sexta-feira, 28 de novembro de 2025

BONHOEFFER – Advento entre o Já e o Ainda Não Escatológico

 Texto, Calendário

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Celebrar o Advento significa saber esperar. Nem todos conseguem esperar: não consegue o saciado, o satisfeito e tampouco o irreverente. Só conseguem esperar aqueles que carregam dentro de si uma inquietação, e aqueles que olham com reverência para aquilo que é maior que tudo no mundo. Assim, somente poderia celebrar o Advento aquele cuja alma não lhe dá descanso, aquele que sabe que é pobre e imperfeito, e que pressente algo da grandeza daquilo que está por vir — diante do qual só resta inclinar-se em humilde temor, esperando até que Ele se incline para nós: o próprio Santo, Deus no menino da manjedoura.

Deus vem, o Senhor Jesus vem, o Natal vem — alegra-te, ó cristandade!

Quando a antiga cristandade falava da volta do Senhor Jesus, pensava primeiramente em um grande dia de juízo. E, por mais “pouco natalino” que esse pensamento nos pareça, ele é primordialmente cristão e extremamente sério. A vinda de Deus não é de fato apenas uma boa notícia; é inicialmente uma notícia terrível para todo aquele que tem consciência. E somente quando sentimos o espanto — até o temor — dessa realidade, podemos então reconhecer o benefício incomparável.

Deus vem, bem no meio do mal, no meio da morte, e julga o mal em nós e no mundo. E ao julgá-lo, Ele nos ama.

Tempo de Advento é tempo de espera; mas toda a nossa vida é tempo de Advento — isto é, tempo de espera pelo Último, pelo tempo em que haverá um novo céu e uma nova terra.

(O trecho correspondente de uma pregação de Dietrich Bonhoeffer publicada na edição crítica

Dietrich Bonhoeffer Werke (DBW), volume 10. [traduzido eletronicamente].

Comentário Devocional

O sermão do qual este recorte foi feito se constitui em um dos mais profundos da espiritualidade cristã sobre o Advento [do latim adventus, “chegada” ou “aproximação”; no calendário cristão, é o tempo de quatro semanas que antecede o Natal], no qual Bonhoeffer resgata sua tensão escatológica, algo que, por ignorância ou propositalmente, tem se perdido na prática devocional/litúrgica moderna. Por experiência pessoal, com mais de 60 anos de membresia evangélica assídua, jamais ouvi tal conexão.
Bonhoeffer enfatiza que o Advento [Natal] é um tempo de espera escatológica — e por que isso se perdeu (nos dias dele e muito mais hoje)? Então ele completa: não espera quem está “saciado” — quem se julga completo, dono de si, sem necessidade de Deus. E quem são os que esperam? Aqueles que sentem inquietação, que sabem que ainda não estão prontos, que, olhando para dentro de si mesmos, percebem sua própria insuficiência. Somente esses são capazes de perceber a grandeza do Deus que vem em toda Sua glória.

Então ele faz uma declaração desconcertante/desconfortável para os ouvidos sensíveis do autossuficiente e para aqueles que vivem tranquilos em sua zona de conforto ou entrincheirados em sua catedral de vitrais coloridos: a vinda de Deus é, a princípio, uma notícia terrível. Por quê?
Porque, quando Deus se aproxima, Ele ilumina e julga o mal — mas não somente o mal no mundo [dos outros], mas igualmente o mal em nós [em mim]. Para o pregador, Advento não é sentimentalismo; é confrontação. É luz que expõe. Pois somente após sermos confrontados é que nos aperceberemos da maravilha grandiosa: o Deus que julga é o Deus que ama.

E Bonhoeffer insiste: Deus não vem ao mundo idealizado, mas:
• ao mal,
• ao sofrimento,
• à morte.

E é ali, onde tudo parece perdido, que Deus coloca a manjedoura — sinalizando que Ele não se aliena da miséria humana, mas, ao contrário, assume a nossa história e a transforma.

A tese final do seu sermão é: a vida inteira é Advento. Não apenas as quatro semanas do calendário litúrgico [no caso evangélico, o mês de dezembro]. Dura a vida inteira. Devemos viver permanentemente na tensão entre a primeira vinda (Belém) e a segunda vinda (a Nova Criação). A cada Natal, devemos nos lembrar de que ainda estamos esperando o último Advento: “Eis que faço novas todas as coisas”.

Desta forma, para Bonhoeffer, não é possível separar:
• o bebê da manjedoura
• do Rei que volta em glória para julgar e restaurar todas as coisas

Para ele, o genuíno Natal somente ocorre quando apontamos para esse horizonte — a restauração final, o novo céu e a nova terra.

Para Reflexão a partir do recorte deste sermão de Bonhoeffer:

1.     O que significa “esperar” no contexto do Advento?

2.     Como o juízo de Deus, mencionado por Bonhoeffer, aprofunda nossa compreensão do Natal?

3.     Deus tem entrado “no meio do mal” em minha própria vida?

4.     De que modo o Natal me chama a adoração e não apenas à festa?

5.     O Natal me faz viver na tensão entre o “Já” e o “Ainda Não”?

 

Utilização livre desde que citando a fonte

Guedes, Ivan Pereira

Mestre em Ciências da Religião.

Universidade Presbiteriana Mackenzie

me.ivanguedes@gmail.com

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Referência Bibliográfica

BONHOEFFER, Dietrich. Advent feiern heißt warten können: Pregação sobre Apocalipse 3,20, Barcelona, 2 dez. 1928. In: BONHOEFFER, Dietrich. Dietrich Bonhoeffer Werke, Bd. 10: Predigten. München: Chr. Kaiser Verlag, 1998. p. 529-532. [texto primário].

BONHOEFFER, Dietrich. God Is in the Manger: Reflections on Advent and Christmas. Editado por Jana Riess; traduzido por O. C. Dean Jr. Louisville: Westminster John Knox Press, 2010. [texto secundário].

BETHGE, Eberhard. Dietrich Bonhoeffer: Theologian, Christian, Man for His Times. A Biography. Minneapolis: Fortress Press, 2000.

DUMAS, André. Una teologia de Ia realidad: Dietrich Bonhoeffer. Bilbao: Desclée de Brouwer, 1971. (Nueva Biblioteca de Teologia; 15).

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