quarta-feira, 31 de janeiro de 2018

Evangelhos: A Questão Sinótica – As diferenças


            É preciso esclarecer que quando se fala de diferenças nas narrativas sinóticas não implica em contradições. Como se pode ver abaixo cada evangelista na construção de seus textos evangélicos tem a plena liberdade de elaborar seus materiais comuns em harmonia com seus propósitos e seus respectivos leitores primários.
Diferenças Quanto ao Conteúdo
Há passagens que são peculiares a dois ou a um apenas dos Evangelhos sinóticos, conforme abaixo colocamos alguns exemplos:
Mateus: é o único a referir‑se à perplexidade de José diante de Maria (1: 18‑25); a seqüência "visita dos Magos a Jesus; fuga para o Egito; morticínio dos inocentes, volta para Israel" (2:1‑23); algumas das Parábolas são registradas apenas por ele ‑ do joio (13:24‑30 e 36‑43), do tesouro. da pérola, da rede (13:44‑50), do servo perdoado, mas inclemente (18:23‑35). das dez virgens (25:]‑l3)~ o registro dc Pedro caminhando sobre as águas (14:28‑3 1).
Marcos: Dos três é o que menos material exclusivo possui ‑ as curas do surdo‑mudo (7:3137), do cego de Betsaida (8:22‑26). a Parábola da semente que cresce por si (4:26‑29)... Por outro lado. omitiu completamente o Sermão da Montanha. e silenciou em relação a infância de Jesus.
Lucas: Como Mateus ele também insere muitos fatos independentes: acontecimentos da infância de Jesus (I e 2)‑, episódio com Marta e Maria (10:38‑42), Zaqueu (19128). Na própria narrativa da Paixão somente ele se refere a atitude de Herodes (23:612) e a do ladrão arrependido (23:40‑43).
Divergências na Sequência dos Acontecimentos
Ao passarmos da leitura de um sinótico para outro, podemos perceber muitas vezes que há uma inversão na ordem dos fatos:
Em Mc 6:1‑6 = Mt 13:53‑58 encontramos o relato de Jesus sendo rejeitado em sua cidade natal, Nazaré; Lc, no entanto, informa já no início da atuação pública de Jesus a respeito de sua primeira pregação em Nazaré (4:16‑30).
Em Mc 1:16‑20 = Mt 4:18‑22 fala‑se resumidamente da vocação dos primeiros discípulos, enquanto em Lc a vocação de Pedro se segue à pesca maravilhosa (5:1‑11).
Mc trata primeiramente da afluência do povo e das curas de Jesus, e somente depois disto a vocação do circulo dos doze (3:7‑12, 13‑19); em Lc a seqüência é invertida (6:12‑16: chamado dos doze; 6:17‑19: afluência das multidões e curas).
Quando Jesus é tentado temos uma inversão nos registros de Mt e Lc em relação a segunda e a terceira tentação (Mt 4: 1 ‑11 e Lc 4:1‑13).
Mt condensa de forma sistemática o chamado Sermão do Monte ( 5 a 7 ), enquanto Lc o divide em várias porções independentes ( 6:20‑49: 11:11‑13, 33‑36; 12:22‑34. 58ss; 13:24-27; etc ... ).
Divergências nas Narrativas dos Mesmos Acontecimentos
Em várias ocasiões os evangelistas sinóticos se utilizam de palavras ou expressões bem diferentes, mesmo quando fazem citação das palavras do próprio Jesus ou de outro personagem, não os registram uniformemente, ocorrendo discrepâncias que por vezes trazem dificuldade ao exegeta. Alguns exemplos se fazem necessários:
Mt registra as palavras de João Batista em que ele diz que não é digno de carregar as sandálias do Senhor (3:11); enquanto que em Mc e Lc ele afirma que é indigno de desatar a correia das mesmas (L7, 3:16).
Mc (6:8) registra a ordem de Jesus aos Apóstolos para que não levassem em suas viagens missionárias senão o bastão habitual para longas viagens, porém. Mt (10:10) e Lc (9:3) registram que até o bastão teria sido proibido.
A oração do "Pai Nosso" ensinada por Jesus varia: em Mt 6:9‑13 é composta de sete petições. e em Lc 11:2‑4 contém apenas cinco.
A formula de ordenação da Santa Ceia também é registrada diferentemente em cada um dos sinóticos Mt 26‑26‑28, Me 14:22‑24 e Lc 22:19ss.
A inscrição na Cruz de Cristo é descrito diferentemente por eles: Mt 27:37. Mc 15:26 e Lc 23:38 (cf Jo 19:19).
As últimas palavras de Jesus também não são registradas das mesma forma pelos sinóticos. Em Mc 15:34 = Mt 27:46 o Senhor Jesus recita as palavras do salmista (22: 1) "Deus meu. Deus meu, por que me desamparaste?". Lc omite estas palavras, mas acrescenta outras três, ditas pelo Senhor e não registradas pelos outros dois (Lc 23:34,43.46).
Creio não ser necessário multiplicarmos os exemplos para podermos avaliar o alcance do problema que nos apresenta. Por que será que dentre tantos ditos e feitos de Jesus (Jo.20:30; 21:25) os evangelistas sinóticos selecionaram tantos iguais, que eles apresentaram na mesma ordem, usando até mesmo vocábulos iguais, mas, apesar disto, diferenciaram-se em tópicos importantes e de maneira tão imprevista.


Utilização livre desde que citando a fonte
Guedes, Ivan Pereira
Mestre em Ciências da Religião.
Universidade Presbiteriana Mackenzie
me.ivanguedes@gmail.com
Outro Blog
Historiologia Protestante
http.//historiologiaprotestante.blogspot.com.br/


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Referências Bibliográficas
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