Quando estudamos a vida de Paulo é
impossível não se referir à sua teologia e quando falamos da teologia paulina torna-se
fundamental conhecer os fatos sobre a vida de Paulo. Isso acontece porque a
teologia dele não foi elaborada em uma confortável sala universitária, mas foi
forjada na bigorna da vida. Os temas mais celestiais desenvolvido pelo apostolo
dos gentios em suas preciosas epístolas estão plenamente conectadas com as
realidades cotidianas dele e, de seus leitores. As correspondências paulinas
não são exotéricas, místicas ou de auto ajuda, mas teológicas pastorais onde a
compreensão dos temas teológicos deve ser compreendida e aplicada em todas as
esferas da vida humana.
Esta conexão direta de sua vida com o
desenvolvimento de seu pensamento teológico pode ser percebida no fato de que
ele valoriza sua história, não apenas após a conversão no caminho para Damasco,
mas até mesmo antes, em relação à sua origem judaica. De maneira que não é
possível, como os acadêmicos liberais tentam fazer, separar os extratos autobiográficos
de Paulo de sua teologia epistolar.
Escrevendo aos crentes da Galácia
(4.12) ele se coloca como modelo de crente para eles; na primeira carta aos
Corintos (9.1) ele declara que foi o instrumento da conversão deles; ao
Filipenses (1.12) ele recorda que todas as dificuldades pelas quais passou, desde
sua conversão e no transcorrer de seu ministério apostólico itinerante, serviu
para promover o Evangelho; assim também escreve aos crentes em Roma (15.18)
onde declara que seu ensino era autenticado por tudo quanto Cristo realizara em
sua vida. Paulo esperava que esses pequenos extratos de sua trajetória pessoal pudessem
de alguma forma contribuir para a autenticação de seu ensino e pregação.
Desta forma, se para o apóstolo
Paulo essas informações pessoais eram relevantes dentro do escopo de seu
ministério apostólico, quando estudamos suas correspondências não podemos simplesmente
ignora-las ou minimizá-las, pois tais informações contribuirá para uma melhor compreensão
do contexto histórico do qual suas cartas e teologia podem melhor serem
compreendidas e interpretadas.
Reforça o argumento suscitado acima
o fato de que cada epístola escrita por Paulo está prenha das circunstâncias
imediatas, visto que elas são ocasionais, ou seja, elas são produzidas na
medida em que fatos vão ocorrendo e ele precisa tratar destas questões o mais
rapidamente possível. Elas são endereçadas a comunidades e pessoas especificas
e em um momento histórico-temporal especifico.
Outro aspecto peculiar é que suas correspondências são
uma extensão de seu trabalho pastoral. Diante das limitações espaço-temporais
Paulo faz de suas correspondências um substituto para sua presença. A linguagem
é a mais próxima possível de uma pastoral, sermão ou aula audível. Toda sua
teologia esta voltada para as necessidades prementes de seus leitores, fossem
comunidade ou pessoais. Seu objetivo primário era de os leitores fossem
fortalecidos na fé e na prática de uma vida cristã dinâmica e frutífera.
Por esta razão as cartas de Paulo não podem ser colocadas
dentro da moldura da retórica epistolar antiga. Em uma mesma correspondência
podemos encontrar diversas características epistolares, pois ele não estava
preocupado com a forma, mas sim em verbalizar por meio da escrita o seu
pensamento e sentimentos em relação ao contexto e a vida de seus leitores
primários. Ainda que ele mantenha em suas cartas um padrão semelhante às
correspondências daquela época: identificação de quem escreve; para quem
escreve; saudação inicial e saudação final (trato deste aspecto em artigo especifico).
O epistolário de Paulo não textos crus que devem
ser estudados somente a através das ferramentas gramaticais exegéticas adequadas,
mas para serem lidas, estudadas e pregadas em harmonia com a vivência do
apostolo. A primeira epístola saída da pena do apóstolo, que defendo ser a dirigida
aos Gálatas, revela um Paulo ainda sob o impacto de sua conversão e zeloso
quanto ao conteúdo da mensagem do Evangelho,
o que transparece na forma contundente e veemente trata os desvios
doutrinários daqueles crentes da Galácia do Sul, provavelmente ainda como resquícios
de seus muitos anos de fariseu extremista.
Mas na medida em que vai amadurecendo na sua
caminha cristã Paulo vai aprendendo a dosar sua linguagem e nas epístolas mais
maduras, ainda que trate de temas teológicos mais complexos e profundos, seu
vocabulário vai se revestindo de um tom cada vez mais pastoral e mesmo quando
escreve uma série de cartas aos Corintos, certamente a comunidade mais difícil
e problemática das que ele havia estabelecido, ele os corrige com firmeza, mas
sem a veemência da carta aos Gálatas. No meio de uma série de correções doutrinários
e morais, ele insere um dos hinos mais belos de toda a literatura bíblica, que
ele apresenta como sendo o caminho sobremodo excelente – o Amor (1 Coríntios
13). E não podemos deixar de mencionar sua carta mais terna e amorosa dirigida
aos Filipenses, que durante todo seu ministério cooperou com ele inclusive
financeiramente.
E quando chegamos ao seu canto do cisne (2
Timóteo), podemos ver o quanto Paulo amadureceu como cristão e mesmo antevendo
seu martírio escreve uma das correspondências mais sensíveis de todo seu
epistolário, dirigida ao seu jovem discípulo, agora não tão jovem mais, plena
de expressões paternais e cuidados para com o amigo de ministério, que terá que
assumir o pesado fardo de não apenas preservar o bom depósito do Evangelho, mas
de transmiti-lo com fidelidade para as novas gerações que o sucederão. Mas a
nota, nesta última carta da pena de Paulo, que entendo ser o representativo deste
longo processo vivencial, é a menção de sua reconciliação com João Marcos, que
fora motivo de sua separação de Barnabé, mas que agora se constitui em
companheiro muito útil no desenvolvimento do ministério cristão dele e da igreja.
Essa pequena nota revela o quanto Paulo aprendeu e amadureceu como apóstolo dos
gentios.
Menosprezar ou minimizar esse processo de
amadurecimento pessoal de Paulo, quando se estuda suas correspondências, é
empobrecer muito sua mensagem e seus ensinos pastorais teológicos. Suas epístolas
não são teses acadêmicas teológicas, elaboradas em escritórios universitários
ou áridos seminários, mas correspondências de um apostolo que desde seu
primeiro dia de conversão até seu último dia antes do martírio, provavelmente
decapitado em Roma, foi aprendendo e reaprendendo a vivenciar na prática
cotidiana seus ensinos doutrinários. Em todas suas cartas Paulo trata dos temas
pesados e difíceis doutrinários e os mescla com uma práxis desta teologia na
vida cristã ordinária.
Assim como tem de ser com todos os genuínos pregadores
e professores bíblicos de ontem e de hoje, as correspondências de Paulo, antes
de ser apenas para seus leitores, eram dirigidas para si mesmo, pois ele jamais
utilizaria o ditado popular: “faça o que ensino, prego e escrevo, mas não faça
o que eu faço”.
Utilização livre desde que citando a fonteGuedes, Ivan PereiraMestre em Ciências da Religião.me.ivanguedes@gmail.comOutro BlogHistoriologia Protestantehttp://historiologiaprotestante.blogspot.com.br/
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