quinta-feira, 14 de fevereiro de 2019

Viajando no livro de Atos: Aguardando e Recordando em Jerusalém (1.12-14)



            Obedecendo as orientações de Jesus antes de ascender aos céus, os discípulos permanecem em Jerusalém. Enquanto aguardam tomam a decisão de recompor o núcleo apostólico, visto que Judas o que traiu Jesus havia suicidado. Após um período de oração a escolha recaiu sobre Matias. Então, Lucas o nosso guia nesta viagem nos convida para fazer uma turnê pela cidade de Jerusalém e recordarmos um pouco dos últimos dias de Jesus na cidade.
            Desde sua conquista por Davi (1.000 a.C.) a cidade de Jerusalém adquiriu um lugar especial no coração dos judeus que a denominavam de “cidade da paz”, “cidade sagrada” e “Sião”. Ela fora uma cidade jebusita, encravada nas montanhas da Judéia e no entroncamento entre o norte e o sul do território israelita, de maneira que Davi com sua aguçada visão de liderança a transformou no centro político e religioso unificando definitivamente a Nação. De imediato ele providenciou que a Arca da Aliança (2Sm 6) fosse levada para Jerusalém e depois deixou o projeto e os materiais necessários para a construção do Templo (1Rs 8), que foi erigido por seu filho e sucessor Salomão. A cidade de Jerusalém e o Templo passaram a ser o ponto convergente de toda a História israelita/judaica e será nela que se cumpriram as profecias messiânicas que acalentaram por séculos os corações e a fé piedosa de homens e mulheres como Simeão e Ana.
            A cidade de Jerusalém foi enaltecida em versos e prosas na literatura do Primeiro Testamento (Sl 48.1-3, 12-13; 87.1-2; 122.1-3, 6-7; 137.5-6). Mas apesar dela ser tão amada os escritores bíblicos tinham plena consciência de que nela havia a maldade e a intriga (Sl 55.9-11). O próprio Jesus quando de sua última visita à cidade – chora – “Jerusalém, Jerusalém, que matas os profetas, e apedrejas os que a ti são enviados! Quantas vezes quis eu ajuntar os teus filhos, como a galinha ajunta a sua ninhada debaixo das asas, e não quiseste!” (Lc 13.34). E de fato a maldade se manifestara da forma mais cruel na morte do próprio Jesus.
            Nos dias dos acontecimentos evangélicos a cidade de Jerusalém tinha uma população fixa de aproximadamente 40 mil pessoas, mas que durante as grandes festas do calendário judaico chegavam a 500 mil pessoas que por suas ruas apertadas e vielas transitavam freneticamente.
     
Nos dias do déspota Herodes, o Grande, a cidade e o Templo passaram por uma intensa transformação e expansão. Milhares de pessoas passaram a trabalhar nessas obras e a dependerem desse salário. O preço social é que aos arredores da cidade foram surgindo guetos, que posteriormente, na medida em que as obras foram cessando se transformaram em lugares de extrema pobreza e carência[1].
            Jesus percorreu em diversas ocasiões as ruas apertadas e apinhadas de gente de Jerusalém. Certa vez ele caminhando “em Jerusalém, perto do Portão das Ovelhas” (lado norte do Templo), foi até um tanque de água chamada “Betesda[2], rodeada por cinco colunas” (Jo 5.2) e ali curou um homem paralitico a 38 anos.
           
Caminhando pelas ruas da cidade Lucas nos mostra os lugares em que Jesus esteve em sua última semana. O primeiro lugar é o Cenáculo (sala de jantar) onde o Mestre tomou a última refeição da Páscoa[3] com seus discípulos e também estabeleceu a primeira Ceia cristã (Lc 22.7-8, 10-15, 19-20).
           
Após a refeição pascoal, por volta das 23hs Jesus e seus discípulos passam pelo Portão de Siloé (onde Jesus curara um cego – Jo 9.7), descem para o Vale do Cedrom e chegam até o Jardim do Getsemani em um percurso de no máximo 30 minutos, mas que naquela noite parecia ser uma eternidade, tal a tensão que pairava no ar. É nesse Jardim que Jesus se prepara em oração para os acontecimentos violentos que haveriam de ocorrer algumas horas depois, onde as autoridades religiosas judaicas, comungadas com Judas Iscariotes, o prenderiam e não descansariam até vê-lo morto na cruz.

            Uma vez preso pela guarda do Templo, Jesus é levado à casa do Sumo Sacerdote Caifás, que ficava na parte nobre da cidade, também chamada de cidade alta (Jo 18.12-14). É nas sombras da madrugada (qualquer semelhança com o STF não é mera coincidência) que Caifás e outros membros do Sinédrio elaboram o processo contra Jesus.

Então eles o levam até a presença da autoridade romana – Pôncio Pilatos – que estava alojado provavelmente no palácio de Herodes[4] e que não ficava muito distante da casa do Sumo Sacerdote. Pilatos dificulta a vida dos algozes de Jesus e posterga ao máximo qualquer condenação (Jo 18.29-19.4). Os judeus tiveram que incluir outras acusações contra Jesus além da questão religiosa (blasfêmia) e o acusaram de revolucionário (Lc 23.5). Pilatos conhecia muito bem o caráter de Caifás e seus aliados do Sinédrio, tinha quase certeza de estavam mentindo motivados pela inveja da popularidade de Jesus (Mc 15.10). Todavia, sua carreira política estava em jogo e dirige-se à cadeira de juiz, em local conhecido como o Pavimento (Gabatá) e ali sentencia Jesus ao açoite e à crucificação (Jo 19.13).
           
Após ser cruelmente açoitado Jesus é conduzido pela guarda romana saindo pelo Portão dos Jardins (Gennath), na esquina noroeste das muralhas da cidade – esse caminho passou a ser chamado de via dolorasa. No trajeto Jesus perde as forças e os guardas obrigam um homem, Simão, o Cirineu (Mc 15.21) para ajudar a carregar a cruz até o local da execução. Mal sabiam as autoridades religiosas e o próprio povo que ali a tudo assistiam que eles também estavam por percorrer a via dolorasa – quando os exércitos romanos haveriam de invadir e destruir totalmente a cidade de Jerusalém e o seu belíssimo Templo. Ao rejeitarem seu verdadeiro rei a cidade de Jerusalém decreta sua própria condenação. Assim será com todos aqueles que rejeitam a Jesus Cristo – condenam a si mesmos.

“Havia um monte verde ao longe, além da muralha da cidade, onde nosso querido Senhor foi crucificado e morreu para salvar todos nós”
(Cecil Alexander).
            Finalmente Jesus chega ao Gólgota (Monte da Caveira) onde seria crucificado. Essa era uma forma cruel de matar os inimigos do Império ou escravos fugitivos. No ano 4 a.C. em decorrência de uma revolta judaica 2 mil pessoas foram crucificadas[5] – tornando as palavras de Jesus “cada um carregue a sua cruz” muito mais intensa. Para a mentalidade judaica a morte na cruz era sinal de maldição divina (Dt 23.34).

Ao balbuciar suas últimas palavras “Pai, em tuas mãos entrego meu espírito” (Lc 23.46) Jesus morre e seu corpo é imediatamente retirado da cruz, pois o sol se pondo seria sábado e não poderia mais ser retirado. Um homem chamado José de Arimatéia (vila acerca de 8 km a noroeste de Jerusalém) oferece um de seus túmulos para que o corpo de Jesus fosse depositado e posteriormente embalsamado (Lc 23.51, 55).

Parece que tudo havia terminado e os dois discípulos de Emaús (lc 24.13-35) é um exemplo da tristeza e decepção que se abateu sobre todos os discípulos de Jesus. Mas no alvorecer do Domingo (primeiro dia da Semana) quando algumas mulheres tomadas pela dor e sofrimento foram ao tumulo para prestarem suas últimas homenagens ao amado Mestre, eis que para surpresa delas o tumulo estava vazio – Jesus havia ressuscitado!!

É justamente pelo fato de que Jesus ressuscitou que sua história não termina na narrativa evangélica e Lucas precisou escrever um segundo volume, narrando a continuidade dessa História que haverá de transpor a região da Judéia, Samaria e alcançara em poucos anos todo o Império Romano e posteriormente o mundo inteiro.

E convido você a juntos seguirmos o roteiro de Lucas e percorrermos toda esta trajetória até chegarmos na cidade de Roma a capital do Império. Venha!!


Utilização livre desde que citando a fonte
Guedes, Ivan Pereira
Mestre em Ciências da Religião.
Universidade Presbiteriana Mackenzie
me.ivanguedes@gmail.com
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Referências Bibliográficas
BAXTER, J. Sidlow. Examinai as Escrituras, v. 6. São Paulo: Vida Nova, 1989.
CHAMPLIN, R. N. Enciclopédia de Bíblia, Teologia e Filosofia. São Paulo: Hagnos, 8ª ed., 2006.
ELWELL, Walter A. e YARBROUGH, Robert W. Descobrindo o Novo Testamento – uma perspectiva histórica e teológica. Tradução Lúcia Kerr Jóia. São Paulo, Cultura Cristã, 2002.
ERDMAN, Charles R. Hechos de Los Apóstoles. Ed. TELL, 1974.
JEREMIAS, Joachim. Jerusalém no tempo de Jesus – pesquisa de história econômico-social no period neotestamentário. Tradução M. Cecília de M. Duprat. Santo André (SP), Academia Cristã; São Paulo, Paulus, 2010.
RYRIE, Charles C. Bíblia de estúdio Ryrie. Chicago (Illinois): Moody Press, 1991.
SMITH, T. C. Comentário Bíblico Broadman, v.10. Rio de Janeiro: JUERP, 1984.
WALKER, Peter. Pelos caminhos de Jesus – guia ecumênico de jornada à Terra Santa. Tradução Andréa Mariz. São Paulo, Edições Rosari, 2007.  
WILLIAMS, David J. Novo Comentário Bíblico Contemporâneo – Atos. São Paulo: Vida, 1996.
UNGER, Merrill Frederick. Manual bíblico Unger. Tradução Eduardo Pereira e Ferreira, Lucy Yamakami. São Paulo, Vida Nova, 2006.



[1] Provavelmente ficavam no Vale do Tiropeão.
[2] Esse foi um dos lugares reformados por Herodes e suas águas passaram a ser tidas como curativas (semelhante ao culto de Asclépio, conforme pratica em outras partes do Império Romano).
[3] A Páscoa (Pessach) e celebrada no décimo quinto dia de Nisan (final de março e inicio de abril) dando inicio a Festa dos Pães Ázimos. Era um dos três maiores festivais do calendário religioso judeu do século I. Suas concorrentes eram a Festa das Semanas (Pentecostes – acontecia no fim de maio); a Festa dos Tabernáculos (acontecia em outubro).
[4] Alguns estudiosos defendem que Pilatos estaria na Fortaleza Antônia, junto com a guarnição romana.
[5] Ao menos outras duas revoltas foram causadoras de novas atrocidades – 70 d.C. e também em 134 d.C.

Um comentário:

  1. Na verdade O Senhor Jesus fez o curso da minha Salvaçao a cruz era os meus pecados ELE os deixou cravados nessa , Gloriosa , cruz.AMEM

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