segunda-feira, 3 de março de 2025

Galeria da Graça de Deus – Hebreus 11 - Abel

Observações iniciais

Ficaremos duplamente surpresos com as pessoas que são nomeadas nesta Galeria da Fé...

Primeiro veremos nomes que em nossa opinião (imperfeita) não deveriam estar ali de maneira alguma....

Segundo sentiremos falta de muitos nomes que deveriam estar ali sem duvida alguma...

Esclarecimentos

Primeiramente é preciso lembrar de que os subtítulos encontrados em nossas bíblias, seja no Primeiro como no Segundo Testamentos não fazem parte dos textos originais, que fazem a distinção de temas apenas com a utilização dos parágrafos ou perícopes. Esses subtítulos foram incorporados nos textos bíblicos com o intuito de facilitar sua leitura por leitores “modernos”, mas que em muitas ocasiões chegam confundir o propósito do escritor, pois acabam “picotando” o texto original, separam o que ele não pensou em separar. Portanto, o subtítulo “Galeria da Fé” ou similares, não são prejudiciais em si, mas pode, como acaba fazendo, trazendo uma ideia moderna, para o propósito original do escritor.

Segundo, o autor, que nem mesmo se auto identifica, não tinha como objetivo nomear todos os personagens do AT, e de maneira alguma ele seleciona com base em critérios meritórios, pois nem os melhores dos melhores dos que são citados são dignos de estarem ali, pois todos, indistintamente, pecaram de maneira que não há um justo sequer. Portanto, se fosse por méritos próprios nenhum nome poderia ou deveria ser mencionado.

Qual Critério o Escritor Utiliza?

O que o autor de Hebreus deseja e revela com muita clareza é que o único mérito pelo qual essas pessoas e cada um de nós são incluídos na Galeria da Fé é única e exclusivamente a GRAÇA DE DEUS. Uso letras maiúsculas para chamar atenção do leitor para este fato fundamental. Nem Moisés ou Abraão, nem Sara ou Raabe são aqui mencionados por méritos próprios, mas somente por causa do amor imensurável de um Deus maravilhosamente gracioso.

Um dos maiores equívocos que os leitores bíblicos crentes (porque há muitos não crentes que a leem), é de transformar, por livre vontade, estes personagens em super-heróis, mas na verdade eles são tão somente homens e mulheres pecadores que foram alcançados pela graça e capacitados pelo poder que emana de Deus, para realizarem o que realizaram.

Não desejo com essas breves e pobres palavras introdutórias minimizar ou diminuir tais personagens, mas unicamente colocá-los em seus devidos lugares de seres humanos, limitados e falhos, que foram incluídos, pela graça, no propósito redentor de Deus para todos nós.

Esta Galeria se constitui na verdade em um espelho de todos os crentes em todas as épocas e lugares. Todo aquele que foi alcançado pela graça do Pai, lavado pelo sangue remidor do Filho e vivificado pelo Espírito Santo, está ali representado. Alguns dentre nós terão um papel mais contundente e outros papeis de menor expressão no plano redentor de Deus, mas assim como eles, cada um de nós somos feitos preciosos aos olhos de Deus e instrumentos indispensáveis no desenvolvimento de Seu propósito Eterno. Assim como Jonas e Pedro nenhum de nós somos dispensáveis em decorrência de nossos erros e falta de fé, pois é Deus quem nos chama, capacita e nos usa paraa o louvor de Sua glória. Amém!

Um dos objetivos desta série de artigos é destacar os nomes que foram nominados nesta Galeria de Deus, e possibilitar um aprendizado com os acertos e erros destes irmãos do passado, de maneira que possamos imitar seus acertos e evitarmos seus erros. É desta forma que crescemos na graça e no conhecimento e alcançamos a estatura perfeita de Cristo Jesus.

Me. Rev. Ivan P. Guedes

Esta epístola é escrita na forma "paranética" ou "hortatória", indicando que o objetivo principal do escritor é a de exortar, encorajar ou orientar/ensinar, seus leitores. Visando alcançar seu objetivo primário, opta por fazê-lo de forma ilustrativa, destacando então a lista com nomes históricos conhecidos dos leitores originais (e daqueles que leem os textos veterotestamentários).

Ele inicia o texto definindo o que é a fé cristã (há vários outros tipos de fé) e depois ele oferece uma variada galeria de homens e mulheres que de alguma forma (como Sansão, Ló) manifestam está fé. O primeiro nome mencionado é o de Abel, o segundo filho gerado por Adão e Eva. Equivocadamente, o primeiro casal coloca suas esperanças no primeiro filho – Caim. Mas para decepção deles as atitudes de Caim foram lamentáveis, culminando com o assassinato de seu próprio irmão Abel. Aqui temos uma lição primária – cuidado onde colocamos nossas esperanças!

Mas o modelo não é Caim, e sim Abel seu contraponto, portanto, aprendamos com ele. Que agrade ao Espírito da Verdade nos ensinar os princípios aqui estabelecidos através da vida de Abel.

Hebreus 11.4 - Pela fé Abel ofereceu a Deus um sacrifício melhor do que Caim, pelo qual obteve testemunho de que era justo, testificando Deus dos seus dons, e pela fé, estando morto, ainda assim fala.

Este verso tem sido motivo de ampla e interminável debate, mas creio que não precisa ser deste modo. Aqui temos elementos que são vitais - o tipo de oferta e o tipo de ofertante, podemos assim dizer. Aqui devemos nos lembrar de que a revelação de Deus é progressiva e de que estamos nos primórdios da desconexão do ser humano de Deus provocada pelo pecado. Portanto, não temos quaisquer registros de uma especificação do que e do como se deveria prestar culto a Deus. Podemos advogar que o tipo de oferta era determinante, mas isso fica muito mais no campo interpretativo, do que efetivo. No primeiro caso parte-se da premissa de que Deus havia revelado a Adão e seus descendentes que a única maneira de se aproximar Dele deveria ser feito por meio de um sacrifício de sangue. Entretanto, falta embasamento bíblico textual antecedente onde podemos explicitamente fundamentá-la, ainda que não seja em hipótese alguma improvável que possa ter sido desta forma.

Mas creio que o ponto central do escritor de Hebreus seja destacar aqui o tipo de ofertante, visto que ele já havia tratado anteriormente do tipo de oferta agradável a Deus e que satisfaz sua perfeita justiça, demonstrando abundantemente de que os sacrifícios veterotestamentários apontavam exclusivamente para o sacrifício suficiente e eficiente de Jesus Cristo.

Aqui em Hebreus 11.4 lemos que Abel ofereceu pela . O próprio escritor de Hebreus havia declarado de que para se aproximar de Deus é necessário fé/crer que ele não somente existe, mas que se relaciona com aqueles que Nele creem. Nada sabemos sobre a motivação ou razão pela qual Caim resolveu sacrificar ao Senhor, mas o texto é muito claro em demonstrar que a razão pela qual Abel oferece seu sacrifício é porque depositava sua fé/confiança em Deus e desta forma deseja expressar seu desejo de se relacionar com Ele.

O escritor deixa claro de que a justiça e/ou justificação de Abel é decorrente do fato de que ele creu, e não em decorrência do tipo de oferta que ele apresentou. O ap. Paulo concorda plenamente ao declarar que “o justo é justificado [salvo] pela fé” (Rm 1.17; Gl 3.11; cf. Hc 2.4) e jamais, em hipótese alguma pelas obras/pelas ofertas apresentadas. Ao afirmar que Abel apresenta uma "oferta melhor" era decorrente de sua fé, em perfeita harmonia com o arrependimento, onde reconhece seus pecados e recorre à misericórdia e graça perdoadora de Deus.

É significativo, portanto, que a escolha do escritor tenha sido a de nomear Abel como o primeiro exemplo desta Galeria, tendo em vista que sua salvação é decorrente da , implicando que, o escritor e seus leitores, assim como nós, somente seremos salvos mediante a e não pelo que podemos vir a oferecer a Deus. Parafraseando Paulo...ainda que pudesse oferecer o mundo inteiro a Deus, se não tiver fé de nada valeria. Pela Abel ofereceu a Deus um sacrifício mais excelente do que Caim. O que tornou o sacrifício dele aceitável não foi sua quantidade, mas sua qualidade.

Mas alguém pode perguntar: o que é essa fé? No contexto bíblico , do grego “pistis”, é sinônimo de crer ou confiar e em sua conexão com Deus, é a convicção de que Deus existe e é o Criador e Governante de todas as coisas, bem como o Provedor e Doador da salvação eterna por meio de Cristo. Mais ainda, a fé bíblico-cristã se relaciona com Jesus Cristo, de que Ele é o Messias, do qual fala toda literatura veterotestamentária e que se revelou plenamente Nele, por meio de quem obtemos a salvação eterna e somos permitidos a adentrarmos no Reino dos Céus. Resumidamente – a nossa salvação é por Cristo e em Cristo somente.

Abel (cf. Gên 4.2, 4, 8, 9, 25, Mt 23.35, Lc 11.51, He 11.4, He 12.24) o nome hebraico significa “fôlego, vapor/brisa”, indicando a brevidade de sua vida e um representativo da própria vida humana decaída, mais especificamente pós diluvio (cf Tg 4.14, Sl 37.2, 90.5; 92.7, Is 40.6, 7, 8, 1Pe 1.24). Neste aspecto Abel nos representa em grau, gênero e número, pois a nossa vida não passa de um breve pensamento e nossos dias passam velozmente.

O escritor declara que Abel ofereceu um “sacrifício melhor - mais excelente”. Observemos que no sistema sacrificial estabelecido por Deus, todo sacrifício deveria fornecer um aroma perfumado e ser aceitável a Ele. Isto implica que o indivíduo deve fazer sua oferta com a atitude correta de coração, para ser agradável a Deus. 

A reação negativa e posteriormente violenta de Caim (He 11.16, cf. Gn 4.5) revelam em grau, gênero e número que seu coração estava muito distante de refletir sua oferta. Como todo religioso ele estava mais preocupado consigo mesmo (provavelmente de receber as “bençãos” de Deus), do que com a glória de Deus. As consequências posteriores dele, que levou ao assassinato de seu irmão, revelam sua resistência em se submeter a Deus. O religioso quer comprar o favor de Deus, mas rejeita o senhorio de Deus sobre sua vida. Como tão bem declara o Dietrich Bonhoeffer[1] barateamos (vulgarizamos, desvalorizamos) a graça maravilhosa de Jesus, e o fazemos todas as vezes que rejeitamos aberta ou veladamente a soberania de Deus sobre nossa história.

Resumindo, sua oferta foi rejeitada por causa de seu coração orgulhoso e uma atitude autossuficiente. O que se harmoniza com o contexto da epistola, onde o escritor repetidamente adverte seus leitores (e a nós) contra possuir “um coração mau de incredulidade”.

Um contraponto aqui foi a rejeição da parte de Deus dos milhares de sacrifícios oferecidos pelos israelitas nos dias do profeta Isaias, leiamos as palavras de Deus através de Seu profeta: “Esse povo oferece culto a mim com a boca e me louva com os lábios, mas o seu coração está longe de mim” (29.13). Portanto, continua Deus, estou enojado desse comportamento hipócrita e rejeito toda e quaisquer ofertas deles. De maneira que se assemelham aos moradores de Sodoma e Gomorra, ao final receberão, não as bênçãos, mas a Minha ira e o Meu juízo sobre eles.

A questão aqui envolvendo Abel e Caim tem implicações muito mais profundas do que apenas dois irmãos e duas forma de adorar a Deus. É uma questão de vida e morte, de salvação e condenação eterna. E o mais terrível é que nos assemelhamos a um ou ao outro – jamais a ambos.

Uma das frases mais contundentes na bíblia está relacionada à vida de Abel, mais propriamente à sua fé: embora ele esteja morto, ele ainda fala.

E o mais impressionante ainda é que não temos uma única palavra pronunciada pela boca de Abel registrada nas Escrituras (o que nos arremete à vida de lazaro o qual igualmente não temos uma única palavra dele, todavia a sua ressurreição pelo poder vivificador de Cristo ainda impacta nossas vidas).

Vivemos em uma época em que todos falam o tempo todo, sobre qualquer coisa e até sobre nada, pois o importante é falar...Abel e Lazaro se contrapõem a essa pressão midiática. Eles falaram e continuaram a falar mesmo depois de mortos. O maior sermão que podemos pregar nesta Sociedade doente e doentia é aquele que vivenciamos em tudo que fazemos. O que está Sociedade corrupta e corruptora precisa ouvir são vidas transformadas pelo poder do Espírito Santo.

A pregação desconectada de uma vida nova, é como a semente caída à beira da estrada, entre espinheiros e pedregais – não produz vida, conversão. Somente a pregação/ensino ilustrado na vida cotidiana verdadeiramente germina e produz frutos em abundância.

Abel falava com sua vida! Suas ações obedientes e fiéis falavam tão alto que seu irmão Caim teve que calá-lo com a morte. Daniel e seus três amigos, mesmo vivendo em meio à depravação babilônica, falavam tão alto em seu compromisso com Deus, que impactaram Nabucodonosor e todos aqueles que conviviam com eles. Os três rapazes mesmo diante de toda pressão “legal” para que se curvassem diante da estatua do rei, mantiveram-se em pé. Suas poucas palavras apenas confirmaram sua fé exclusiva (jamais inclusiva) em Yahweh. Deus honrou os três jovens, como o fez com Daniel e antes havia feito com Abel.

Devemos pregar o Evangelho, como diz Paulo, a tempo e a fora de tempo – mas esse Evangelho pregado com a boca, deve ser amalgamado em tudo que fazemos em nossa vida diária. A luz não tem boca, mas quando resplandece é impossível não a ver e não a perceber. Em uma noite totalmente escura, um único fosforo, ainda que por breve segundos é visto por todos que estejam próximos. Um mínimo de sal em um alimento é sentido por todos os que dele comerem. Há uma frase extraordinária em relação aos mártires cristãos que eram lançados nas arenas romanas para serem trucidados pelos gladiares violentos e sanguinários ou por bestas feras famintas: “O sangue dos mártires foi a sementeira do Evangelho”.[2]   

Esta foi uma das razões pelas quais o escritor inicia sua Galeria com um exemplo contundente daqueles que não negam a sua fé. A perseguição contra os cristãos aumentava em intensidade (inicialmente por parte dos judeus), mas posteriormente o Cristianismo se tornara um problema do Império e leis cada vez mais contundentes serão produzidas nas sombras dos poderes constituídos (qualquer semelhança com a nossa realidade hoje não é mera coincidência). Ainda no primeiro século ser cristão tornou-se símbolo de martírio. Centenas e milhares serão mortos sem dó e sem piedade, pelo sistema corrupto alavancado pelas potestades infernais. Uns versos antes o escritor declara: "não somos dos que retrocedem para a destruição, mas dos que têm fé para a preservação da alma" (Hb 10.39). Certamente havia muitos cristãos que estavam sendo tentados a retornarem para a “segurança legal” do judaísmo, e um modelo de fé como apresentada por Abel certamente estimularia os cristãos a manterem a integridade de sua fé em Cristo Jesus, mesmo diante da sombra da morte, que pairava sobre suas vidas.

Por fim, Abel continua nos falando, pois a medida de nossa vida não é necessariamente o tempo de sua duração (pouco ou muito). Do ponto de vista humano a vida de Abel foi desperdiçada, pois ele morreu relativamente jovem (para os padrões da época).  Todavia, inumeráveis gerações têm olhado para sua fé e aprendido com ele a enfrentar as adversidades da vida e até mesmo a morte e ele e não seu irmão alcançou o verdadeiro sucesso.

Quando morrermos qual será a nossa mensagem para a família, amigos e demais que conviveram conosco e aqueles que nos conheceram?

 

Utilização livre desde que citando a fonte
Guedes, Ivan Pereira
Mestre em Ciências da Religião.
Universidade Presbiteriana Mackenzie
me.ivanguedes@gmail.com
Outro Blog
Historiologia Protestante
http://historiologiaprotestante.blogspot.com.br/

 

Artigos Relacionados

Gênesis Capítulo 1 – Verdades Fundamentais

https://reflexaoipg.blogspot.com/2022/02/genesis-capitulo-1-verdades-fundamentais_26.html?spref=tw

Síntese Bíblica – Gênesis

http://reflexaoipg.blogspot.com.br/2016/02/sintese-biblica-genesis.html

Abraão em Três Tempos: Judaísmo

http://reflexaoipg.blogspot.com.br/2016/09/abraao-em-tres-tempos-judaismo.html

Abraão em Três Tempos: Judaísmo

http://reflexaoipg.blogspot.com.br/2016/09/abraao-em-tres-tempos-judaismo.html

 



[1] Ele foi um teólogo e pastor luterano alemão, conhecido por sua resistência ao regime nazista e por suas contribuições teológicas significativas. Ele nasceu em 4 de fevereiro de 1906 em Breslau, Alemanha (atualmente Wrocław, Polônia), e foi executado em 9 de abril de 1945 no campo de concentração de Flossenbürg.

[2] Frase atribuída a Tertuliano, um dos primeiros escritores cristãos. Ele escreveu essa frase em sua obra "Apologético" (Apologeticum), especificamente no capítulo 50, versículo 13.


sábado, 1 de março de 2025

Salmo 10 - A Ilusão dos Planos dos Perversos e Corruptos


Muitos dos comentaristas compreendem que este Salmo está vinculado ou até mesmo fazia parte integrante do anterior. Ele parece ser uma amplificação do clamor do salmista (provavelmente o rei Davi), contra os ímpios/inimigos que se levantaram contra ele.

Em decorrência de que em alguns manuscritos antigos não haver um título específico para o Salmo 10, estudiosos concluem, talvez precipitadamente, de que ambos era um único Salmo, mas a discussão está longe de ser concluída. As nossas versões seguem a bíblia hebraica que os mantém independentes.

A diferença temática está em que enquanto no Salmo 9 os inimigos eram externos (outros povos); no Salmo 10 os inimigos são internos (israelitas explorando israelitas), qualquer semelhança com a realidade brasileira não é mera coincidência.

Uma vez mais o Salmista traça uma linha divisória muito clara entre os ímpios e os crentes (piedosos/justos).

IMPÍOS: Então ele passa a identificar características que descrevem tais pessoas - orgulho e arrogante [vv. 2, 3]; ateu [v. 4]; corrupto [v. 5]; enganador (mentiroso) e intrigante [vs 7, 8]; violento [v 9] e hipócrita (acusa os outros do que ele mesmo faz) [v 8].

JUSTOS: Passa então a descrever as características que devem ser encontradas na vida destes - tem um coração humilde; confia e depende da ação bondosa de Deus.

Mas o quadro diante dos olhos do salmista é tão terrível; a maldade é tão grande e a corrupção é tão descarada que o salmista clama a Deus:

POR QUE, SENHOR, Tu permaneces afastado na hora do sofrimento? POR QUE Te escondes de mim?

Há momentos em que olhamos e não vemos saída; parece que o mal vai vencer; parece que os ímpios estão certos e nós estamos errados....

Aqui temos duas questões que perturbam qualquer crente:

Onde está Deus quando coisas ruins acontecem com pessoas boas (v. 1)?

Onde está Deus quando pessoas más fazem coisas terríveis (vv. 2-11)?

Olhando pela perspectiva humana parece que os ímpios estão ganhando o jogo, e vai ser de goleada... mas o salmista não é um cético, ele continua crendo em Deus e no Seu poder, mesmo diante do quadro terrível que tem diante de seus olhos. Ele crê e continua crendo (mesmo contra a esperança como Abraão) que o seu Deus triunfará no final.

Ainda que o inimigo traiçoeiro, que distorce a verdade, que profere mentiras continuamente, e que ilude os que o ouvem – ainda que o inimigo vença algumas das batalhas, com certeza perderá a guerra. Na verdade já perderam, como tão bem declara o ap. Paulo: "Mas em todas estas coisas somos mais que vencedores, por meio daquele que nos amou" (Romanos 8.37).

Apesar de ter consciência da malignidade que o cerca, de assistir o cinismo das pessoas destituídas de caráter, o salmista não tem qualquer dúvida de que Deus está perto e está atento ao seu clamor – a sua oração...

As palavras contidas nos versos 14 e 15 expressão a fé e confiança plena do salmista: A verdade é que Tu vês muito bem quem sofre desgraça e tristeza e é explorado; Tu cuidas deles com muito carinho. Por isso, Senhor, o homem pobre e sem recursos confia absolutamente em Ti. Então ele completa seu pensamento:   Tu és conhecido como a esperança dos que perderam toda a esperança! Então ele clama: Ó Senhor, quebra o braço desses homens desligados de Ti, maus e perversos. Revela publicamente todos os seus pecados e castiga um por um!

O Salmista DECLARA em Alto e Bom Som:

VALE A PENA NOS ENTREGARMOS SEM RESERVAS A DEUS!

Deus é verdadeiramente amigo do crente, em seu desamparo e desespero, todo crente em todo lugar e época, pode deixar seu caso nas mãos de Deus, e Deus se compromete a cuidar dele.

Não colocamos nossas vidas nas mãos de um médico-advogado-político, por mais competentes que possam ser; mas depositamos nossas vidas presentes e futuras nas Mãos de um Deus que é Todo Poderoso – Eterno – Imutável – Amável – Compassivo – Misericordioso....

Quero concluir com o Testemunho de Daniel (capto 6)

Os inimigos de Daniel armaram uma armadilha mortal para ele: Afinal, o rei assinou o decreto que foi usado para acusarem e prenderem Daniel, que assim, foi jogado à cova dos leões. Antes de ser lançado às feras selvagens (dizem que era a mídia da época), o rei disse a Daniel: Eu espero que o seu Deus, a quem você sempre serve e adora, o salve dos leões. Em seguida ele foi jogado na cova das feras temíveis até pelos mais fortes e experientes gladiadores.

Seguindo o ritual da lei uma pesada pedra foi colocada na entrada da cova e o rei a marcou com o seu anel e selo real, de maneira que ninguém podia tirá-lo de lá. (Pausa)

Daniel orava 3 vezes por dia para isso?? Por que Senhor??

Então triste e abatido, pois gostava de Daniel, o rei voltou ao palácio. Perdeu o apetite e foi se deitar sem comer. Não quis se divertir ouvindo música, como de costume, com insônia sua noite foi longa e triste.

O sol nem ainda brilhava intensamente, o rei atravessa correndo o palácio em direção à cova dos leões e mesmo angustiado e tomado de tristeza, grita: "Daniel, servo do Deus Vivo, será que o seu Deus, a quem você adora, foi capaz de salvá-lo dos leões?”.

Então o silêncio é quebrado por uma voz tranquila e firme: "Majestade, eu lhe desejo uma vida longa e feliz!" Era Daniel! Era Daniel! Ó glória! Então ele dá o seu testemunho: "O meu Deus mandou o seu anjo, para fechar as bocas dos leões. Eles não me tocaram! Isso porque eu sou inocente diante de Deus: e diante do senhor também, rei Dário, eu não cometi crime algum".

O rei é tomado por uma alegria incontida! Imediatamente ordena que tirassem a pedra e resgatassem Daniel daquela cova vil. Constatou que de fato não havia o menor arranhão nele, porque tinha confiado no seu Deus.

A virada do jogo...o placar é alterado agora a favor de Daniel e contra seus inimigos traiçoeiros: Então o rei Dário deu uma nova ordem, para trazerem os homens que com maldade haviam acusado Daniel. Eles e suas famílias foram jogados na cova dos leões. E o texto diz que mesmo “antes que chegassem no fundo da cova, os leões se jogaram contra eles e todos foram destroçados”.

E nos dias que sucedem o rei Dário escreveu outra mensagem, que foi anunciada em todo o seu reino. "Paz para todos! Eu faço um novo decreto que em todo o domínio do meu reino os homens devem temer e tremer diante do Deus de Daniel; Pois ele é o Deus vivo e permanece para sempre, e o seu reino não será destruído, e o seu domínio será para sempre. "Ele livra, resgata e realiza sinais e maravilhas no céu e na terra, e foi Ele que Daniel do poder dos leões."

VAMOS ORAR!

 

Utilização livre desde que citando a fonte
Guedes, Ivan Pereira
Mestre em Ciências da Religião.
me.ivanguedes@gmail.com
Outro Blog
Historiologia Protestante


Artigos Relacionados

Classificação dos Salmos

https://reflexaoipg.blogspot.com/2017/06/classificacao-dos-salmos.html

Salmo 1

https://reflexaoipg.blogspot.com/2016/05/salmos-salmo-1.html?spref=tw

Salmo 2

https://reflexaoipg.blogspot.com/2016/06/salmos-salmo-2.html?spref=tw

Salmo 119 - Introdução Geral

https://reflexaoipg.blogspot.com/2018/03/salmo-119-introducao-geral.html?spref=tw

A Bondade de Deus - Salmo 136    

http://reflexaoipg.blogspot.com.br/2016/02/a-bondade-de-deus-salmo-136.html 

Salmo 23.1 - O Cuidado Pastoral de Deus

http://reflexaoipg.blogspot.com/2016/09/salmo-231-o-cuidado-pastoral-de-deus.html?spref=tw
Salmos: Anatomia da Alma

https://reflexaoipg.blogspot.com/2018/10/salmos-anatomia-da-alma.html

 


sábado, 22 de fevereiro de 2025

Ur - Cidade de Origem de Abraão


Ur é uma das cidades antigas mencionada na Bíblia. Ela ocupa um lugar significativo na narrativa do Primeiro Testamento, pois somos informados de que Abraão viveu ali (alguns entende até que ele nasceu ali). Ela é mencionada quatro vezes na literatura veterotestamentária sendo a última uma réplica (Gênesis 11.28, 11.31 e 15.7; citado por Neemias 9.7).

A cidade de Ur foi originalmente fundada pelos sumérios, e tornou-se um importante centro urbano na Mesopotâmia (“entre rios” pois ficava entre dois importantes rios da época o Eufrates e o Tigre). No transcorrer do 1º e mais acentuadamente 2º milênio a.C., os caldeus, um povo semita que migrou para a região sul da Mesopotâmia, dominaram a região. Desta forma, ao ser denominada “Ur dos Caldeus,” o texto bíblico está fazendo referência a essa fase mais tardia da cidade, quando já estava sob influência caldeia. Atualmente é a atual região do Iraque. A região da Caldéia contém riquezas além da imaginação, e Ur era uma das cidades mais importantes. Alguns historiadores concluem que esta região excedia a terra do Egito e suas pirâmides. É nela que o patriarca Abraão é chamado por Deus (Yahweh), estabelecendo uma Aliança com ele, através da qual formará a nação de Israel e através dela moldará a História.

Em Gênesis 11.18 a cidade de Ur é citada pela primeira vez: "Enquanto seu pai Terá ainda estava vivo, Harã [irmão de Abraão] morreu em Ur dos Caldeus, na terra de seu nascimento". A narrativa deixa entender de que esta cidade era o lugar onde a família residia inicialmente.

Esta cidade era próspera, conhecida por seus avanços na arquitetura, literatura e religião. Era também um lugar profundamente enraizado no culto pagão, ali foi encontrada uma estrutura impressionante chamada Zigurate de Ur, que era dedicada ao deus patrono de Ur, Nanna (também conhecido como Sin, o deus da lua). Esses detalhes realçam a necessidade de Abraão de sair do meio dela, conforme a ordem de Deus. É importante destacar que é Yahweh quem vem ao encontro de Abraão e não o contrário, de maneira que se Deus não o chamasse ele continuaria absorvido pela idolatria estabelecida.

Como todas as civilizações Ur também perdeu sua pujança e caiu em um longo período de ostracismo. Mas sempre permaneceu como referência religiosa pagã. Somente no reinado do rei Nabucodonosor II, a cidade foi revitalizada, e o último rei da Babilônia, Nabonido, também se interessou pela cidade quando aumentou o tamanho do zigurate. Ciro, o Grande, da Assíria vai mantê-la como centro religioso, pois em sua estratégia de conquista de outros povos ele percebeu que a melhor maneira de cativá-los era mostrando respeito aos seus deuses (o que ele vai fazer com os judeus, autorizando eles a retornarem para Jerusalém e reconstruírem o templo). A revitalização de Ur manteve-se pelos durante o reinado Persa de Artaxerxes II.

Avançando na leitura da narrativa bíblica em (Gênesis 11.31) temos o início da longa jornada que Abraão irá percorrer, na realização da vontade de Deus. Incialmente ele está acompanhado do pai e seu sobrinho Ló, filho do irmão falecido, bem como de Sarai sua esposa. A sua partida de Ur demarca uma ruptura com seu passado e o início de um novo capítulo onde Deus vai lhe revelando ao longo dos anos.

O propósito inicial era viajarem até Canaã, mas por razão que o texto bíblico não esclarece, eles pararam em Harã, permanecendo ali até que seu pai Terá falecesse, o que por implicação podemos inferir que ali ficaram devido alguma enfermidade do pai. Pois logo após o falecimento do pai, Deus ratifica o chamado de Abraão que vai prosseguir o itinerário original até se estabelecer na geografia de Canaã.

Muito interessante que os escritores bíblicos posteriores irão tratar Harã como ponto de partida de Abraão em direção à terra de Canaã. Estevão em sua argumentação e exposição no confronto com os religiosos judeus na sinagoga faz está citação: “Então ele [Abraão] saiu da terra dos caldeus [Ur] e habitou [no sentido de residir] em Harã. E dali, morto seu pai, mudou-o para esta terra em que agora habitais [Canaã/Judeia]" (Atos 7.4). A coerência textual se mantém, visto que Harã tornou-se lugar da "família" e a "casa de seu pai", mas ele prosseguiu dali em direção à terra que Deus haveria de mostrar-lhe.

Portanto, quando ele envia seu servo Eliezer (Gênesis 24.4 e ss) a buscar uma esposa para Isaque, que fosse de sua parentela (descendência de seu pai), não poderia tê-lo enviado se não para Harã (norte da Mesopotâmia), pois não havia mais parentes em Ur (ao sul). Da mesma forma, quando Josué faz referência geográfica de Abraão como tendo vindo de "além do Eufrates" (Josué 24.2), refere-se a Harã e não a UR, pois é a partir da primeira que o patriarca prosseguiu para Canaã. Portanto, ainda que os críticos de plantão (mormente racionalistas pós sec. XVIII), não encontram argumentos textuais contraditórios, a não ser distorcendo o sentido simples da narrativa bíblica.

Utilização livre desde que citando a fonte

Guedes, Ivan Pereira

Mestre em Ciências da Religião.

me.ivanguedes@gmail.com

Outro Blog

Historiologia Protestante

http://historiologiaprotestante.blogspot.com.br/


 

Artigos Relacionados

Geografia Bíblica: Casa Israelita Antiga (Geografia Bíblica)

https://reflexaoipg.blogspot.com/2018/10/casa-israelita-antiga-geografia-biblica.html?spref=tw
Geografia Bíblica: Os Nomes da Palestina

https://reflexaoipg.blogspot.com/2017/12/geografia-biblica-os-nomes-da-palestina.html
A Cosmologia Hebraica

http://reflexaoipg.blogspot.com.br/2016/11/a-cosmologia-hebraica-1.html
Civilizações do Mundo Bíblico - Introdução Geral

http://reflexaoipg.blogspot.com.br/2016/10/geografia-das-civilizacoes-do-mundo.html

Efraim - Civilizações do Mundo Bíblico

http://reflexaoipg.blogspot.com/2016/09/efraim.html?spref=tw

Edom – Civilizações do Mundo Bíblico

http://reflexaoipg.blogspot.com/2016/09/edom-idumeia.html?spref=tw

Sumerianos – Civilizações do Mundo Bíblico

http://reflexaoipg.blogspot.com.br/2016/03/sumerianos-povos-relacionados-historia.html

Acadianos – Civilizações do Mundo Bíblico

http://reflexaoipg.blogspot.com.br/2016/03/acadianos-povos-relacionados-historia.html

Referências Bibliográficas

ADAMS, J. McKee. A Bíblia e as civilizações antigas. Rio de Janeiro: Dois Irmãos, 1962.

ARCHER JR., G. L. Merece Confiança o Antigo Testamento? 3. ed. São Paulo, SP: Sociedade Religiosa Edições Vida Nova, 2008.

ARNOLD, Bill T. e HESS, Richard. S. História do antigo Israel: Uma introdução ao tema e às fontes. Tradução Sonia Ribeiro Alves e Soraya Imon de Oliveira. Rio de Janeiro: Editora Central Gospel, 2020.

BRIGHT, John. História de Israel. Tradução Euclides Carneiro da Silva. São Paulo: Ed. Paulinas, 1978.

CHAMPLIN, Russell Norman. Enciclopédia de bíblia, teologia e filosofia. São Paulo: Hagnos, 2006 [1991].

FOHRER, G. História da Religião de Israel. São Paulo, SP: Academia Cristã, 2006.

MONEY, Netta Kemp de. Geografia Histórica do Mundo Bíblico. São Paulo, SP: Editora Vida.

RIVER, Charles (Editors). Ur: História e Legado da Antiga Capital Suméria.  2017.

THOMPSON, John Arthur. A bíblia e a arqueologia – quando a ciência descobre a fé. São Paulo, SP: Editora Vida Cristã, 2004.
TIDWELL, J. B. & PIERSON, Carlos C. La geografia bíblica. Espanha: Editorial Mundo Hispano, 2003.
UNGER, Merril F. Arqueologia do Velho Testamento. São Paulo: Batista Regular, 1980.