"Nu saí
do ventre de minha mãe, e nu voltarei para lá; o Senhor deu, e o Senhor tomou;
bendito seja o nome do Senhor."
Este livro de Jó confronta o problema do significado do mistério da
dor. Seja relato histórico ou parábola, seu valor permanece inalterado, como
têm sentido os corações atormentados ao longo de incontáveis séculos — e
continuarão a sentir até o fim. Poucas imagens já concebidas são tão grandiosas
e comoventes quanto a do homem de Uz, em seus dias de antiga riqueza e
felicidade: próspero, alegre, cercado por seus filhos, respeitado pelos homens
e íntegro diante de Deus. Então irrompem as provações, com intensidade
dramática e súbita. Um único dia o arranca de tudo, e, despojado, ele se ergue
com dignidade ainda maior — pois há majestade, assim como solidão, em sua dor.
Quantos espíritos dilacerados pela aflição encontraram repouso
nestas palavras! Quantos lábios trêmulos buscaram pronunciá-las com seus tons
graves e serenos! Para muitos de nós, elas se tornaram sagradas, marcadas por
lembranças de momentos em que se ergueram como um escudo entre nós e o abismo
do desespero.
Parecem
conter tudo o que pode ser dito sobre nossas provações e perdas: revelam a verdade nua dos fatos e expressam toda a gama de
sentimentos que homens íntegros podem — e devem — experimentar.
I. A dor que leva à adoração genuína
Ele
rasgou suas vestes — sinais visíveis da desolação interior e da perda
irreparável.
Vale a pena parar e considerar: fomos feitos para sentir tristeza.
Deus envia dores com o propósito de ferir. A dor tem múltiplas funções em
nossas vidas e em nossos corações. É natural. Isso basta. Foi Deus quem colocou
a fonte das lágrimas em nossas almas. Somos advertidos a não desprezar a
correção do Senhor. A correção é abençoada apenas para aqueles que são
verdadeiramente exercitados por ela.
Ela é sancionada por Cristo. Ele chorou. Ele ordenou que as
mulheres de Jerusalém chorassem por si mesmas e por seus filhos.
A fé não anula as emoções naturais — a dor tão pouco quanto
qualquer outra. Ela orienta, controla, limita, consola e extrai bênçãos daquilo
que fere. Por isso, não busque um estoicismo impossível. Permita que a natureza
siga seu curso e contemple a imagem da dor viril de Jó — contida, silenciosa,
exceto quando provocada pelas acusações injustas que mentem em nome de Deus — e
que se volta para Deus em adoração.
II. O reconhecimento da perda e da dor como lei da vida
Nu saí
do ventre de minha mãe.
Não precisamos nos deter na figura da mãe, sugerindo o túmulo como
o seio materno acolhedor que nos reúne, nem na ideia de que talvez a morte
também seja uma espécie de nascimento.
Mas a verdade apresentada de forma poética é simples e antiga — todas
as posses são transitórias.
O eu nu é revestido e envolto por posses, mas todas estão fora
dele, separadas de sua individualidade. Ele já esteve sem elas. Estará sem elas
novamente. A morte, ao final, nos roubará todas.
A lei inevitável da perda é fixa e certa. Estamos perdendo algo a
cada momento — não apenas posses, mas todos os nossos laços mais queridos são
tecidos apenas por um tempo, e certamente serão rompidos. Eles se vão, e depois
de um tempo, nós também.
A independência de cada alma em relação a todas as suas posses e
relações é tão certa quanto a perda delas. Elas podem ir embora e nos deixar
nus, mas ainda assim existimos. Temos que aprender a dura lição — que soa tão
insensível — de que podemos continuar vivendo apesar de todas as perdas. Nada,
ninguém, é absolutamente necessário para nós.
Tudo isso é muito frio e miserável; é o ponto de vista da lei e da
necessidade. Um ateu poderia dizê-lo. É o início da contemplação cristã da vida
— mas apenas o início.
III. O reconhecimento de Deus na lei da vida
O
Senhor deu, e o Senhor tomou. Isso é um passo muito além do
anterior. Trazer o pensamento do Senhor faz toda a diferença.
A tendência é olhar apenas para a causa secundária. No caso de Jó,
havia duas classes de agentes: homens — caldeus e sabeus — e causas naturais —
fogo e vento — mas ele não parou por aí.
O grande corretivo dessa tendência está na ideia teísta completa:
Deus é a causa única de tudo. A imanência da Divindade em todas as coisas e
eventos é nosso refúgio contra a tirania esmagadora da lei.
Esse reconhecimento devoto de Deus na lei deve ser feito
especialmente em relação à morte, como Jó faz no texto: "O número de
seus meses está contigo." A morte não está mais nem menos sob Seu
controle do que todos os outros incidentes humanos. Ela não tem santidade
especial, nem conexão anormalmente próxima com Sua vontade, mas tampouco está
isenta dessa conexão. A conexão é real. Ele abre a porta do túmulo e ninguém
fecha. Ele fecha, e ninguém abre.
Jó não esqueceu as bênçãos do Senhor, mesmo enquanto se contorcia
sob o golpe de Suas retiradas. Lamentavelmente, muitas vezes é preciso a dor
para que penetre em nossos corações o fato de que devemos tudo a Ele — mas
mesmo então, se não antes, é bom lembrar quanto bem recebemos do Senhor, e essa
lembrança não deve ser uma coroa de tristeza sobre a dor, mas uma coroa de
gratidão.
IV. A resignação agradecida à administração amorosa por Deus
“bendito
seja o nome do Senhor”
As palavras anteriores poderiam ser ditas com mera submissão a um
poder irresistível, mas esta última frase alcança o mais alto ideal cristão.
Ela reconhece na perda e na dor um motivo para louvor.
Por quê?
Porque podemos ter certeza de que toda perda é para o nosso bem.
Porque podemos ter certeza de que toda perda vem de um Deus
amoroso. Na perda de entes queridos, nosso ganho está em nos aproximarmos de
Deus, em sermos ensinados a desejar mais o céu. Em nossa relação com eles, um
amor mais elevado, uma santificação de todo o passado. O ganho deles está em
sua entrada no céu e em toda a glória que alcançaram.
Essa bênção de Deus pela perda não é inconsistente com a dor, mas
antecipa o futuro, quando conheceremos tudo e O bendiremos por tudo.
Utilização
livre desde que citando a fonte
Guedes,
Ivan Pereira
Mestre
em Ciências da Religião.
me.ivanguedes@gmail.com
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Referências Bibliográficas
Texto original integra - THE EXPOSITION OF HOLY SCRIPTURE BY ALEXANDER MACLAREN - JOB-001. SORROW THAT WORSHIPS by ALEXANDER MACLAREN.
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