terça-feira, 17 de setembro de 2019

Eliseu o Profeta Abençoador



“Diga-me, peço-te, todas as grandes coisas que Eliseu fez” (2 Reis 8.4).
[Heb ˒ĕl šā˓ אֱלִּישָע]
            Apesar dos feitos extraordinários realizados pelo profeta Eliseu ele continua à sombra de seu mentor, o profeta Elias, o qual veio a suceder. Essa pequena série iniciada tem propósito apenas resgatar o papel relevante que esse profeta exerceu na história israelita e sua significação para a história neotestamentária que haveria de ser escrita. Encontrarmos os links da vida e ministério de Eliseu e a vida e ministério de Jesus nos fascinam e concomitantemente nos revelam a unicidade das narrativas bíblicas.
Elias e Eliseu
Os ministérios de Elias e Eliseu, perpassando os reinados de Acabe, Acazias e Jeorão (850-800 AEC), demarcam o momento em que as atividades proféticas começaram a se manifestarem mais intensamente no palco da história israelita. Até aqui os protagonistas foram os sacerdotes, cujo apogeu foi a vida de Samuel e os reis com inicio frustrante de Saul, o apogeu com o reinado de Davi e a decadência (moral e espiritual) de Salomão. Nesse período os profetas aparecem esporadicamente e suas atividades são rápidas e ligadas diretamente ao trono e seus ocupantes.
Mas com Elias e Eliseu inicia-se um período de intensidade crescente da participação efetiva dos profetas no direcionamento histórico, das agora duas nações, Israel e Judá. A partir dos ministérios desses dois servos de Deus a boca profética não mais se calará e suas mensagens ferirão os ouvidos sensíveis de reis e sacerdotes corruptos que não mediram esforços para calá-los, mesmo que para isso tenham que mata-los. O profeta Jeremias passa a maior parte do tempo de seu longo ministério de 40 anos preso e muitas vezes jogado em um poço coberto de lama, mas como fizera com Elias, Deus providencio o seu sustento e o livrou da morte certa.
Elias e posteriormente Eliseu foram a pedra na sandália da dinastia de Onri. Apesar deste rei ocupar apenas alguns poucos capítulos nas páginas bíblicas do Primeiro Testamento, seu reinado foi longo e o reino de Israel (Norte) alcançou um apogeu politico econômico poucas vezes igualado, mas também poucos reinados produziram uma corrupção religiosa tão profunda quanto de Onri e seus descendentes: “E fez Acabe, filho de Onri, o que era mau aos olhos do Senhor, mais do que todos os que o antecederam. E, como se fosse pouco andar nos pecados de Jeroboão, filho de Nebate, ainda tomou por mulher a Jezabel, filha de Etbaal, rei dos sidônios, e foi e serviu a Baal, e o adorou” (1 Reis 16.30-31). Foi durante o reinado de Acabe que Hiel, o betelita, afrontou ao Senhor e reconstruiu a cidade de Jericó, ao qual Josué havia declarado com imprecação de maldição sobre aqueles que reedificassem a referida cidade canaanita (Josué 6.25). E essa imprecação se cumpre literalmente: Quando lançou os seus alicerces, morreu-lhe Abirão, seu primogênito e quando colocou as suas portas, morreu-lhe Segube, seu filho mais moço conforme a palavra do Senhor, que ele falara por intermédio de Josué, filho de Num” (1 Reis 16.34). Acabe e seu reinado é uma afronta aberta contra Deus, seu orgulho e prevaricação contra a Lei de Deus nos faz lembrar os governantes atuais que se acham donos e senhores de si mesmos.
Foi justamente durante esse ato abominável de Hiel que o profeta Elias será chamado para exercer seu ministério árduo (1 Reis 16.34; 17.1). Elias é cheio do poder do Espírito Santo e sua pregação e ministério é independente do templo e do trono. Assim também o será Eliseu, que receberá porção dobra do poder do Espírito Santo, e a mão do Senhor o usará de forma totalmente autônoma em relação às lideranças religiosas ou políticas. Essa será sempre a marca distintiva de todos os demais profetas que virão após eles.
Mesmo nos dias mais escuros e tenebrosos da história de Israel/Judá e posteriormente da Igreja, quando a retidão parece que vai sucumbir diante da depravação e do mal, Deus sempre levantou seus profetas, pois o deserto humano e o celeiro de Deus (Mateus 14.15-21).
Apesar de Elias e Eliseu compartilharem muitas coisas em comum, podemos distingui-los nos detalhes e particularidades de cada um. Elias exercerá um ministério de juízo, mais combativo e não se deterá mesmo quando tiver que liderar a matança dos profetas de Baal ao fio da espada. O ministério de Eliseu será marcado pela manifestação da graça em favor da vida de outros. Mas essas diferenças apenas realçam seu papel de protótipos de Jesus Cristo. Assim como Elias o Senhor Jesus afronta e contesta o mal em todas as suas formas, e por esta razão é perseguido e morto. Mas como Eliseu o senhor Jesus manifesta sua graça salvadora a todas as pessoas indistintamente, fosse judeu ou estrangeiro, pobres ou ricos, homens ou mulheres. A tristeza e a rejeição de Elias pelo mundo terminam com seu arrebatamento para o céu; o ministério poderoso de Eliseu o faz resistir diante de todos os poderosos e o sustenta em honra e triunfo nesta terra. Elias e Eliseu prenunciam as características celestes e terrenas do Senhor Jesus Cristo, o Filho de Deus e Senhor sobre todos os reis da terra.
            Vai ser fascinante examinarmos calmamente a história do profeta Eliseu. Apercebermo-nos dos detalhes e nuances de seu ministério. Contemplarmos como um profeta mantem sua postura inabalável mesmo diante das opressões dos inimigos que desejam destruir sua vida. Vermos a ação graciosa e misericordiosa de Deus sendo manifestada através da vida de Eliseu e alcançando a vida de tantas pessoas indistintamente.
            Da mesma forma o mesmo Espírito que levantou, capacitou e sustentou Elias, Eliseu e todos os profetas, continua a levantar, capacitar e sustentar homens e mulheres para serem testemunhas e pregadores do Evangelho do juízo e da graça. Paulo ensina que somos um perfume agradável para os que creem, mas cheiro de morte (juízo) para os que rejeitam a mensagem da graça salvadora. Todo cristão verdadeiro é Elias e Eliseu.

Utilização livre desde que citando a fonte
Guedes, Ivan Pereira
Mestre em Ciências da Religião.
me.ivanguedes@gmail.com
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