismo, etc... que aprisionava a todos
e os asfixiava. A mensagem evangélica de Jesus é a antítese radical e o
contraste final de todas as religiosidades em todos os lugares e épocas. Os
fariseus “piedosos”, os escribas conhecedores da Lei, os saduceus com seu
templo, os zelotes e herodianos com sua política, e os essênios com seu
asceticismo, todos e cada um deles rejeitaram e convergiram para matarem Jesus
e silenciarem sua mensagem libertadora.
Ao declarar aos seus discípulos,
encantados com a beleza do Templo de Jerusalém, de que em pouco tempo aquele
espaço religioso seria transformado em um monturo de pedras, Jesus está
declarando que o Seu Evangelho está completamente livre de toda e quaisquer
estruturas religiosas. Especificamente no primeiro século e depois perdurando
até o quarto século, os cristãos conviviam em qualquer espaço possível, com um
mínimo de estrutura eclesiástica. Somente após o “reconhecimento” efetuado por
Constantino, que lhes ofereceu uma superestrutura eclesiástica, com liturgias
suntuosas e templos riquíssimos é que a igreja cristã tornou-se apenas mais uma
religião no Império Romano. Alguns séculos depois a própria instituição
religiosa denominada de Igreja Católica Romana estará perseguindo e matando
quaisquer pessoas ou grupos que ouse anelar por liberdade fora das estruturas
da santa igreja. Estamos sempre voltando aos dias de Jesus na Palestina. As
palavras do Jesus glorioso aos religiosos da igreja em Laodicéia são um alerta
permanente para todos os religiosos incrustrados dentro das igrejas em todas as
épocas: “Você diz: ‘Eu sou rico, tenho tudo o que necessito;
não preciso de coisa nenhuma’. E não percebe que espiritualmente você é um
desgraçado, um miserável, um pobre, um cego e um nu. O meu conselho a você é
que compre de mim ouro puro, ouro purificado pelo fogo - só então você será
verdadeiramente rico. E que adquira de mim Vestes brancas, limpas e puras, para
que não fique nu e envergonhado; e que obtenha de mim remédio para curar os
seus olhos e devolver-lhe a sua vista” (Ap. 3.17-18). Jesus
nunca aceitou a substituição do Evangelho pela religiosidade, por mais correta
teologicamente.
Concluo me apropriando das palavras
desafiadoras do profeta Elias, após vencer o desafio com os profetas de Baal,
no monte Carmelo: “Escolhei hoje o que
preferem para suas vidas: Evangelho ou Religião?”
Utilização livre desde que citando a fonte
Guedes, Ivan Pereira
Mestre em Ciências da Religião.
me.ivanguedes@gmail.com
Outro Blog
Historiologia Protestante
http://historiologiaprotestante.blogspot.com.br/
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