Dentro os livros que compõem a
Bíblia há aqueles que são mais populares como Salmos e os Evangelhos ou que
despertam mais a curiosidade dos leitores como o Apocalipse, mas também há
aqueles livros que são relegados ou quase esquecidos dentre os quais podemos
incluir a pequena epístola de Judas com seus poucos 25 versículos.
Pelo fato de ter sido colocada ao
final das chamadas cartas gerais ou universais, cujos autores são mais
conhecidos (Tiago, Pedro e João) e por ser o penúltimo livro da bíblia
coladinho com o Apocalipse, o breve escrito de Judas acaba passando desapercebido dos leitores bíblicos.
Todavia, seu conteúdo é bastante
significativo e pelo simples fato de estar no cânon bíblico merece toda nossa
atenção. Ela deve ser estudada da mesma forma e com o mesmo entusiasmo com que
estudamos todos os demais livros, pois esta pequena e singela carta foi tão
inspirada pelo Espírito Santo como o foram todas as demais que compõem o
Segundo Testamento.
Por sua brevidade esta epístola poderia facilmente ter
sido extraviada durante os primeiros séculos da era cristã, todavia o Espírito
Santo a preservou. Ela foi incluída entre as cartas universais na lista mais
primitiva de escrituras do Novo Testamento (provavelmente do século II), ainda
que nenhum dos Pais eclesiásticos a cita nem sequer a menciona antes de
Clemente de Alexandria (c. 150- c. 215). Certamente ela circulou amplamente nas
comunidades cristãs e apesar das restrições por parte de alguns líderes
cristãos, foi aceita como palavra de Deus. Mesmo não tendo uma autoria
apostólica, o fato é que a Igreja lhe concedeu uma posição dentre as
literaturas canônicas. No Concílio de Cartago em 397 ela foi oficialmente
reconhecida como parte integrante da bíblia cristã.
A epístola escrita por Judas não foi dirigida a uma
igreja ou pessoa em particular, mas às comunidades judaico-cristãs que estavam
dispersas, por esta razão ela foi colada no final desse grupo de
correspondências identificadas como sendo gerais ou universais.
Orígenes, um dos pais da igreja, comentando sobre esta
epístola de Judas declara: “E Judas escreveu uma Epístola, extremamente pequena, porém
cheia de palavras poderosas e graça celestial”. Desta forma quero
convidar você para juntos explorarmos esta pequena joia da graça divina que
está incrustrada no cânon neotestamentário.
Autoria
O escritor se identifica como sendo "servo
de Jesus Cristo" e irmão de Tiago, deixando de se identificar como sendo
meio-irmão do Senhor (Mt 13.55; Mc 6.3).[1] Ao
usar o nome composto “Jesus Cristo”, ele deseja enfatiza sua relação
espiritual com o Senhor e não sua relação física. Da mesma maneira Tiago (1.1)
se apresenta como sendo um servo de Jesus Cristo.
Tiago exerceu a liderança da igreja em Jerusalém. Quando
Paulo e Barnabé levam a questão dos gentios para ser resolvida no que
poderíamos chamar de primeiro concílio da igreja cristã (Atos 15) a liderança
desta reunião foi de Tiago. Mas sobre Judas não temos quaisquer outras
informações sobre algum trabalho especifico desenvolvido por ele, ainda que
pelo fato de enviar uma carta circular e o tom exortativo de sua mensagem nos
leve a pensar com muita propriedade que tinha liderança e influência junto a
estas comunidades judaico-cristãs a quem se dirige.
É possível que fosse um pregador itinerante (1Co 9.5) e
que apercebendo-se dos perigos que estão rondando as pequenas e ainda frágeis
comunidades cristãs pega de sua pena e pergaminho e o mais rápido possível
compõe está missiva alertando os irmãos dos perigos que estão correndo. Judas
pode ser aqui relacionado com a Atalaia do profeta Ezequiel, que está em lugar
estratégico no alto da torre na muralha que defende a cidade, de maneira que
poder avistar os movimentos dos inimigos que se aproximam e então toca as
trombetas de alerta de maneira que os demais se posicionem para a guerra.
Alguns
comentaristas advogam que a carta foi escrita por um autor desconhecido que se
utiliza do nome de Judas. Todavia, se fosse para fazer um documento pseudônimo
(pseudoepígrafo), provavelmente não se teria escolhido um nome relativamente
desconhecido como Judas ou que poderia ser confundido com o traidor; não teria
se identificado como irmão de Tiago, mas como o próprio ou outro apóstolo de
maior evidência.
De fato há no Novo Testamento cinco pessoas chamadas
Judas:
§ Judas
Iscariotes que certamente pode ser
descartado;
§ Judas
de Damasco, em cuja casa Paulo esteve
orando depois de sua conversão no caminho a Damasco (Atos 9.11);
§ Judas
Barsabás, que aparece no Concílio de
Jerusalém quando da discussão sobre os gentios (Atos 15.22, 27, 32);
§ Judas que foi
apóstolo (Lc
6.16; Atos 1.13) e que esteve presente na cena do Cenáculo (João 14.22),
conhecido também por Tadeu (Mt 10.4 e Mc 3.18) ou “o filho de Tiago” (Lucas
6:16; Atos 1:13; que em traduções mais antigas diz: “o irmão de Tiago”) do qual
também nenhuma outra informação temos afora as referências neotestamentário.
Mas certamente se fosse ele o autor se apresentaria como apóstolo de Jesus
Cristo o que lhe revestiria de maior autoridade.
Ainda que a questão continue em aberto um consenso sobre
a autoria fica estabelecido e o comentarista Delbert R. Rose (2006, p. 353) em
harmonia com Guthrie concluem depois de analisar as diversas probabilidades
antigas e modernas, que o consenso favorece Judas, o irmão de Jesus, como o
mais provável escritor deste penúltimo documento do cânon bíblico cristão. Em
sua conclusão William Barclay sintetiza muito bem a defesa da autoria de Judas:
“Quando lemos Judas,
ela é obviamente judaica; suas referências são tais que somente um judeu
poderia entendê-las, e suas alusões são tais que somente um judeu poderia
captá-las. É simples e sólida; e vívida e pictórica. E claramente a obra de um
pensador singelo e não a de um teólogo. Adapta-se à pessoa de Judas, irmão do
Senhor. Está ligada ao seu nome, e não poderia haver nenhuma razão para assim
ligá-la a não ser que ele realmente a escrevesse” (1958, p. 202-3).
Características Literárias
Judas, assim como seu irmão, Tiago, foi criado na
Galileia, que era pejorativamente chamada de “Galileia dos gentios” (Mt.
4.15), pois ali conviviam diferentes povos que haviam sido trazidos pelos
dominadores babilônicos quando da invasão e posterior cativeiro dos judeus. Mas
por outro lado, os galileus conviviam diariamente com duas línguas: o aramaico,
sua língua oficial, e o grego que era a língua universal da época (o inglês
hoje). Por esta razão não é difícil imaginar que Judas tenha escrito a carta em
grego, ainda que algum escriba o tenha auxiliado.
Quais são as características literárias da epístola de
Judas?
§ O grego utilizado por ele é simples, mas vigoroso. Ele
não é um artista literário, mas escreve como um profeta cristão apaixonado e
preocupado com seus leitores.
§ Que seus leitores são de origem judaica é percebido pelo
apoio que ele procura na literatura do Primeiro Testamento. Menciona três
exemplos tirados diretamente da história bíblica (vv. 5, 6 e 7).
§ Alguma linha depois uma vez mais vai buscar exemplos
tirados do contexto histórico bíblico, a atitude de Caim, o erro de Balaão e a
rebelião de Coré (v. 11).
§ Demonstra conhecer alguma das literaturas que não foram
incluídas no cânon hebraico, chamados de apócrifos. Ele menciona a disputa do
Arcanjo Michael com Satanás pelo corpo de Moisés (v. 9; cf. A Assunção de
Moisés); ainda cita uma profecia de "Enoque, o sétimo patriarca
depois de Adão" (VV. 14-15; cf O Livro de Enoque).
§ Sua colocação no cânon bíblico a constitui em uma
perfeita introdução ao último livro da bíblia. Enquanto a epístola de Judas nos
fala sobre a perversidade e a deturpação do evangelho cristão, o apocalipse nos
apresenta antecipadamente e em detalhes o julgamento que deve seguir os que
assim procedem.
Outra característica literária é que ao longo de toda a epístola
Judas organiza seu material em um padrão triplo, conforme os exemplos abaixo:
§ Na apresentação: Judas, Jesus Cristo, Tiago (v. 1a)
§ Destinatários: chamados, amados e preservados (v.1b)
§ Ao fazer a saudação deseja aos leitores misericórdia, paz
e amor (v.2)
§ Ao se referir aos apóstatas e imorais afirma que “estão contaminados
no corpo, rejeitam a autoridade e insultam os seres celestiais” (v. 8);
§ Quando se refere aos murmuradores e críticos afirma que
eles “seguem
seus próprios desejos maus; falam com arrogância e elogiam os outros para tirar
vantagem” (v. 16);
§ São pessoas que causam "divisões e são deixados aos seus
próprios instintos e não têm o espírito” (v. 19);
§ E ao concluir com uma doxologia menciona três tempos: “desde antes de
todas as eras, agora e para sempre” (v. 25).
Similaridades com 2ª
epístola de Pedro (capto 2)
Ainda no que se refere às características literárias a
carta de Judas é muito semelhante a Segunda Epístola de Pedro. Mas o
paralelismo é especialmente evidente no segundo capítulo de Pedro e um exame
mais minucioso revela que nenhum dos escritores copiou simplesmente o material do
outro, mas que ambos escrevem dentro de um mesmo contexto histórico-temporal.
Abaixo temos uma lista das passagens paralelas (a lista de tópicos segue o
texto da epístola de Judas):
Judas
|
2 Pedro (capto 2)
|
4 Pois certos homens, cuja condenação já estava sentenciada há muito tempo, infiltraram-se dissimuladamente [secretamente] no
meio de vocês. Estes são ímpios, e transformam a graça de nosso Deus em
libertinagem e negam Jesus Cristo, nosso único Soberano e Senhor.
|
2.1 No
passado surgiram falsos profetas no meio do povo, como também surgirão entre
vocês falsos mestres. Estes introduzirão secretamente
heresias destruidoras, chegando a negar
o Soberano que os resgatou, trazendo sobre si mesmo repentina destruição.
|
2.3 Em
sua cobiça, tais mestres os explorarão com histórias que inventaram. Há muito tempo a sua condenação paira sobre eles, e a sua
destruição não tarda.
|
|
6 E
aos anjos que não conservaram suas
posições de autoridade mas abandonaram sua própria morada, ele os tem
guardado em trevas, presos com
correntes eternas para o juízo do
grande Dia.
|
2.4 Pois
Deus não poupou os anjos que
pecaram, mas os lançou no inferno, prendendo-os em abismos tenebrosos a fim de serem reservados
para o juízo.
|
7 De
modo semelhante a estes, Sodoma e
Gomorra e as cidades em redor se entregaram à imoralidade e a relações
sexuais antinaturais. Estando sob o castigo do fogo eterno, elas servem de exemplo.
|
2.6 Também
condenou as cidades de Sodoma e
Gomorra, reduzindo-as a cinzas, tornando-as exemplo do que acontecerá aos ímpios;
|
16 Essas
pessoas vivem se queixando e são descontentes com a sua sorte, seguem os seus próprios desejos impuros;
são cheias de si e adulam os outros por interesse.
|
2.10 especialmente
os que seguem os desejos impuros da
carne e desprezam a autoridade. Insolentes e arrogantes, tais homens não
têm medo de difamar os seres celestiais;
|
8
Da mesma forma, estes sonhadores contaminam
seus próprios corpos, rejeitam as autoridades e difamam os seres celestiais.
9
Contudo,
nem mesmo o arcanjo Miguel, quando estava
disputando com o diabo acerca do corpo de Moisés, ousou fazer acusação injuriosa contra ele, mas
disse: "O Senhor o repreenda! "
10
Todavia, esses tais difamam tudo o que não entendem; e as coisas que entendem por
instinto, como animais irracionais,
nessas mesmas coisas se corrompem.
|
2.10 especialmente
os que seguem os desejos impuros da carne e desprezam a autoridade.
Insolentes e arrogantes, tais homens
não têm medo de difamar os seres celestiais;
2.11 contudo,
nem os anjos, embora sendo maiores
em força e poder, fazem acusações
injuriosas contra aqueles seres na presença do Senhor.
2.12 Mas
eles difamam o que desconhecem e são
como criaturas irracionais, guiadas pelo instinto, nascidas para serem
capturadas e destruídas; serão corrompidos pela sua própria corrupção!
|
12 Esses
homens são rochas submersas nas festas
de fraternidade que vocês fazem, comendo
com vocês de maneira desonrosa. São pastores que só cuidam de si mesmos.
São nuvens sem água, impelidas pelo vento; árvores de outono, sem frutos,
duas vezes mortas, arrancadas pela raiz.
|
2.13 Eles
receberão retribuição pela injustiça que causaram. Consideram prazer
entregar-se à devassidão em plena luz do dia. São nódoas e manchas, regalando-se em seus prazeres, quando participam das festas de vocês.
|
11 Ai
deles! Pois seguiram o caminho de Caim, buscando o lucro, caíram no erro de Balaão e foram destruídos na
rebelião de Corá.
|
2.15 Eles
abandonaram o caminho reto e se desviaram, seguindo o caminho de Balaão, filho de Beor, que amou o salário da
injustiça,
|
13 São
ondas bravias do mar, espumando seus próprios atos vergonhosos; estrelas
errantes, para as quais estão reservadas
para sempre as mais densas trevas.
|
2.17 Esses
homens são fontes sem água e névoas impelidas pela tempestade. A escuridão das trevas lhes está
reservada,
|
16 Essas
pessoas vivem se queixando e são
descontentes com a sua sorte, seguem os seus próprios desejos impuros; são
cheias de si e adulam os outros por interesse.
|
2.18 pois eles, com
palavras de vaidosa arrogância e
provocando os desejos libertinos da carne, seduzem os que estão quase conseguindo
fugir daqueles que vivem no erro.
|
17
Todavia, amados, lembrem-se do que foi
predito pelos apóstolos de nosso Senhor Jesus Cristo.
18
Eles diziam a vocês: "Nos últimos tempos haverá zombadores que
seguirão os seus próprios desejos ímpios".
|
3.3 Antes
de tudo saibam que, nos últimos dias,
surgirão escarnecedores zombando e seguindo suas próprias paixões.
|
4
Pois certos homens, cuja condenação já
estava sentenciada há muito tempo, infiltraram-se dissimuladamente no meio de
vocês. Estes são ímpios, e transformaram
a graça de nosso Deus em libertinagem e negam Jesus Cristo, nosso único
Soberano e Senhor. .
|
3.7 Pela
mesma palavra os céus e a terra que agora existem estão reservados para o
fogo, guardados para o dia do juízo e para a destruição dos ímpios.
|
Destinatários
Quem foram os leitores originais da Epístola de Judas? A
verdade é que o autor não especifica quem são seus leitores. Porem quando
examinamos o conteúdo da carta, podemos deduzir algumas coisas sobre esses
primeiros leitores:
§ Os destinatários da carta conhecem muito bem o Primeiro
Testamento (AT), pois o autor ilustra sua argumentação com fatos e figuras ali
registrados - sobre o êxodo (v. 5), os anjos (v. 6); sobre Sodoma e Gomorra;
cita nomes de personagens bíblicos como Caim, Balaão e Coré (v. 11).
§ Mas também faz referências da literatura judaica
produzida e conhecida no primário século (vv. 9, 14) e que não foram incluídas
no cânon judaico.
§ Por outro lado, a carta de Judas não trás nenhuma
referência, explícita ou implícita aos gentios.
§ O conteúdo desta epístola é tal que somente um leitor
judeu poderia ouvir e compreender plenamente o significado das palavras de
Judas.
§ Também podemos considerar a carta do ponto de vista do
escritor: Judas escreve como judeu de maneira que reflete o seu próprio
contexto judeu-cristão.
§ Diante destas referências podemos supor com certa
convicção de que os destinatários eram judeus que haviam sido convertidos à fé
cristã.
§ Na verdade havia centenas comunidades judaicas espalhadas
pelos grandes centros do Oriente Médio. Todavia, utilizando a correspondência
de Pedro que é contemporânea, podemos concluir que ambos escreveram para os
cristãos judeus e gentios que estavam vivendo na Ásia Menor (1Pe 1.1), ainda
que o conteúdo da epístola de Judas em si não nos permita determinar uma região
especifica para seus leitores primários.
Data e Lugar da Composição
Quando lemos a carta de Judas não
ficamos sabendo nem quando e nem onde ele estava quando escreveu. Partindo do
fato que ele é um dos filhos de José e Maria (Mt 13.55; Mc 6.3), é possível
situa-lo entre os anos 50 e 75 d.C.
Outro referencial para data-la é a
sua correlação com a segunda epistola de Pedro. Muitos são aqueles estudiosos
que concluem que Judas extraiu espinha dorsal do material produzido pela epístola
petrina e que o fez uma década depois. Tal posição se baseia nas palavras, “Todavia,
amados, lembrem-se do que foi predito [dito] pelos apóstolos de nosso Senhor
Jesus Cristo” (v. 17). Todavia, o fato de que Judas refere-se àquilo que
os apóstolos disseram ao invés daquilo que escreveram
sugere que ainda estamos nos movimentando dentro do período oral,
quando o ensino apostólico era geralmente transmitido pela palavra falada.
Assim sendo, a interpretação pode ser que Judas deseja trazer à memória dos
seus leitores o ensino dos apóstolos dos quais eles (Judas e leitores) são
contemporâneos e, portanto fazem parte da primeira geração de cristãos. O
apóstolo Pedro usa a mesma fórmula ao lembrar aos contemporâneos de si e dos
outros apóstolos (2Pe 3.1-2), relembrando o que os apóstolos havia ensinado.
Por sua vez, outros estudiosos sustentam
que a segunda carta de Pedro foi baseada na correspondência de Judas. Para isso
eles colocam as passagens paralelas e concluem a favor de uma sequencia
Judas-2Pedro.
Na tentativa de conciliar estas duas
hipóteses alguns advogam uma terceira possibilidade, de que tanto 2Pedro como
Judas extraíram suas informações de uma fonte comum. Como sempre, esse possível
“documento comum” não tem como ser atestado em sua existência e muito menos a
datação de sua possível redação.
Podemos concluir que não há nada na
carta que indique obrigatoriamente uma data além da vida de Judas, o irmão do
Senhor. Os perigos para os quais ele alerta seus leitores, semelhantemente aos
mencionados em 2 Pedro, não são perigos ou heresias características do segundo
século como afoitamente alguns comentarista indicam, mas todas elas podem ser
encontradas no contexto do primeiro século (cf. Atos 20. 29-30; Rm 6.1; 1Co 5.1-11;
2Co 12.21; Gl 5.13; Ef 5:3-17; 1Ts 4.6). Da mesma forma, a utilização da
palavra "fé" como representativo do conjunto de
verdades cristãs (v. 3) não requer uma datação tardia da carta, pois nas epístolas
paulinas fica claro que a ideia da ortodoxia cristã estava muito bem
estabelecida já na década de 50 do século I (cf. Rm 6.17, Gl 1.8 ss; 1Ts 2.13;
2Ts 2.15; 3.6, 14).
Externamente a carta de Judas é citada nos escritos de
Atenágoras, Policarpo e Barnabé todas produzida no início do século II, de
maneira que dificilmente Judas poderia ter sido composto depois do fim do
século I.
Quanto a datação de Judas os mais
conservadores optam por uma data entre 50 e 68 D.C. e os mais liberais entre 70
e 90 D.C. conforme a tabela abaixo:
Comentário
|
Data Proposta
|
||
Antecipada
|
Avançada
|
Média
|
|
Baker
Encyclopedia of the Bible, Walter A. Elwell, Ph.D.
|
61
|
99
|
80
|
Richard J. Bauckham, Ph.D.
|
50
|
60
|
55
|
Raymond Brown, Ph.D.
|
90
|
100
|
95
|
D.A. Carson, R.T. France, and G.J. Wenham, eds. New
Bible Commentary: 21 Century Edition.
|
67
|
70
|
68
|
Peter S. Davids, Ph.D. Pillar Commentary.
|
69
|
69
|
69
|
ESV Bible, Wayne Gruden General Editor.
|
65
|
80
|
72
|
ESV Study Bible
|
64
|
67
|
62
|
David A. Fiensy, Ph.D.
|
75
|
75
|
75
|
Norman L. Geisler, Ph.D.
|
67
|
69
|
68
|
Donald Guthrie, Ph.D. New Testament Introduction.
|
65
|
80
|
72
|
A.E. Hill, Ph.D.
|
60
|
68
|
64
|
Gary Holloway, Ph.D.
|
55
|
80
|
67
|
Holman Bible Handbook, David S. Dockery, Ph.D. Editor
|
65
|
80
|
72
|
R. Jamieson, A.R. Fausset, and D. Brown, eds.
|
70
|
80
|
75
|
John MacArthur, Ph.D.
|
68
|
70
|
69
|
K.E. Malberg.
|
74
|
76
|
75
|
M.S. Mills.
|
62
|
62
|
62
|
Thomas Nelson's KJV Study Bible, Wayne A. Brindle,
Th.D. Editor.
|
65
|
80
|
72
|
Nelson's NKJV Study Bible, Earl D. Radmacher, Th.D.
General Editor.
|
60
|
64
|
62
|
S.L. Peterson, AD 105
Timeline Charts of the Western Church.
|
105
|
105
|
105
|
Reformation Study Bible, R.C. Sproul, Ph.D. General
Editor.
|
65
|
67
|
66
|
J.A.T. Robinson, Ph.D.
|
61
|
62
|
61
|
T. Robinson, AD 90 The Bible Timeline.
|
90
|
90
|
90
|
Charles Caldwell Ryrie, Th.D., Ph.D., Ryrie Study Bible.
|
70
|
80
|
75
|
William Smith, Ph.D. Smith's Bible Dictionary.
|
65
|
65
|
65
|
Robert Utley, D.Min. Retired Professor of Hermeneutics.
|
60
|
80
|
70
|
Merrill F. Unger, Ph.D. Th.D.
|
66
|
75
|
70
|
J. Walvoord and R. Zuck
AD 67 to 80 The Bible Knowledge
Commentary: An Exposition of the Scriptures
|
67
|
80
|
73
|
The Woman's Study Bible, Dorothy Kelley Patterson,
Ph.D. General Editor.
|
65
|
80
|
72
|
Willmington's Bible Handbook, Harold L. Willmington,
Ph.D. 69 69 69.0
|
69
|
69
|
69
|
Glo-Bible.
|
65
|
80
|
72
|
A carta também não fornece nenhuma
indicação especifica do lugar de onde Judas escreve sua epístola. Podemos
deduzir nas entrelinhas que ele conhecia pessoalmente as comunidades e que por
elas era conhecido. O teor do texto indica um escritor na Palestina, e quando
se apresenta como sendo “irmão de Tiago” se adequa melhor a uma região onde Tiago
era conhecido como líder da Igreja em Jerusalém. Todavia, alguns comentaristas
seguem uma pista inferida da carta de Paulo (1Co 9.5) onde concluem que se
trata de Judas e sua esposa que servem como missionários itinerantes. Sendo
isso possível, Judas ao escrever sua carta poderia estar praticamente em qualquer
lugar do império romano.
Destinatários
Pouco se sabe, ao certo, sobre os primeiros leitores aos
quais esta carta é dirigida, exceto que ela se destina “aos
chamados, queridos em Deus Pai e conservados por Jesus Cristo” (v. 1).
Esta descrição dá a entender que Judas estava escrevendo a um grupo de comunidades
e não a uma comunidade específica. As citações que ela faz a personalidades e
histórias do Antigo Testamento (por exemplo, o Êxodo, a destruição de Sodoma e Gomorra,
Moisés, Caim, Balaão, a rebelião de Corá, e Enoque) parecem indicar que o seu
público-alvo tinha uma forte tradição judaica. Sendo ele mesmo um crente de origem
judaica, a tendência de Judas teria sido ministrar entre cristãos hebreus, como
seu irmão Tiago, que dirigiu a sua carta especificamente “às doze
tribos” (Tg 1.1).
Muitos comentaristas pensam que Judas estava escrevendo
ao mesmo público da segunda carta de Pedro, considerando as heresias que as
duas cartas combatem, mas não há nenhuma evidência disto. Pelo fato de
escreverem no mesmo contexto-histórico, estes falsos mestres estavam se
tornando um problema crescente para a maioria das comunidades cristãs
primitivas. O próprio Paulo trata com um problema semelhante na sua carta aos
Colossenses. Portanto, é provável que Judas tenha escrito esta carta aos
cristãos judeus aos quais ele tinha ministrado, tanto na Palestina quanto em
outras partes.
Propósito
Qual foi a intenção de Judas ao escrever esta epístola? Ele
indica que inicialmente desejava escrever aos seus leitores sobre a salvação
que lhes era comum. Certamente discorreria sobre os aspectos fundamentais da fé
cristã e seus desdobramentos na vida cristã presente e futura.
Mas diante de um quadro agravante que ele visualiza em
relação às comunidades cristãs com as quais ele se comunica, resolveu mudar o
conteúdo da pequena correspondência e passa a insta-los à lutar com firmeza e
determinação pelo conjunto de verdades que perfazem a fé cristã “que de uma vez por todas foi entregue aos santos”
(v. 3b) e na qual ele anima, ao final da carta,
que seus leitores edifiquem-se mutuamente (v. 20) e solicita
amorosamente que os cristãos demonstrem misericórdia em relação aos que duvidam
(v. 22).
Há um duplo propósito nessa sua correspondência. Na
primeira parte (vv. 4-19), de forma mais tensa e urgente ele ensina àqueles
cristãos como opor-se aos apóstatas que estavam se infiltrando no meio da
comunidade cristã. Os adverte contra a influência perniciosa que estas pessoas
ímpias têm exercido sobre a mente deles desvirtuando os pontos cardeais da
genuína fé cristã.
Simultaneamente o autor, como um pequeno mosaico, esboça
com brevidade diversas doutrinas cristãs: foram chamados (v. 1); a perseverança
dos que lutam pela fé (vv. 3, 21); o juízo final contra os incrédulos (vv. 4,
6, 7, 11, 15); e a segurança eterna dos que creem (vv. 1, 21, 24); a salvação
(v. 3) e a vida eterna dos crentes (v. 21).
Questão Canônica
Todos os livros neotestamentário circularam
individualmente até serem reunidos em formato de cânon. Esse processo canônico
somente foi concluído no século IV. Alguns livros foram rapidamente reconhecidos
por todos, mas outros somente no final do processo. Eusébio um dos líderes
cristãos mais proeminentes utilizava três categorias para descrever os escritos
Cristãos: 1. Aceitos;
2. Questionados (disputados)
e 3. Espúrios.
Em sua classificação dos livros neotestamentário ele inclui II Pedro com Tiago,
Judas, II e III João na categoria 2 (isto
é, disputados).
Todavia, apesar de sua brevidade e prolongada discussão
canônica o testemunho de sua autenticidade e veracidade é maior do que se
poderia esperar. A primeira menção está no Canon de Muratori (170 A.D.) e Clemente de Alexandria (190 A.D.) que se refere diretamente a ela
por nome em várias de suas obras. Tertuliano cita-a (cerca de 210 A.D.), e Orígenes (terceiro século), em
seu comentário de Mateus (13.55) refere-se a Judas como tendo escrito uma epístola
econômica em linhas, mas cheia de “palavras poderosas e graça celestial”. E
embora Eusébio (325 A.D.)
a tenha colocado entre os livros questionados, ele observa que era "bem
conhecido e amplamente reconhecido”. Clemente de Alexandria citou três
vezes a Epístola de Judas sem expressar qualquer dúvida. Deste modo, os três
pais antigos, Clemente de Alexandria, Tertuliano e Orígenes, até onde podemos
julgar por seus escritos, atestaram sua autenticidade. Após o tempo de Eusébio,
a Epístola de Judas foi universalmente aceita como genuína e reconhecida como
canônica.
Duas objeções, tiradas de provas internas, foram feitas
contra sua autenticidade. A escola de Tübingen[2]
representada por Baur,[3] e outros,
afirmam que se podem deduzir a partir do versículo 17, "lembre-se
das palavras que foram ditas antes pelos Apóstolos", que esta
Epístola pertence aos tempos pós-apostólicos. Entretanto, tudo o que podemos inferir
desta passagem é (1)
que o escritor aqui se distingue dos Apóstolos, e (2) que ele dá por certo que seus leitores
ouviram a pregação de alguns dos apóstolos, portanto ele e seus leitores fazem
parte da primeira geração de cristãos.
Uma segunda objeção feita contra a autenticidade desta
Epístola por alguns e que foi razão por postergar sua plena aceitação no cânon
neotestamentário é o autor inclui diversas referências apócrifas e lendárias
nesta Epístola, mais do que em todos os escritos do N.T. juntos, e que tais
referências apócrifas são inconsistentes com a ideia de inspiração. Mas o argumento
é menos conclusivo como parece à primeira vista. O autor apenas se utiliza de
argumentos que eram conhecidos pelos seus leitores e que certamente circulavam
entre as comunidades judaico-cristãs do primeiro século (A Assunção de Moisés e
o Livro de Enoque), mas que não foram incluídos no cânon hebraico. O que Judas
deseja é ilustrar aos leitores o quão danoso e perigoso eram os falsos mestres
e seus ensinos perniciosos para a edificação da igreja. Isso não deve nos
surpreender, pois Paulo também nos dá alguns fatos na história de Moisés não
registrados no Livro do Êxodo (2Tm 3.8), bem como outras citações não canônicas
((Atos 17.28; 1Co. 15.33; Tt 1.12), deste modo, não se pode concluir que a
epístola seja espúria por causa destas citações não canônicas. A partir do
século IV a carta de Judas tem sido lida, estudada e aceita como inspirada por
um numero crescente de eminentes estudiosos século após século até os dias
atuais.
Utilização
livre desde que citando a fonte
Guedes, Ivan Pereira
Mestre
em Ciências da Religião.
me.ivanguedes@gmail.com
Outro
Blog
http://historiologiaprotestante.blogspot.com.br/
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Referências
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de Janeiro: CPAD, 2006. [Comentário Bíblico Beacon – Hebreus a Apocalipse, v.
10]
[1]
Ele seria um filho mais novo de Maria, nascido dela e de José, junto com Tiago,
José e Simão. Outros argumentaram que ele foi um filho mais velho de José,
fruto de um casamento anterior. Os irmãos de Jesus inicialmente recusaram-se a
acreditar nele durante o exercício de seu ministério terreno (João 7.5), mas Tiago
tornou-se mais tarde, provavelmente após uma aparição de Jesus ressurreto (1Co
15. 7). Os irmãos de Jesus são mencionados em Atos 1.13-14 como participantes
de uma reunião de oração antes do Pentecostes o que indica que já haviam
reconhecido nele o Messias.
[2]
Na cidade de Tübingen (port. Tubinga), no estado alemão do Baden-Wüttenberg,
foi fundada em 1477 uma instituição que nos séculos seguintes se tornaria uma
das mais prestigiosas, particularmente no que concerne aos estudos teológicos.
Tornou-se o principal centro acadêmico liberal no que concerne os estudos
bíblicos.
[3]
Ferdinand Cristian Baur (6 de setembro de 1809 - 13 de abril de
1882) era alemão e foi teólogo, filósofo e historiador. Bauer investigou as
fontes do Novo Testamento e concluiu que o cristianismo primitivo deve mais a
filosofia grega (estoicismo) do que para o judaísmo. Escreveu a partir de 1840
uma série de obras argumentando que Jesus era um mito e fusão da teologia
judaica, grega e romana do segundo século.
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