Temos
duas mulheres chamadas Abigail conhecidas na família de Davi, cada uma
desempenhando papéis importantes na história bíblica. A esposa de Nabal que
estamos abordando e uma irmã do próprio Davi.
Abigail,
esposa de Nabal
Ela
aparece pela primeira vez na narrativa de 1 Samuel 25 onde é apresentada como a
esposa de Nabal, um homem rico, mas arrogante e tolo. A palavra hebraica
nabal indica mais do que um
"simplório inofensivo, mas indica alguém que é radicalmente materialista e
egocêntrico. Em contraste o nome da esposa, Abigail (אֲבִיגַיִל em hebraico),
significa "alegria de meu pai" ou "fonte de alegria".
Desta forma os nomes, dentro desta estrutura literária, revelam muito mais do
que uma superficial leitura da história sugere.
Davi
está naquele período de andarilho (1 Samuel 25) entre a perseguição implacável
do rei Saul (1 Samuel 24) e a morte posterior do rei (1 Samuel 26-31). Por
algum tempo ele esteve acampado no monte Carmelo e ali conviveu pacificamente
com os pastores que cuidavam dos rebanhos de Nabal, inclusive os preservando de
ataques de bandidos ou invasores.
Mas Davi
não está mais naquela região e com a aproximação da festa da Páscoa, ele envia
um pequeno grupo de homens para solicitar educada e gentilmente que Nabal
pudesse ceder alguns animais (lembrando que Nabal possui enormes rebanhos) para
que Davi e seus homens pudessem igualmente celebrarem a Páscoa e se alimentarem
(lembrando um pouco dos discípulos enviados por Jesus para os preparativos da
última Ceia).
Mas
Nabal, ainda que fosse descendente da tribo de Calebe, não apenas recusou a
solicitação de Davi, como escarneceu dele e o desafiou: quem pensa que é
esse Davi, um fugitivo do rei Saul. Da boca do insensato/tolo não saem
palavras construtivas (Pv 17.7). Os mensageiros enviados por Davi retornam e
narram as palavras de Nabal, o que ascendeu a ira e indignação de Davi, que
marcha imediatamente para confrontar e demonstrar a Nabal quem era ele.
É
neste contexto de pré-guerra e eminente massacre, que vai resplandecer o
caráter e sabedoria da então esposa dele – Abigail.
Abigail
vai ao Encontro de Davi
Ao
tomar conhecimento das atitudes impensadas do marido, uma característica
natural dele, Abigail, tendo consciência do grande perigo iminente, age
rapidamente. De imediato prepara um generoso banquete, do que tinha de melhor
em casa, bem como muitos suprimentos e sai com seus servos ao encontro de Davi.
Ao encontrá-lo com seus soldados prontos para a confrontação, antes de qualquer
coisa ela se humilha e apela para a misericórdia de Davi. Ela o lembra de seu chamado divino e da importância
de evitar derramamento de sangue desnecessário. Seu discurso, marcado pela
humildade e sabedoria, convence Davi a abandonar seu plano de vingança. Mais do
que isso Davi a abençoa, por conseguinte, toda sua família. Aqui Abigail
vivencia o ensino de Provérbios de uma mulher cheia de sabedoria e do Espírito
de Deus “abre a boca para falar com sabedoria; a
instrução na fidelidade está na sua língua” (31.26).
Imaginemos
por alguns instantes uma igreja cujos membros são caracterizados pelas virtudes
reveladas aqui na pessoa de Abigail. Quantas desavenças, intrigas e rupturas
eclesiásticas não seria evitada. Quantas vidas não seriam preservadas e
abençoadas. Por outro lado, quantas vidas cristãs destruídas e arrebentadas por
atitudes como a de Nabal e reações de represálias, como as iniciais de Davi.
Os
argumentos de Abigail para mudar o rumo da prosa e ação de Davi foram simples e
diretos. O lembrou de seu chamado, de sua unção como futuro rei, das
prerrogativas que ele deveria cultivar ali e que deveriam nortear suas atitudes
quando assumisse o trono de Israel. Palavras de sabedoria, bom senso, sem
qualquer ranço de maldade ou segundas intenções.
Nabal
não era um bom marido. Na maioria das vezes rude e quantas vezes ela havia
visto suas reações, como está, iracundas e impensadas. Era, diferentemente da
esposa, destituído de sabedoria e bom sendo. Arrogante, prepotente e violento,
uma fórmula altamente explosiva e destrutiva. E sabendo disto tudo Abigail
interveio de maneira sutil, sem alarde, prudentemente, demonstrando ser uma
mulher com conhecimento e discernimento.
Esta
primeira parte da história nos coloca diante de três personagens que
podem refletir o que somos de fato e de verdade:
Nabal representa a nossa natureza humana decaída, centrada nas
ações e reações carnais. Ele é apresentado em relação às suas posses.
Abigail é o modelo positivo de um crente que se reveste com
o manto da sabedoria e humildade, que utiliza seu conhecimento para edificar
seu lar e abençoar sua família e as pessoas. Ela é apresentado em relação ao
seu caráter, o que implica que o que somos é mais importante do que qualquer
riqueza que venha a obter.
E Davi nos ensina, que mesmo os melhores
crentes, podem dar vazão à ira e indignação e correr o risco de transcender seu
chamado cristão para amar e perdoar. Mas Davi é um crente de verdade e ouvindo
as argumentações de Abigail repensa suas ações e em vez de amaldiçoar a vida
dela e dos demais, incluindo Nabal, torna-se um canal de bênção para eles.
A pergunta que precisamos fazer é: a quem nos
assemelharemos? Qual destes personagens nos representa de fato e de verdade?
O
casamento de Abigail com Davi (1 Samuel 25.39-42)
Mas
a história de Abigail não terminou ali. Deus que tudo acompanhou vai honrar
suas palavras e atitudes sábias.
Ao
contrário da esposa Nabal vai sofrer as consequências de suas palavras e ações.
Pouco tempo depois ele morreu e a narrativa deixa claro que foi um ato de juízo
da parte de Deus. Os poderosos e tolos deste mundo perecerão e tudo que
adquiriram, muitas vezes com terror, não lhes servira de absolutamente nada.
A
história de Abigail é registrada aqui para ilustrar que a sabedoria é mais
poderosa do que a grandeza e as riquezas, e é mais desejável. Nabal morre, mas
Abigail não apenas continua a viver, como é grandemente abençoada por Deus.
Davi
tomou conhecimento de que Abigail havia ficado viúva e casou-se com ela e deste
relacionamento conjugal vai nascer um filho chamado Quileabe (2 Samuel 33) ou
Daniel (1 Crônicas 3.1) com ele. Aqui temos ao menos dois detalhes interessante:
Primeiro, visto que a bênção da maternidade era altamente
considerada no antigo Israel, tanto que a falta de filhos era considerada uma
maldição (1 Samuel 1). Não se encontra registro de filhos do casamento de Nabal
e Abigail, de maneira que o narrador dá a entender que Abigail foi abençoada,
com a gestação, em seu relacionamento com Davi.
Segundo: que ao se casar com Abigail, Davi estabelece um
elo político relevante para os próximos anos em que terá que reinar sobre as
doze tribos, pois Abigail faz parte do clã calebita de Judá e será justamente
em Hebrom, capital do território calebita, que Davi será ungido rei.
Para
Reflexão
Viva com Sabedoria – todo crente é
desafiado a vivenciar a genuína sabedoria em todos os seus relacionamentos. A
começar no casamento no que tange o relacionamento conjugal e na criação e
condução dos filhos. Tiago em sua carta ensina de que se nos falta sabedoria,
podemos livremente pedir a Deus, que nos dará liberalmente.
Seja um Pacificador - o papel desta
mulher é o modelo do que como crentes devem ser. Ela interveio para evitar
conflitos, demonstrando o valor de se buscar a paz e a reconciliação, ainda que
tenha que se humilhar. Jesus disse que somos chamados para sermos pacificadores
e que quando agimos assim, somos bem-aventurados.
Confie em Deus Sempre – é impossível não visualizarmos a confiança
de Abigail na justiça de Deus e em Sua proteção, no transcorrer de toda a
narrativa. Apesar das atitudes tolas do marido, ela permanecesse confiando em
Deus e age de forma sábia (a tolice do outro não justifica a minha própria
tolice). A Sociedade vive tola e
loucamente, mas como cristãos somos chamados para vivermos na plena convicção
de que Deus sempre está no controle, independente das circunstâncias.
A Providência de Deus – como
facilmente nos esquecemos de que Deus sempre agirá providencialmente em todas e
quaisquer circunstâncias da nossa vida. Diferentemente de Abigail nossa
tendência é entrar em desespero como os discípulos, que forma posteriormente
repreendidos por Jesus: pessoas de pouca fé! Nesta narrativa em nenhum momento
vemos uma Abigail desesperada, mas calma e inteligentemente ela providencia uma
solução para o problema sério que surgiu. Assim como Deus usou a vida dela para
evitar que Davi pecasse, e preservou toda a sua família, Deus continua usando
pessoas, como eu e você, para abençoar e preservas vidas.
O Juízo de Deus – Assim como
podemos contemplar a graça e misericórdia de Deus sobre Abigail e o próprio
Davi, também podemos contemplar a manifestação da ira e juízo de Deus sobre a
arrogância e estupidez humano emaranhada em seus delitos e pecados. O livro de
Apocalipse é a ilustração final e definitiva desta verdade da Graça que
preserva e salva a Igreja e o Juízo de Deus que é derramada sobre todo o mal
deste mundo.
Relação com o Senhor Jesus – é linda a percepção que o texto nos
proporciona de contemplarmos nas ações de Abigail as ações de Jesus Cristo como
nosso Advogado junto ao Pai. Da mesma forma com que Abigail intercede em favor
de sua família, Jesus intercede em favor dos crentes, garantindo sua salvação e
reconciliação com Deus (1 João 2.1).
Uma
outra característica dela que expressa em grau, gênero e número o caráter de
Cristo é a genuína humildade dela diante de Davi. Característica que os
discípulos tiveram, e nós temos, de apreenderem. Somos chamados não para sermos
servidos (infelizmente não é isso que vemos), mas para servir (Mateus 20:28).
Conclusão
A
história de Abigail é um quadro magnifico que precisa ser contemplado
periodicamente com calma e atenta observação, para percebemos seus detalhes e
nuances. Essa mulher é um perfeito modelo para todo crente vivenciar uma vida
cristã autêntica, e não artificial e religiosa. Abigail é uma crente que produz
figos e não apenas folhas; que vivencia a fé e não apenas acredita; que se
coloca em lugar de outros e não vive apenas em função de si mesma. Como o
apostolo Paulo ela podia tranquilamente dizer: “sede meus imitadores, assim
como sou de Cristo”.
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