É
um fato reconhecido que o livro de Atos é de importância fundamental na
arquitetura do Novo Testamento. Sua importância para a história do movimento
cristão é de valor inestimável, pois é o único documento que nos apresenta os
momentos cruciais que marcaram os primeiros movimentos do cristianismo, após os
acontecimentos relatados nos evangelhos.
Todavia,
este livro tem sido utilizado, muitas vezes fora de um contexto hermenêutico
correto, por vários grupos cristãos para dar sustentação aos seus ensinos, sua
fé, sua doutrina e sua ética. Por exemplo, a Igreja Católica Romana, segundo suas regras
de interpretação, o usa como uma das bases bíblicas o estabelecimento da
hierarquia clerical. Os grupos
carismáticos buscam em algumas de suas passagens,
argumentos para darem sustentação às suas doutrinas e práticas relacionadas com
o Espírito Santo. Quem também se utiliza abundantemente deste livro são os
defensores da chamada teologia
da libertação, que segundo suas regras de interpretação, o empregam
para subsidiar seu conceito da missão verdadeira da Igreja.
Deste
modo, a forma como se lê e interpreta o livro de Atos vai determinar o fim ou
propósito de sua utilização. Ainda que possa ser utilizado com a maior e melhor
das boas intenções Atos, como qualquer outro livro bíblico, tem que ser
estudado e interpretado segundo as normas estabelecidas pela hermenêutica
bíblica. Quando isto não é feito corre-se o risco de se chegar a conclusões
precipitadas ou mesmo intencionalmente distorcidas do sentido original do texto
bíblico.
Hermenêutica
vem do grego ermeneúo (explicar) como podemos ver em Mateus 1.23 “... e chamarás seu nome Emanuel, que traduzido
[ermeneúo] quer dizer: Deus conosco”. Ela tem sido definida como a ciência
e a arte da interpretação. É uma ciência porque se baseia em certas normas e
princípios e é arte porque exige destreza e habilidade que somente se adquire
com a prática. Interpretar, aplicado à linguagem, significa encontrar e
explicar o significado original de uma composição literária, uma expressão
verbal ou qualquer outro meio de comunicação que se empregue. A
responsabilidade do interprete é captar e expressar com o máximo de exatidão o
significado daquilo que o autor original desejou expressar.
É
de vital importância, portanto, que o interprete utilize o principio ou
princípios que com maior segurança lhe possibilitará a expressar com clareza o
significado original do que esta a interpretar. Nestes últimos tempos tem se
multiplicado sem limites os sistemas hermenêuticos, trazendo em seu bojo muito
mais confusão do que clareza. O que se percebe é que cada grupo sectário acaba
por criar regras próprias de hermenêutica para dar sustentabilidade às suas
ideias e conceitos pré-concebidos. Assim sendo, o cristão que deseja estudar,
aplicar a sua vida e proclamar a outros o conteúdo da Palavra de Deus, deve
fundamentar-se em um método ou principio de interpretação que o ajude a alcançar
seus objetivos.
O
interprete deve lembrar sempre que a Bíblia é uma unidade, ainda que conste de
um total de sessenta e seis livros. Isto significa que o interprete tem a
responsabilidade de integrar harmoniosamente os ensinos extraídos de cada um
destes livros. Ele precisa ter uma percepção teológica, pois, se a Bíblia é um
todo e tem apenas um Autor Divino (o Espírito Santo), isto implica em que não
pode haver contradições reais em seu conteúdo. Deste modo, a grande tarefa do
interprete é indubitavelmente a de harmonizar os ensinos contidosde Gêneses ao
Apocalipse.
Os
princípios de interpretação são as ferramentas para todo aquele que pretende
estudar e expor as Escrituras. Para ser um bom pregador e professor bíblico é
necessário que aprenda e utilize estas preciosas ferramentas. O bom sermão e a
boa aula é aquela em que o texto bíblico foi respeitado e interpretado com
fidelidade e não aqueles em que a pessoa expõe sua próprias ideias e conceitos.
O
que se chama de nova hermenêutica é apenas uma desculpa para distorcer o sentido
original do texto bíblico. Por exemplo, a hermenêutica política é a pretensão
de se interpretar a Bíblia à luz das situações sócio-políticas existentes. O
que ocorre é que não se produz uma interpretação, mas sim, uma reinterpretação
das situações sócio-políticas que são confrontadas com as condições sociais
contemporâneas. A Bíblia não deve ser interpretada à luz das condições sociais,
mas, as condições sociais podem e devem ser interpretadas à luz da Bíblia.
As
Escrituras, que foram dirigidas à necessidades especificas, devem ser
interpretadas e aplicadas às necessidades de situações atuais. A tarefa do
interprete é tomar a essência dinâmica da revelação de Deus e, debaixo da
direção do Espírito Santo, fazer a aplicação pertinente às questões
contemporâneas. Mas isto somente poderá ser feito com a aplicação de uma
hermenêutica sadia.
Meu
desejo é que o material disponibilizado aqui sobre o livro de Atos possa ser
usado por Deus e possa alcançar três objetivos: 1) Despertar o interesse e o
valor do livro de Atos; 2) guiar aqueles que o utilizam a uma melhor
compreensão do mesmo; e finalmente (3) prover aos leitores uma hermenêutica
mais sadia com a qual pode ser alcançadas as primeiras metas.
Utilização
livre desde que citando a fonte
Guedes, Ivan Pereira
Mestre em
Ciências da Religião.
Universidade
Presbiteriana Mackenzie
me.ivanguedes@gmail.com
Outro Blog
Historiologia Protestante
http://historiologiaprotestante.blogspot.com.br//
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interpretação bíblica – meios de descobrir a verdade da Bíblia. Tradutor
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