terça-feira, 2 de dezembro de 2025

Calvino: Vocabulário Teológico – ADOÇÃO[1]

“Com que confiança alguém se dirigiria a Deus como ‘Pai’? Quem ousaria tamanha audácia de reivindicar para si a honra de ser filho de Deus, se não tivéssemos sido adotados como filhos pela graça em Cristo?” (Institutas, 3.20.36)

“Portanto, assim como Deus regenera apenas os eleitos com uma semente incorruptível para sempre — de modo que a semente de vida semeada em seus corações jamais pereça — assim também Ele sela firmemente neles o dom de Sua adoção, para que seja estável e seguro.” (Institutas, 3.2.11)

João Calvino, nas Institutas da Religião Cristã, apresenta a doutrina da adoção como uma expressão profunda da graça divina: um dom irrevogável que nos permite chamar Deus de “Pai” com plena confiança. Essa filiação não é apenas um status legal (justificação), mas uma realidade espiritual garantida pela regeneração operada pelo Espírito Santo e selada com sua presença constante.

A doutrina da adoção cristã ocupa lugar central no pensamento bíblico teológico de Calvino. Para ele, ninguém ousaria chamar Deus de “Pai” por iniciativa própria. Tal liberdade só é possível porque, em Cristo, fomos feitos filhos pela graça soberana. A adoção é um dom divino, não uma presunção humana. O Espírito Santo, ao efetivar em nós a regeneração, sela essa filiação de modo firme e irrevogável, de maneira que o novo nascimento e a adoção constituem realidades permanentes na vida dos eleitos. Uma vez adotados, somos filhos de Deus para sempre. Isso não significa que não pecaremos mais, pois ainda carregamos nossa natureza pecaminosa. É por essa razão que Davi pode ser chamado o “homem segundo o coração de Deus”, mesmo tendo um prontuário espiritual revelador de seus muitos pecados, porém nada diferente dos nossos.

Ao refletir sobre essa verdade, Sinclair B. Ferguson segue exatamente a trilha aberta por Calvino. Em sua teologia da adoção, Ferguson não descreve nossa relação com o Pai como um mero convite externo, mas como uma introdução real e eficaz à família de Deus. Não éramos apenas estrangeiros — estávamos mortos em nossos delitos e pecados. Portanto, não poderíamos responder a um simples convite; antes, Deus nos vivificou, nos uniu a Cristo e nos trouxe para dentro de Sua própria casa. O Espírito de adoção não apenas nos chama, mas testifica em nosso interior que pertencemos ao Pai, sustentando nossa identidade filial com segurança e esperança.

Encontramos uma maravilhosa ilustração desta verdade na parábola contada por Jesus de um filho pródigo, que se afasta voluntariamente do seu pai e desperdiça tudo que tinha. Então caindo em si o jovem - não volta para casa reivindicando direitos - ao contrário, retorna com a   perspectiva mínima de ser recebido, quando muito, como um mero empregado. Mas o pai corre ao seu encontro, cobre-o de graça e o reintegra como filho, devolvendo-lhe vestes, anel e sandálias — símbolos claros de filiação plena, não de uma posição servil. Aquele rapaz que se contentaria com um trabalho, recebe do pai filiação; ele que buscava apenas a sobrevivência; recebe a reconciliação. O cerne da parábola mostra que a adoção não é uma promoção moral, uma mudança de hábitos, mas uma decisão soberana do Pai que reintroduz o rebelde ingrato, no círculo do amor filial.

Portanto, há uma convergência de pensamento entre Calvino, Ferguson e o próprio Cristo:

·        adoção é resultante da eleição eterna em Cristo.

·        A regeneração é o meio pelo qual somos preparados para participar dessa filiação.

·        O Espírito Santo é o selo permanente que garante nossa pertença à família divina.

·        E a autêntica vida cristã, nos reconcilia e pacífica com Deus, é vivenciada a partir da certeza de que fomos inseridosreintegrados e estabelecidos como filhos - não como servos contratados - na casa do Pai.

De maneira que, a ousadia de podermos chamar Deus de Pai, não nasce da iniciativa ou esforço humano, mas da ação divina totalmente graciosa que nos insere plenamente à família celestial. Somos filhos não por mérito pessoal, mas pela graça que emana da cruz; não por esforço pessoal, mas pelo ato de adoção eterna do Pai, plenamente realizada pelo Filho e efetivamente aplicada pelo Espírito. Como o filho pródigo restaurado, não vivemos para conquistar um lugar na casa — vivemos porque já recebemos esse lugar, por pura e imutável misericórdia.

“Contemplem que amor tão extraordinário o Pai nos concedeu: fomos feitos dignos de ser chamados filhos de Deus — e não apenas chamados, mas realmente o somos” (1 João 3:1).

Não se trata de uma promessa futura, mas de uma realidade aqui e agora.


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Guedes, Ivan Pereira
Mestre em Ciências da Religião.
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sexta-feira, 28 de novembro de 2025

BONHOEFFER – Advento entre o Já e o Ainda Não Escatológico

 Texto, Calendário

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Celebrar o Advento significa saber esperar. Nem todos conseguem esperar: não consegue o saciado, o satisfeito e tampouco o irreverente. Só conseguem esperar aqueles que carregam dentro de si uma inquietação, e aqueles que olham com reverência para aquilo que é maior que tudo no mundo. Assim, somente poderia celebrar o Advento aquele cuja alma não lhe dá descanso, aquele que sabe que é pobre e imperfeito, e que pressente algo da grandeza daquilo que está por vir — diante do qual só resta inclinar-se em humilde temor, esperando até que Ele se incline para nós: o próprio Santo, Deus no menino da manjedoura.

Deus vem, o Senhor Jesus vem, o Natal vem — alegra-te, ó cristandade!

Quando a antiga cristandade falava da volta do Senhor Jesus, pensava primeiramente em um grande dia de juízo. E, por mais “pouco natalino” que esse pensamento nos pareça, ele é primordialmente cristão e extremamente sério. A vinda de Deus não é de fato apenas uma boa notícia; é inicialmente uma notícia terrível para todo aquele que tem consciência. E somente quando sentimos o espanto — até o temor — dessa realidade, podemos então reconhecer o benefício incomparável.

Deus vem, bem no meio do mal, no meio da morte, e julga o mal em nós e no mundo. E ao julgá-lo, Ele nos ama.

Tempo de Advento é tempo de espera; mas toda a nossa vida é tempo de Advento — isto é, tempo de espera pelo Último, pelo tempo em que haverá um novo céu e uma nova terra.

(O trecho correspondente de uma pregação de Dietrich Bonhoeffer publicada na edição crítica

Dietrich Bonhoeffer Werke (DBW), volume 10. [traduzido eletronicamente].

Comentário Devocional

O sermão do qual este recorte foi feito se constitui em um dos mais profundos da espiritualidade cristã sobre o Advento [do latim adventus, “chegada” ou “aproximação”; no calendário cristão, é o tempo de quatro semanas que antecede o Natal], no qual Bonhoeffer resgata sua tensão escatológica, algo que, por ignorância ou propositalmente, tem se perdido na prática devocional/litúrgica moderna. Por experiência pessoal, com mais de 60 anos de membresia evangélica assídua, jamais ouvi tal conexão.
Bonhoeffer enfatiza que o Advento [Natal] é um tempo de espera escatológica — e por que isso se perdeu (nos dias dele e muito mais hoje)? Então ele completa: não espera quem está “saciado” — quem se julga completo, dono de si, sem necessidade de Deus. E quem são os que esperam? Aqueles que sentem inquietação, que sabem que ainda não estão prontos, que, olhando para dentro de si mesmos, percebem sua própria insuficiência. Somente esses são capazes de perceber a grandeza do Deus que vem em toda Sua glória.

Então ele faz uma declaração desconcertante/desconfortável para os ouvidos sensíveis do autossuficiente e para aqueles que vivem tranquilos em sua zona de conforto ou entrincheirados em sua catedral de vitrais coloridos: a vinda de Deus é, a princípio, uma notícia terrível. Por quê?
Porque, quando Deus se aproxima, Ele ilumina e julga o mal — mas não somente o mal no mundo [dos outros], mas igualmente o mal em nós [em mim]. Para o pregador, Advento não é sentimentalismo; é confrontação. É luz que expõe. Pois somente após sermos confrontados é que nos aperceberemos da maravilha grandiosa: o Deus que julga é o Deus que ama.

E Bonhoeffer insiste: Deus não vem ao mundo idealizado, mas:
• ao mal,
• ao sofrimento,
• à morte.

E é ali, onde tudo parece perdido, que Deus coloca a manjedoura — sinalizando que Ele não se aliena da miséria humana, mas, ao contrário, assume a nossa história e a transforma.

A tese final do seu sermão é: a vida inteira é Advento. Não apenas as quatro semanas do calendário litúrgico [no caso evangélico, o mês de dezembro]. Dura a vida inteira. Devemos viver permanentemente na tensão entre a primeira vinda (Belém) e a segunda vinda (a Nova Criação). A cada Natal, devemos nos lembrar de que ainda estamos esperando o último Advento: “Eis que faço novas todas as coisas”.

Desta forma, para Bonhoeffer, não é possível separar:
• o bebê da manjedoura
• do Rei que volta em glória para julgar e restaurar todas as coisas

Para ele, o genuíno Natal somente ocorre quando apontamos para esse horizonte — a restauração final, o novo céu e a nova terra.

Para Reflexão a partir do recorte deste sermão de Bonhoeffer:

1.     O que significa “esperar” no contexto do Advento?

2.     Como o juízo de Deus, mencionado por Bonhoeffer, aprofunda nossa compreensão do Natal?

3.     Deus tem entrado “no meio do mal” em minha própria vida?

4.     De que modo o Natal me chama a adoração e não apenas à festa?

5.     O Natal me faz viver na tensão entre o “Já” e o “Ainda Não”?

 

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Guedes, Ivan Pereira

Mestre em Ciências da Religião.

Universidade Presbiteriana Mackenzie

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Referência Bibliográfica

BONHOEFFER, Dietrich. Advent feiern heißt warten können: Pregação sobre Apocalipse 3,20, Barcelona, 2 dez. 1928. In: BONHOEFFER, Dietrich. Dietrich Bonhoeffer Werke, Bd. 10: Predigten. München: Chr. Kaiser Verlag, 1998. p. 529-532. [texto primário].

BONHOEFFER, Dietrich. God Is in the Manger: Reflections on Advent and Christmas. Editado por Jana Riess; traduzido por O. C. Dean Jr. Louisville: Westminster John Knox Press, 2010. [texto secundário].

BETHGE, Eberhard. Dietrich Bonhoeffer: Theologian, Christian, Man for His Times. A Biography. Minneapolis: Fortress Press, 2000.

DUMAS, André. Una teologia de Ia realidad: Dietrich Bonhoeffer. Bilbao: Desclée de Brouwer, 1971. (Nueva Biblioteca de Teologia; 15).

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quarta-feira, 26 de novembro de 2025

Gênesis – Estudo Devocional: síntese dos 11 primeiros capítulos

 

Padrão do plano de fundo

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Nos primeiros capítulos de Gênesis (1–11), Deus se revela ao mundo mostrando quem Ele é e, ao mesmo tempo, revelando quem nós somos. Esses capítulos explicam por que o mundo está em desordem, porque a humanidade está perdida e sem direção: não é apenas uma questão social ou política, mas, em sua essência, espiritual. O pecado rompeu nossa relação com Deus, conosco mesmos e com a criação. Em Gênesis 3, vemos a raiz da nossa condição: o pecado trouxe maldição sobre toda a criação. E, ao avançarmos para o capítulo 4 e seguintes, percebemos que a situação não melhora — a humanidade continua marcada pela queda. João Calvino em seu comentário de Gênesis vai nesta mesma direção ao comentar os capítulos 3–4 como a revelação da gravidade do pecado e da sua propagação inevitável, ele conclui que a ruptura com Deus não apenas afeta a relação espiritual, mas também corrompe a vida humana e a criação.

Fomos criados como seres de adoração, feitos para encontrar nosso propósito em Deus. Como declarou Agostinho de Hipona: “Fizeste-nos para Ti, e inquieto está o nosso coração enquanto não repousa em Ti.” Desta forma, manter a alienação de Deus, é cultivar uma vida permanece vazia e sem direção, pois somente n’Ele encontramos descanso e significado.

O problema é que quando não buscamos n’Ele o nosso valor e significado, acabamos procurando em outras coisas. Essas buscas podem até trazer satisfação momentânea, mas no fim deixam nossas almas vazias e falidas. Calvino em suas Institutas (livro I, cap. 1) declara afirmativamente que a sabedoria que gera vida espiritual e norteia toda a existência humana está na junção entre o conhecimento de Deus (sua majestade, santidade e graça) e o conhecimento de nós mesmos (nossa fragilidade, dependência e necessidade de redenção), de maneira que qualquer conhecimento ou teologia que ignore essa relação se torna ilusório ou enganoso.

Gênesis 4 nos mostra que a depravação não ficou restrita a Adão e Eva, mas se espalhou para seus filhos e descendentes. Miller elabora uma análise concentrada nos três primeiros capítulos de Gênesis, demonstrando que revelam a estrutura fundamental da existência humana: criados à imagem de Deus, chamados à comunhão e à obediência. Para ele o pecado original produz uma espiral de alienação: primeiro contra Deus, depois contra si mesmo, e finalmente contra o próximo. De maneira que Gênesis 4 é a continuação lógica da queda: o ser humano, afastado de Deus, inevitavelmente se volta contra o próximo.

A relevância destes 11 primeiros capítulos de Gênesis é que ele se constitui em uma ferramenta hermenêutica para interpretarmos corretamente os próximos capítulos (e porque não dizer o restante de toda a Escritura) que se inicia com Abraão como desdobramento da promessa de Gênesis 3.15 — o descendente da mulher que esmagaria a cabeça da serpente — que através da Aliança que Deus estabelecerá com ele, começará a tomar forma, apontando para a vinda do Messias. De maneira que, desde a queda, a humanidade não melhorou; pelo contrário, mergulhou cada vez mais fundo na corrupção. Mas, em meio a essa escuridão, resplandece a promessa da vinda de Cristo.

O nascimento de Caim trouxe decepção: em vez de ser um salvador, tornou-se assassino de seu irmão Abel. A perseguição aos servos de Deus aparece já nas primeiras páginas das Escrituras. À primeira vista, parece que Satanás venceu novamente. Mas não! A morte de Abel não interrompe a linhagem da promessa.

“Tornou Adão a conhecer sua mulher, e ela deu à luz um filho, a quem pôs o nome de Sete, porque, disse ela: Deus me deu outro filho em lugar de Abel, porquanto Caim o matou” (Gn 4.25). E “A Sete também nasceu um filho, a quem pôs o nome de Enos. Foi nesse tempo que os homens começaram a invocar o nome do Senhor” (Gn 4.26).

Assim como Eva teve sua esperança renovada com o nascimento de Sete, também nós, em meio às decepções da vida, podemos ser reabastecidos pela esperança eterna que vem da graça de Deus. O Senhor nunca deixa que a falsa vitória de Satanás prevaleça.

Sete representa um novo começo, uma nova linhagem marcada pela fé. É a descendência da promessa que culmina em Cristo Jesus. E essa nova espiritualidade é descrita assim: “Naqueles dias, as pessoas começaram a invocar o nome do Senhor” (Gn 4.26). Invocar o nome do Senhor é a marca dos que pertencem a Ele. Não são folhas secas levadas pelo vento, mas árvores plantadas junto às águas, que dão fruto em abundância.

Vivemos em dias sombrios, espiritualmente e moralmente. Por isso, nossa primeira e mais importante atitude deve ser esta: entrar na presença de Deus e invocar o Seu nome. O apóstolo Paulo escreveu: “À igreja de Deus que está em Corinto, aos santificados em Cristo Jesus e chamados para serem seu povo santo, juntamente com todos os que, em toda parte, invocam o nome de nosso Senhor Jesus Cristo, Senhor deles e nosso.” (1Co 1.2). Invocar o nome do Senhor é a identidade do cristão. É a nossa esperança, é a nossa vitória.

Oração

Senhor, obrigado porque, mesmo em meio à queda e à depravação humana, Tu manténs viva a promessa da salvação. Ensina-nos a invocar o Teu nome com fé e esperança, lembrando que em Cristo temos uma nova identidade e uma vitória eterna. Amém.

 

 

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Referências Bibliográficas

AGOSTINHO, Santo. Confissões. São Paulo: Paulus, 1997.

CALVINO, João. Comentário sobre Gênesis. São Paulo: Editora Cultura Cristã, 2009.

CALVINO, João. Institutas da Religião Cristã. São Paulo: Editora Cultura Cristã, 2006.

MILLER, Monica Migliorino. In the Beginning: Critical Lessons for Our World from the First Three Chapters of Genesis. Steubenville: Emmaus Road Publishing, 2001.

 


sábado, 22 de novembro de 2025

Sermão: A Glória de Deus e a Restauração da Dignidade Humana (Salmo 8)

 

O Salmo 8 é uma canção de louvor que glorifica a Deus como o Criador de todas as coisas, inclusive do ser humano. Fomos criados para expressar a glória de Deus, feitos à Sua imagem e semelhança. No entanto, esse privilégio foi perdido na Queda. Em Cristo, somos restaurados ao projeto original: viver para a glória de Deus.

Essa é a razão pela qual Jesus morreu na cruz. Não foi para nos tornar ricos ou prósperos, nem para prolongar nossa vida neste mundo. Foi para nos reconduzir ao propósito original para o qual fomos criados: exaltar, glorificar e engrandecer o Deus que criou todas as coisas. Por isso, o salmista abre seu hino declarando: “Ó Senhor, Senhor nosso, quão magnífico em toda a terra é o teu nome!” Ele contempla com admiração as perfeições de Deus.

A criação é a primeira revelação de Deus, nossa “primeira Bíblia”. Quando foi a última vez que paramos para contemplar a beleza de Deus? Quando foi a última vez que paramos para dar glória ao nosso Criador?

Durante a Revolução Francesa, um líder ateu disse a um aldeão cristão: “Vamos derrubar a torre da sua igreja, para que você não tenha mais nada que o lembre de Deus.” O aldeão respondeu: “Você terá que apagar as estrelas também, pois elas continuam a nos falar Dele.”

Neste exato momento, todos os seres celestiais e os nossos irmãos que já partiram estão cantando em uníssono: “Ó Senhor, digno és de receber a glória, a honra e o poder, pois criaste todas as coisas; e por tua vontade elas vieram a existir.”

Você e eu existimos para contemplar e glorificar a Deus. Quando não fazemos isso, nossa vida perde o sentido. É por isso que tantas pessoas vivem insatisfeitas, amargas e frustradas.

Depois de contemplar a glória de Deus na criação, o salmista se volta para si mesmo e pergunta: “Que é o homem, para que te lembres dele? E o filho do homem, para que o visites?”

Existe um ditado popular que diz: “Quem não te conhece, te compra por alto preço.” Mas como Deus nos avalia? Qual o preço que Ele estaria disposto a pagar por mim e por você? A resposta está na cruz. Para nos restaurar ao lugar mais alto de onde caímos, Deus pagou o mais alto preço: Seu Filho Unigênito, Jesus Cristo. A lua e as estrelas não custaram nada, mas a redenção da nossa alma custou o sangue do Filho de Deus.

Este é um dos salmos mais citados no Novo Testamento. É o segundo dos chamados Salmos Messiânicos, junto com o Salmo 2. Em Salmo 8.5, lemos: “Tu o fizeste um pouco menor do que os anjos.” Paulo ecoa essa ideia em Filipenses 2.6–8, ao falar da encarnação de Cristo — que, sendo Deus, se fez homem. No verso 6, o salmista declara: “Tu o fizeste dominar...” Aqui ele antecipa o Cristo glorificado, que assumiu a plenitude da humanidade para que pudéssemos participar de Sua glória.

Na desobediência de Adão, perdemos a imagem e semelhança de Deus. Na perfeita obediência de Jesus, recuperamos a capacidade de refletir Sua glória.

Este salmo começa com louvor, contemplação e admiração pela glória de Deus. Mas o que mais impacta o salmista é o fato de que esse Deus glorioso se importa com seres como nós. “Quem sou eu, para que te lembres de mim?” E ainda assim, Deus se lembra de nós. Lembra de mim, de você — mesmo quando nós nos esquecemos Dele.

Cântico final: E Deus criou o homem, sim, para o louvor da Sua glória.
Mas esse homem preferiu não dar louvor à Sua glória.

 

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Guedes, Ivan Pereira

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sexta-feira, 21 de novembro de 2025

Paulo - 1 Coríntios: Contexto Histórico Geográfico

As correspondências de Paulo com a igreja estabelecida em Corinto não foram das mais fáceis nem das mais agradáveis. Entre as comunidades fundadas pelo apóstolo dos gentios, a de Corinto se destaca como uma das mais problemáticas. As cartas revelam um tom que oscila entre a ternura pastoral e a firmeza corretiva, sempre tendo o propósito de conduzir aqueles primeiros cristãos coríntios a uma vida coerente com o evangelho.

Paulo estabelece essa igreja no transcorrer de sua segunda viagem missionária (aprox. 49–52 d.C.), vindo de uma experiência um tanto frustrante da cidade de Atenas, onde havia pregado (ou pelo menos tentado) no Areópago, mas o resultado foi mínimo com as conversões de Dionísio e Dâmaris).  Mas encontra animo e disposição em Corinto e ali permanece por um período aproximado de um ano e meio (At 18.11), pregando o evangelho e consolidando a essa comunidade cristã.

Foi nesse período que trabalhou como fazedor de tendas (seu ofício aprendido na infância, pois todo menino judeu tinha que aprender uma profissão), na companhia de um casal muito querido do apóstolo, Áquila e Priscila, que haviam sido expulsos de Roma quando se intensificou a perseguição contra os judeus. Também vieram somar ao esforço missionário de Paulo outros dois membros da equipe enviada de Antioquia: Silas e Timóteo.

Mas a redação da Primeira Carta aos Coríntios acontece algum tempo depois, entre 5 e 7 anos, conforme consenso de diversos comentaristas bíblicos. Ocorre em um momento decisivo, quando Paulo planejava seguir para a Grécia e a Macedônia, mas decidiu permanecer em Éfeso até a festa de Pentecostes (1 Co 16.5-8). Entretanto, circunstâncias adversas — incluindo uma onda forte de oposição que se levantou contra ele (At 19.21–20.3) — o levaram a antecipar sua partida. Diante de todo esse contexto histórico, estabeleceu-se o consenso de que ele escreveu essa epístola no início do ano 57 d.C.

O longo tempo decorrido entre a elaboração e envio da carta e o início das atividades missionárias de Paulo naquela cidade, revelam que o apostolo mantinha cuidados pastorais com as comunidades por ele iniciadas. Calvino entende que o tempo decorrido demonstra que Paulo, mesmo distante temporalmente, continuava sentindo-se responsável por corrigir e instruir os coríntios, reafirmando seu papel pastoral.

A cidade de Corinto

Quando entendemos a geografia da cidade e sua relevância logística, entendemos a razão do esforço de Paulo em estabelecer nela uma forte comunidade cristã.

Corinto era uma das cidades mais prósperas e conhecidas da Grécia antiga. Situava-se em um ponto estratégico, no istmo (estreita faixa de terra que liga duas áreas maiores e separa dois corpos de água) que conectava o Peloponeso ao continente grego. Essa localização privilegiada fazia dela um centro de passagem obrigatório tanto para o comércio terrestre quanto para o marítimo.

A cidade se estendia por uma planície, ao pé do Acrocorinto, uma colina imponente que servia como fortaleza natural e tinha relevância das diversas religiões pagãs. Sua posição geográfica a transformava em um verdadeiro cruzamento comercial, por onde circulavam mercadorias e pessoas vindas da Ásia em direção à Europa e vice-versa.

Além da relevância econômica, Corinto também se transformara em um caldeirão cultural e religioso. Essa mistura de riqueza, luxo e religiosidade decadente deu fama à cidade como um lugar de excessos. A ponto de pejorativamente se usar o termo “corintianizar” como sinônimo de libertinagem e vida desenfreada. Escritores da época mencionam Corinto como um centro de devassidão. Um dos cultos pagãos mais concorrido era o do templo de Afrodite, denominada de deusa do amor sensual. Ao redor e nas dependências do próprio templo, localizado no Acrocorinto, centenas de mulheres trabalhavam como prostitutas sagradas, sustentadas em grande parte por estrangeiros que visitavam a cidade, mas também uma grande parcela eram escravas e obrigadas a se submeterem à exploração sexual e à idolatria.

Outro templo notável era o de Apolo, localizado na encosta norte do Acrocorinto. Ele era venerado como deus da luz, da profecia, da poesia, da música, da cura e da juventude, mas também associado a peste e à morte súbita. Seus cultos tinham forte ligação com a adivinhação. O Oráculo de Delfos era consultado por líderes e cidadãos para decisões políticas, militares e pessoais.

Não sem razão o apostolo Paulo conclui da relevância de se estabelecer uma igreja naquela cidade. De fato o desafio diante do apostolo era tremendo e humanamente impossível, mas Paulo estava sendo conduzido pelo Espírito Santo e portanto, não há impossíveis para Deus. O teólogo W. D. Chamberlain pensando nos grandes desafios de Paulo, escreveu: “Se o Evangelho pôde triunfar em Corinto, pode vencer em qualquer circunstância.”

Problemáticas da igreja de Corinto

Para melhor compreendermos as problemáticas desta igreja é preciso levar em conta o contexto acima mencionado. Após sua fundação, e durante a ausência de Paulo, começaram a surgir graves dificuldades, que podem ser vistas no próprio conteúdo da correspondência.

1.     Partidarismo Interno. A igreja acabou por produzir um emaranhado de facções, ao redor de nomes e figuras conhecidas. Alguns exaltavam Apolo, admirado por sua eloquência e erudição (1 Co 1.12; 3.4; cf. At 18.24–19.1). Outros diziam ser seguidores de Pedro, um dos apóstolos originais. Havia também os que se declaravam de Cristo, rejeitando qualquer liderança humana. Essas divisões apenas corroía a unidade e o testemunho da igreja.

2.     Imoralidade Crescente. Muitos cristãos, ainda pressionados por uma cultura de imoralidade, voltaram a práticas antigas. Paulo tem que tratar com firmeza casos de pecados graves, como a imoralidade sexual (1 Co 5).

3.     Disputas Legais Públicas. Os membros da igreja estavam levando suas disputas aos tribunais seculares (1 Co 6), expondo a comunidade ao escárnio público.

4.     Deturpação Cúlticas. A própria Ceia do Senhor havia se transformado em banquetes descontrolados, onde alguns se excediam, enquanto outros passavam necessidade (1 Co 11.17-34).

5.     Questões práticas. O apostolo aproveita a carta para responde dúvidas sobre casamento e celibato (cap. 7), alimentos sacrificados a ídolos (cap. 8), e sobre o papel das mulheres no culto (cap. 11.2-16).

6.     Dons espirituais. Paulo utiliza três capítulos 12 a 14 para esclarecer sobre o que é e a relevância dos dons espirituais, mostrando que ninguém é dono do dom e que a diversidade deveria servir para edificação, não para competição.

7.     A ressurreição. No capítulo 15, o apostolo esclarece as dúvidas e corrige o ceticismo sobre a realidade e a natureza da ressurreição, reafirmando sua centralidade na fé cristã.

Examinado tão rapidamente o conteúdo desta epistola é assustador de como ela é tão pouco valorizada em sua integralidade e pregada exaustivamente nos púlpitos contemporâneos. Este silêncio é profundamente revelador. Como se não se levantar essas questões hoje, significa que estas problemáticas não existam. É muito provável que a pujança de Igreja tem perdido sua força, justamente porque não tem tratado as suas próprias problemáticas.

Fontes de informação de Paulo

O apostolo Paulo nunca trabalhou. Se ele estava ausente por um tempo longo, como sabia os detalhes acima referido. Ele recebeu relatos de diferentes fontes.

·        Paulo tinha uma boa rede de colaboradores - Timóteo, Tito, Silas e Lucas - que percorriam as igrejas estabelecidas e traziam notícias delas.

·        Uma família - a casa de Cloé (1 Co 1.11), procurou Paulo e lhe informou sobre várias desta questões que estavam permeando a igreja de Corinto.

·        Até mesmo uma possível delegação da igreja, composta por Estéfanas, Fortunato e Acaico (1 Co 16.17), estiveram com Paulo relatando-lhe os ocorridos após a ausência do apostolo.

Com fortes indícios, porém sem comprovação histórica, Paulo indica que já havia escrito uma carta anterior (agora perdida) e talvez feito uma visita breve à cidade. E pessoalmente ele enviou Timóteo (1 Co 4.17; 16.10) e, posteriormente Tito, seus colaboradores próximos, em diferentes momentos. Tudo isso demostra o cuidado pastoral constante do apóstolo com a comunidade de Corinto.

Portanto, esta Primeira Carta aos Coríntios não é apenas um documento histórico, mas um retrato vivo da luta da igreja cristã em meio a uma sociedade complexa e corrompida. O apostolo deixa claro que o Evangelho não deve sucumbir diante das pressões cotidianas e nem se amalgamar com as culturas ou moralidade frouxa, liberal e lasciva da sociedade onde esteja inserida, mas deve ser um agente de transformação de vidas independente do contexto.

Corinto, apesar de ser conhecida pela seu paganismo e depravação escancarada, veio a se constituir em palco da manifestação da graça de Deus. E o testemunho daquela igreja continua sendo um lembrete. onde o pecado se multiplica, a graça de Deus deve abundar ainda mais (Rm 5.20).

 

Utilização livre desde que citando a fonte
Guedes, Ivan Pereira
Mestre em Ciências da Religião.
me.ivanguedes@gmail.com
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