segunda-feira, 1 de outubro de 2018

Natividade: Relatos Evangélicos do Nascimento de Jesus



Quando abrimos as páginas iniciais das narrativas evangélicas elaboradas por Mateus e Lucas nós somos informados sobre o nascimento de Jesus. Os outros dois evangelistas, Marcos e João, optaram por não registrarem informações sobre estes acontecimentos. Marcos inicia com a pessoa de João Batista e sua pregação contestadora da frívola religiosidade judaica de seus dias e prenuncia a vinda daquele que haveria de mudar radicalmente esta caótica situação; O evangelista João opta por retroceder à origem divina de Jesus apresentando-o como a plena revelação de Deus ao seu povo e a partir de então a toda humanidade.
            Apressadamente alguns comentaristas têm inferido de que os relatos natalícios são informações secundárias e, portanto de importância periférica para a compreensão da mensagem evangélica; outros entendem que as informações de Mateus e Lucas são introduções opcionais sobre o personagem central do evangelho e que poderiam ser suprimidas sem causar danos maiores ao desenvolvimento das narrativas e sua mensagem.
            Essas deduções apressadas não são validadas por um estudo mais criterioso do conteúdo destas informações iniciais e o conjunto das narrativas que se seguem. Os textos natalícios são parte integrante da elaboração evangélica proposto por seus respectivos escritores e estão perfeitamente sincronizadas com o todo dos relatos posteriores; com ausências destas informações preliminares a composição sofreria um lapso histórico-teológico irreparável, empobrecendo as narrativas sucessivas. Tanto Lucas quanto Mateus utilizam-se deste preambulo natalício para preparar seus leitores para uma compreensão mais profunda dos temas que estão por virem a serem abordados ao longo das suas narrativas.
            É preciso alertar sempre para o fato de que nenhum deles esta escrevendo uma biografia, nos molde moderno do termo, mas tão somente registrando dentro de critérios por eles estabelecidos, os acontecimentos envolvendo a vida de Jesus. Por outro lado, tais relatos não se constituem em uma coletânea de lendas místicas, utilizadas desde muito para enaltecer o personagem central em relação aos demais. De maneira que, o ambiente proposto por Lucas e Mateus é muito distinto daqueles encontrados nas narrativas evangélicas denominadas apócrifas, como por exemplo, o Protoevangelho de Tiago, ou o Evangelho da infância segundo Tomé, que registram o sobrenatural como artificio para suscitar a admiração dos leitores. Para Lucas e Mateus os relatos são apenas preparatórios para se compreender de forma mais adequada quem foi Jesus e a razão de seu ministério, sua morte e ressurreição.
            Esses relatos natalinos também se constituem em importante ponte de ligação com os registros na primeira parte da Bíblia. Os personagens aqui mencionados são representativos da herança religiosa desenvolvida por séculos dentro do judaísmo. Para Lucas e Mateus compreender a mensagem do Primeiro Testamento é compreender corretamente a manifestação do Advento de Cristo, pois Jesus se constitui no cumprimento de tudo quanto foi proclamado no transcorrer de toda história israelita. Pois dentro da forma interpretativa dos evangelistas, suas introduções natalícias têm como propósito relacionar diretamente o tempo de Jesus como a conclusão do tempo israelita e a inauguração do novo tempo da igreja. Pois para os evangelistas os propósitos de Deus são revelados paulatinamente e se desenvolvem no transcorrer dos fatos por eles registrados em seus respectivos evangelhos.
            Quando analisadas separadamente as duas narrativas são diferentes, mas jamais contraditórias; mas quando estudadas conjuntamente elas se completam de forma harmoniosa como se completam e se harmonizam perfeitamente os diversos instrumentos em submissão a musica composta e sob a batuta de um único regente.
            Aproximação do natal possibilita e estimula uma leitura desses relatos tão ricos sobre o nascimento de Jesus. Caberá a cada leitor as suas próprias conclusões sobre a relevância dessas informações para compor sua significação do que Jesus é para eles. Desde os escritores e seus primeiros leitores, bem como dos últimos a lerem essas narrativas natalinas, o pressuposto da fé e continuara a ser sempre um fator decisivo para recepção, interpretação e divulgação desta mensagem, que mesmo após dois mil anos ainda permanecem tocando profundamente a vida de milhões de pessoas em todo o mundo que leem e ouvem essas narrativas natalícias de Jesus.

Utilização livre desde que citando a fonte
Guedes, Ivan Pereira
Mestre em Ciências da Religião.
me.ivanguedes@gmail.com
Outro Blog
http://historiologiaprotestante.blogspot.com.br/

Artigos Relacionados
Quando o Natal foi Comemorado em 25 de dezembro?
Evangelho Segundo Lucas: O Evangelho da Infância
Viajando no Evangelho Segundo Mateus (2.1-12): A Repercussão Mundial do Nascimento de Jesus

Natal no Evangelho Segundo João - Jesus: Vida e Luz
Contexto Histórico dos Evangelhos

Referência Bibliográfica
ASH, Anthony Lee. O Evangelho Segundo Lucas. Tradução Neyd V. Siqueira. São Paulo: Editora Vida Cristã, 1980.
BETTENCOURT, Estevão. Para Entender os Evangelhos.  Rio de Janeiro: Agir, 1960.
BRUCE, F. F. (Editor) Comentário bíblico NVI – Antigo e Novo Testamento. São Paulo: Editora Vida, 2008.
CARSON D. A., DOUGLAS, J. Moo & MORRIS, Leon. Introdução ao Novo Testamento. São Paulo: Vida Nova, 1997.
CASALEGNO, Alberto. Lucas – a caminho com Jesus missionário. São Paulo: Edições Loyola, 2003.
CHAMPLIN, Russell Norman. O Novo Testamento Interpretado – versículo por versículo, v. I. São Paulo: Millenium, 1987.
________________________. Enciclopédia de Bíblia, Teologia e Filosofia.  São Paulo: Candeia, 1995.
JEREMIAS, Joaquim. Estudos no Novo Testamento. São Paulo: Ed. Academia Cristã Ltda., 2006.
LEAL, João. Os Evangelhos e a Crítica Moderna. Porto: Livraria Apostolado da Imprensa, 1945.
MORRIS, Leon L. Lucas – introdução e comentário. São Paulo: Edições Vida Nova, 2008. [Série Cultura Cristã].
TENNEY, Merrill C. O Novo Testamento - sua origem e análise, 2a ed. São Paulo: Vida Nova, 1972.


Nenhum comentário:

Postar um comentário