O
Novo Testamento é um registro de eventos históricos. Estes eventos estão
centralizados na pessoa e obra de nosso Senhor Jesus Cristo — sua vida, morte,
ressurreição, ascensão, e a continuação de sua obra no mundo — em que também
consiste em toda a estrutura e propósito do Antigo Testamento. Além disso, é o
registro fidedigno da história sacra, que se distingui nitidamente da história
secular, pois se crê que foi escrita sob a orientação sobrenatural do Espírito
Santo. Por esta razão tanto o Antigo como o Novo Testamento possuem autoridade
divina para Igreja hoje e por todo o tempo até que o Senhor Jesus Cristo
retorne.
Nossa
Bíblia é dividida em duas seções que chamamos de o Velho Testamento e o Novo Testamento
(ver nota nº 1). Esta divisão e nomenclatura foi adotada a partir do início do
terceiro século e passou a ser utilizada de forma geral para se referir às duas
partes da Bíblia Cristã. O texto bíblico para fundamentar esta nomenclatura está
no evangelho segundo Mateus (26.28) onde se registra as palavras de Jesus
durante a instituição da Ceia: “Porque isto
[cálice] é o meu sangue, o sangue do novo
testamento [aliança, pacto], que
será derramado por muitos para remissão dos pecados." A palavra grega
para “testamento”, [διαθήκη] no latim [testamentum],[2]
significa “vontade, desejo, pacto ou
aliança”. Mas no grego comum a melhor palavra para “aliança ou pacto” seria
“suntheke”, pois ela descreve um acordo entre as partes. A palavra “diatheke” é
utilizada esparsamente no NT, mas ocorre com frequência em Hebreus (7.22; 8.6;
9.15,17; 10.29) e parece que o autor faz um duplo sentindo com ela (9.15-17),
produzindo a ideia de um primeiro e um segundo testamento, o que leva alguns a
deduzirem que foi a partir deste texto que se passou a utilizar o termo “testamento”
para as duas partes da Bíblia. Os tradutores da versão grega Septuaginta não encontraram um
termo equivalente para a palavra hebraica “pacto” e utilizaram o termo “diatheke”
como equivalente e como o escritor de Hebreus utiliza o texto da Septuaginta
para suas citações “diatheke” assumiu a ideia de “pacto ou aliança” da Bíblia
Hebraica. Entretanto, em conexão com o contexto das Escrituras[3] é
preferível o uso de “Pacto e/ou Aliança”
para uma melhor tradução.
O
termo Novo Testamento, aponta para aquele novo relacionamento dentro do qual os
homens podem ser recebidos por Deus. O Velho Testamento ou Pacto é
primeiramente um registro da maneira como Deus se relacionou com os Israelitas,
regido pelo Pacto estabelecido com Moisés no Monte Sinai. O Novo Testamento ou
Pacto (antecipado no Jeremias 31:31 e instituído pelo Senhor Jesus, 1 Cor.
11:25), descreve a nova base que Deus estabeleceu para se relacionar, não mais
com Israel somente, mas com todos os homens, de toda tribo, língua e nação, que
foi ratificada em Cristo no Calvário.
Os
nomes Pactos Novo e Velho foram assim aplicados primeiro às duas formas com que
Deus estabeleceu se relacionar com os homens, e então, aos livros que continham
o registro destes dois relacionamentos. “O
Novo Testamento é o registro divino dos termos pelos quais Deus tem recebido
nós rebeldes e inimigos dentro da sua paz”.
Preparação Divina do Novo Testamento
No
tempo do Novo Testamento, o Império Romano era a força dominante do mundo e
controlava praticamente todo o mundo antigo. Mas em uma pequena cidade na
Palestina, na pequena e quase imperceptível cidade de Belém da Judeia, nasceu
um que haveria de mudar o mundo e destronar o grande César romano. E
concernente a esta Pessoa o apostolo Paulo escreveu, “Mas, vindo a plenitude dos tempos, Deus enviou seu Filho, nascido de
mulher, nascido sob a lei, (ou Velho
Pacto).” (Gal.4:7). De forma extraordinariamente maravilhosa e especial,
Deus tinha preparado o mundo para a vinda do Messias. Vários fatores
contribuídos para esta preparação:
Preparação Através da Nação Judaica
A
preparação para a vinda de Cristo é a linha histórica que estabelece a unidade
de todos os acontecimentos e da mensagem registrada no Velho Testamento. Os
Judeus foram escolhidos por Deus de entre todas as nações para ser um povo de
exclusividade de Deus, um reino de sacerdotes, e uma nação santa (Ex. 1:5-6). A
revelação deste propósito divino, inicia-se com as promessas de Deus dado aos
patriarcas, Abraão, Isaque e Jacó (Gen. 12:1-3; Rom. 9:4). Deste modo, o povo israelita tornou-se os
curadores da Palavra de Deus (Velho Testamento [Rom. 3:2]), e o canal pelo qual
haveria de vir o Redentor (Gen. 12:3; Rom. 9:5). O tema central do Velho
Testamento, portanto, é Cristo, e aponta para Sua vinda como aquele que através
de seu sofrimento e glorificação, se constituiria no Salvador e Senhor de seu
povo. Além disso, as profecias, ainda que não fossem em grande quantidade, o
eram extremamente qualificativas, precisa com detalhes perfeitos: a linhagem
Messiânica; o local de seu nascimento; as condições e particularidades da sua
vida, morte, e até mesmo da sua ressurreição.
Embora
Israel se mantivesse compulsivamente em desobediência e por esta razão foi
levada para o Cativeiro (Babilônico), como julgamento de Deus, por causa da
obstinada dureza de seus corações, Ele, contudo os preservou e os trouxe de
volta, após setenta anos, para sua terra de origem, como Ele havia
prometido. Tudo isto Deus fez para que
se cumprisse o Seu propósito original de preparação para a vinda do Messias.
Embora quatrocentos anos se passassem depois do registro do último livro de
Velho Testamento, e embora o clima religioso fosse de um farisaísmo externo e
hipócrita, havia um espírito de antecipação Messiânica no ar e os remanescentes
fiéis aguardavam com ardente expectativa o cumprimento da vinda do Messias.
A
diáspora judaica, principalmente após
o chamado “cativeiro babilônico”, espalhou comunidades judaicas por todo o
mundo conhecido daqueles dias e mesmo com a reconstrução da cidade e do Templo
em Jerusalém, a grande maioria optou por permanecerem nos países onde se haviam
estabelecido. Nessas comunidades eles preservaram seus textos religiosos e sua
mensagem da expectativa messiânica.
A
Sinagoga foi uma instituição, se não
filha da diáspora, mas certamente popularizada pelas comunidades, primeira em
cativeiro, e posteriormente pelas que estavam espalhadas pelo mundo. Na
Sinagoga as Escrituras judaicas eram lidas e estudas, de maneira que foram copiadas
e preservadas. Mesmo na Palestina e em Jerusalém as Sinagogas continuaram sendo
amplamente utilizadas como local especifico para suas reuniões religiosas e
sociais. Durante seu ministério Jesus utilizou bastante as Sinagogas para
proclamar sua mensagem evangélica e está também foi a estratégia do apóstolo
Paulo quando realizou suas viagens missionárias por todo Império Romano, sendo
que, em algumas ele foi duramente perseguido (ex. Tessalônica), mas em outras
ele foi bem acolhido (ex. Beréia). Nessas Sinagogas havia sempre um número expressivo
de não judeus, que desanimados com suas religiões, encontravam na mensagem
hebraica uma esperança para suas vidas. As primeiras comunidades cristãs foram
formadas em sua grande maioria por estes prosélitos ou amigos da Sinagoga.
A
tradução dos textos hebraicos para a língua grega cuja versão recebeu o nome de
“Septuaginta” foi fundamental para a
preservação e internacionalização da mensagem veterotestamentária. Fora da
Palestina, que utilizava a versão aramaica, os judeus utilizavam a versão
grega. Talvez seja essa a razão pela qual os estrangeiros, que compreendiam o
idioma grego, foram grandemente atraídos para a religião judaica. Os
missionários cristãos utilizaram-se desta versão para comunicar a sua mensagem
evangélica, de maneira que as primeiras comunidades cristãs tinham na
Septuaginta sua única bíblia.
Preparação Através dos Gregos
Se
reveste de grande importância e significado que quando Cristo, que seria o
Salvador do mundo e que haveria de enviar Seus discípulos até aos fins da terra
para proclamar o Seu evangelho (Mat. 28:19-20), nascesse exatamente no tempo em
que havia um idioma dominante no mundo. Isto foi o resultado das conquistas e
aspirações de Alexandre o Grande, o filho de Filipe o Rei da Macedônia, que
mais de 300 anos antes do nascimento
de Cristo, havia varrido o mundo antigo conquistando uma nação depois outra. Seu desejo era um mundo e uma língua. No
rastro de suas vitórias, ele estabeleceu a língua Grega como a língua comum, e
a cultura Grega como o modelo de pensamento e vida, conhecida por "helenismo". Embora seu império fosse
temporalmente breve, o resultado de espalhar a língua e a cultura grega foi
amplamente satisfatório. Mesmo após a derrota para o Império Romano, tanto a
língua quanto a cultura helenista, permaneceram influenciando a vida das
pessoas e sociedades. O Grego Koinê tornou-se a língua comercial (assim como o
inglês) de maneira que se constituía em um segundo idioma para quase todos os povos.
O
ponto aqui é que Deus providencialmente preparou o mundo para uma língua comum
e que veio a se constituir em um veículo incomparável de comunicação para
proclamar com clareza e precisão a mensagem do Salvador. Todos os cristãos
foram da Palestina anunciavam sua mensagem em grego. Toda literatura produzidas
por eles, foram redigidas em grego koinê, e não no Hebraico ou Aramaico, ainda
que todos os escritores dos textos que compõem nosso Novo Testamento fossem de
origem judaica, exceto Lucas, que era de origem grega.
Preparação Através dos Romanos
Deus
continua preparando o mundo para a vinda do Salvador. Quando Cristo nasceu na
Palestina, o Império Romano dominava o mundo. A Palestina estava debaixo do
domínio romano e sujeita às suas leis. A
guerra civil mais longa e ensanguentada romana tinha finalmente terminada com o
reinado de Augustos César. Como resultado, Roma tinha ampliado vastamente seus
limites, rompendo as fronteiras geográficas e étnicas. Além disso, os romanos construíram um sistema de estradas, que, com a proteção fornecida por seu exército, frequentemente
patrulhando as estradas, contribuiu para a intensificação do fluxo de viajantes
que cruzavam todo o império Romano. Augustos foi o primeiro Romano a usar o
cetro imperial como o único governante do Império. Ele foi um moderado, sábio e
tinha consideração pelos seus semelhantes, e ele trouxe um grande período de
paz e prosperidade, fazendo de Roma um lugar seguro para se viver e viajar.
Isto introduziu um período chamado “Pax” a
“Paz” Romana (27 a.C.– d.C. 180).
A
cidadania romana era um passaporte seguro para se poder viajar por todos países
que estavam debaixo do domínio do Império. O apóstolo Paulo utilizou amplamente
o fato de ser um “cidadão romano” para livremente viajar e anunciar o
evangelho.
Foi
neste contexto histórico que nasceu aquele que se constitui na duradoura e
verdadeira fonte de paz pessoal e do mundo, em contrataste com a paz falsa e
temporária que os homens (sejam quais forem os impérios) podem produzir. Cristo é verdadeiramente Deus, o
Deus-homem, ao invés de um homem chamado deus. A grande ironia está no fato de
que a mesma presença da ordem e lei Romana, que foi utilizada pelas autoridades
religiosas judaica para matar Jesus, foi a que preparou o mundo para a Sua
vinda e para a propagação do Seu evangelho.
“Ora, depois que João foi entregue, veio
Jesus para a Galileia pregando o Evangelho de Deus, e dizendo: O tempo está cumprido, e é chegado o reino
de Deus. Arrependei-vos, e crede no
evangelho”.
(Marcos
1:14-15)
Utilização
livre desde que citando a fonte
Guedes,
Ivan Pereira
Mestre
em Ciências da Religião.
Universidade
Presbiteriana Mackenzie
me.ivanguedes@gmail.com
Outro
Blog
Historiologia
Protestante
http://historiologiaprotestante.blogspot.com.br/
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Referências Bibliográficas
CHAMPLIN,
Russell Norman. Enciclopédia de Bíblia,
Teologia e Filosofia. São Paulo: Hagnos, 2006, 8ª ed. [v. 6 – S-Z]
DRANE,
John (Org.) Enciclopédia da Bíblia.
Tradução Barbara Theoto Lambert. São Paulo: Edições Paulinas e Edições Loyola,
2009.
HALE,
Broadus David. Introdução ao estudo do
Novo Testamento. Tradução Cláudio Vital de Souza. Rio de Janeiro: Junta de
Educação Religiosa e Publicações, 1983.
TENNEY,
Merrill C. (Org.). Enciclopédia da
Bíblia. São Paulo: Cultura Cristã, 2008. v. 5.
[1] Visto
que o termo mais relevante nesta nomenclatura é “testamento” e não “novo ou
velho”, nos centros acadêmicos há uma tendência de alterar essas duas
nomenclaturas. O termo “velho” está no imaginário humano como sendo algo
ultrapassado e, portanto, descartável, o que não expressa o conceito cristão. O
termo “novo” evoca a ideia de algo inédito, portanto, sem conexão com o
anterior, o que também não expressa a melhor interpretação cristã. Tem sido
utilizado então as nomenclaturas de Primeiro Testamento e Segundo Testamento,
no esforço de expressar melhor o conteúdo e vinculação destas duas partes que
compõe uma mesma e única Bíblia cristã.
[2] O título
“Testamento” acabou prevalecendo por causa da versão latina (Vulgata de
Jerônimo) que predominou por séculos nas atividades litúrgicas da Igreja
Católica Romana mesmo após a Reforma Protestante do século XVI.
[3] Esse
termo veio a se constituir também em sinônimo do conjunto de livros que compõe
a Bíblia toda.
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