É preciso esclarecer que quando se
fala de diferenças nas narrativas sinóticas não implica em contradições. Como
se pode ver abaixo cada evangelista na construção de seus textos evangélicos
tem a plena liberdade de elaborar seus materiais comuns em harmonia com seus
propósitos e seus respectivos leitores primários.
Diferenças
Quanto ao Conteúdo
Há passagens que são peculiares a dois ou a um apenas dos
Evangelhos sinóticos, conforme abaixo colocamos alguns exemplos:
Mateus: é
o único a referir‑se à perplexidade de José diante de Maria (1: 18‑25); a
seqüência "visita dos Magos a Jesus; fuga para o Egito; morticínio dos
inocentes, volta para Israel" (2:1‑23); algumas das Parábolas são
registradas apenas por ele ‑ do joio (13:24‑30 e 36‑43), do tesouro. da pérola,
da rede (13:44‑50), do servo perdoado, mas inclemente (18:23‑35). das dez
virgens (25:]‑l3)~ o registro dc Pedro caminhando sobre as águas (14:28‑3 1).
Marcos: Dos
três é o que menos material exclusivo possui ‑ as curas do surdo‑mudo
(7:3137), do cego de Betsaida (8:22‑26). a Parábola da semente que cresce por
si (4:26‑29)... Por outro lado. omitiu completamente o Sermão da Montanha. e
silenciou em relação a infância de Jesus.
Lucas: Como
Mateus ele também insere muitos fatos independentes: acontecimentos da infância
de Jesus (I e 2)‑, episódio com Marta e Maria (10:38‑42), Zaqueu (19128). Na
própria narrativa da Paixão somente ele se refere a atitude de Herodes (23:612)
e a do ladrão arrependido (23:40‑43).
Divergências
na Sequência dos Acontecimentos
Ao passarmos da leitura de um sinótico para outro,
podemos perceber muitas vezes que há uma inversão na ordem dos fatos:
Em Mc 6:1‑6 = Mt 13:53‑58 encontramos o relato de Jesus
sendo rejeitado em sua cidade natal, Nazaré; Lc, no entanto, informa já no
início da atuação pública de Jesus a respeito de sua primeira pregação em
Nazaré (4:16‑30).
Em Mc 1:16‑20 = Mt 4:18‑22 fala‑se resumidamente da
vocação dos primeiros discípulos, enquanto em Lc a vocação de Pedro se segue à
pesca maravilhosa (5:1‑11).
Mc trata primeiramente da afluência do povo e das curas
de Jesus, e somente depois disto a vocação do circulo dos doze (3:7‑12, 13‑19);
em Lc a seqüência é invertida (6:12‑16: chamado dos doze; 6:17‑19: afluência
das multidões e curas).
Quando Jesus é tentado temos uma inversão nos registros
de Mt e Lc em relação a segunda e a terceira tentação (Mt 4: 1 ‑11 e Lc 4:1‑13).
Mt condensa de forma sistemática o chamado Sermão do
Monte ( 5 a 7 ), enquanto Lc o divide em várias porções independentes ( 6:20‑49:
11:11‑13, 33‑36; 12:22‑34. 58ss; 13:24-27; etc ... ).
Divergências
nas Narrativas dos Mesmos Acontecimentos
Em várias ocasiões os evangelistas sinóticos se utilizam
de palavras ou expressões bem diferentes, mesmo quando fazem citação das
palavras do próprio Jesus ou de outro personagem, não os registram
uniformemente, ocorrendo discrepâncias que por vezes trazem dificuldade ao
exegeta. Alguns exemplos se fazem necessários:
Mt registra as palavras de João Batista em que ele diz
que não é digno de carregar as sandálias do Senhor (3:11); enquanto que em Mc e
Lc ele afirma que é indigno de desatar a correia das mesmas (L7, 3:16).
Mc (6:8) registra a ordem de Jesus aos Apóstolos para que
não levassem em suas viagens missionárias senão o bastão habitual para longas
viagens, porém. Mt (10:10) e Lc (9:3) registram que até o bastão teria sido
proibido.
A oração do "Pai Nosso" ensinada por Jesus
varia: em Mt 6:9‑13 é composta de sete petições. e em Lc 11:2‑4 contém apenas
cinco.
A formula de ordenação da Santa Ceia também é registrada
diferentemente em cada um dos sinóticos Mt 26‑26‑28, Me 14:22‑24 e Lc 22:19ss.
A inscrição na Cruz de Cristo é descrito diferentemente
por eles: Mt 27:37. Mc 15:26 e Lc 23:38 (cf Jo 19:19).
As últimas palavras de Jesus também não são registradas
das mesma forma pelos sinóticos. Em Mc 15:34 = Mt 27:46 o Senhor Jesus recita
as palavras do salmista (22: 1) "Deus meu. Deus meu, por que me
desamparaste?". Lc omite estas palavras, mas acrescenta outras três, ditas
pelo Senhor e não registradas pelos outros dois (Lc 23:34,43.46).
Creio não ser necessário multiplicarmos os exemplos para
podermos avaliar o alcance do problema que nos apresenta. Por que será que
dentre tantos ditos e feitos de Jesus (Jo.20:30; 21:25) os evangelistas
sinóticos selecionaram tantos iguais, que eles apresentaram na mesma ordem,
usando até mesmo vocábulos iguais, mas, apesar disto, diferenciaram-se em
tópicos importantes e de maneira tão imprevista.
Utilização
livre desde que citando a fonte
Guedes,
Ivan Pereira
Mestre
em Ciências da Religião.
Universidade
Presbiteriana Mackenzie
me.ivanguedes@gmail.com
Outro
Blog
Historiologia
Protestante
http.//historiologiaprotestante.blogspot.com.br/
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